Seminário aponta tendências para políticas públicas em educação profissional e tecnológica
Com um em cada quatro empregos sofrendo transformações até 2027, EPT precisa se adaptar para apoiar a formação dos jovens
por Vinícius de Oliveira 24 de novembro de 2023
Enquanto o noticiário fala com entusiasmo sobre as novidades envolvendo carros elétricos e usos da inteligência artificial, as consequências da crise climática alertam que qualquer progresso será efêmero se não considerar a sustentabilidade. A compreensão dessas questões que afetam a sociedade é decisiva para traçar estratégias sobre como estudantes jovens ou adultos, além das próprias empresas, precisam se reeducar para encontrar soluções inovadoras para as mudanças que atingem o mercado de trabalho. Quais empregos vão desaparecer ou emergir? Quais habilidades serão essenciais? Quais áreas devem ganhar mais investimentos?
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Essas perguntas foram discutidas nesta quinta-feira (23), em Brasília (DF), durante o Seminário Internacional de Educação Profissional, organizado pelo SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial). O evento destacou a neoindustrialização, processo que gera negócios inovadores, eficientes e sustentáveis, baseados na economia verde e tecnológica. Também ressaltou que o Brasil tem diante de si oportunidades para assumir um papel de protagonismo internacional.
Neste cenário, a EPT (educação profissional e tecnológica) será essencial, desde que saiba adaptar. Hoje essa modalidade é cobrada em três diferentes perspectivas:
- Preparação de jovens para o futuro: a educação profissional é desafiada a preparar os jovens para carreiras que ainda estão se formando ou que podem não existir atualmente. Isso envolve não apenas fornecer conhecimentos técnicos e práticos, mas também desenvolver habilidades que permitam aos jovens se adaptar e inovar em um ambiente de trabalho em rápida evolução.
- Requalificação permanente de trabalhadores: quem já está no mercado de trabalho precisa pensar em requalificação contínua para expandir suas habilidades e permanecer empregáveis e eficientes em suas funções diante das mudanças do mercado.
- Incorporação de tecnologias digitais e competências socioemocionais: a educação profissional deve responder à necessidade de integrar tecnologias digitais em sua gestão e processos pedagógicos. Isso não se limita ao ensino de habilidades técnicas, mas também ao desenvolvimento de competências socioemocionais, que se tornaram igualmente importantes no ambiente de trabalho moderno.
Esses desafios refletem a necessidade de uma abordagem holística e adaptativa na educação profissional. “Não é só formar bem o jovem. Trata-se de criar ambientes que permitam aos profissionais já adultos desenvolver perenemente a aprendizagem de habilidades. O papel das escolas não é o mesmo do passado. Temos que nos apropriar de tecnologias digitais para fazer diferente e criar atalhos para alcançar resultados mais rapidamente”, diz Gustavo Leal, diretor-geral do SENAI.
O executivo do SENAI cita ainda que, atualmente, o acesso ao conhecimento qualificado tornou-se um fator decisivo para a alocação de novos investimentos por parte das empresas. Nesse sentido, a EPT (Educação Profissional e Tecnológica) se configura como um alicerce, facilitando o acesso a conhecimentos ao mesmo tempo que mantém as pessoas engajadas no dinâmico mundo do trabalho.
No Brasil, o desemprego entre jovens de 18 a 24 anos é mais de duas vezes superior à média nacional. Os últimos dados divulgados pelo IBGE (O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostraram que o índice de 18% no trimestre encerrado em setembro, mais de duas vezes superior à média nacional (8,7%). Além da falta de experiência profissional, natural para essa faixa etária, economistas ouvidos pelo site O Globo apontam que lacunas no desenvolvimento de competências ao longo da trajetória escolar também deixam marcas.
Essa análise também está em linha com o que propõe João Alegria, secretário-geral da Fundação Roberto Marinho. Ele defende soluções que busquem a aproximação com os jovens para que o Brasil consiga colocar em prática a mudança. Segundo João, são três os grandes temas a serem considerados: cultura, tecnologia e inovação.
A cultura deve ser pensada em termos de diversidade, território e bioma. Em relação à tecnologia, João enfatiza a necessidade de um compromisso com uma mentalidade digital. “É uma agenda indesviável. Quando falamos em tecnologia, vão surgir coisas incríveis, como novas abordagens de aprendizagem, e também barreiras digitais que não podem servir de desculpa para que nada seja feito.”
Ao falar de inovação, ele defende que essa proposta não deve ser vista como uma ameaça, mas como uma oportunidade para experimentar novas maneiras de aprendizagem, destacando a necessidade de preparação para enfrentar os desafios futuros no mundo do trabalho.
Ritmo e risco envolvidos na virada para EPT
Josefina Posadas, economista sênior da Prática Global de Proteção Social e Emprego, do Banco Mundial, observou que especialmente para o público jovem, o acesso a empregos de alta qualidade depende de formação e treinamento sendo oferecidas no próprio emprego, com sistemas mais flexíveis de certificações. Segundo ela, um dos objetivos das políticas públicas precisa envolver o acesso equitativo, uma vez que em países como o Brasil, os mais pobres sequer consideram a EPT.
“Nos países mais desenvolvidos, a maioria dos estudantes recorre ao sistema TVT (Treinamento Vocacional e Técnico) como meio de garantir empregos. No Brasil, contudo, a adesão a esse sistema é menor, especialmente entre as camadas mais pobres da população”. No entanto, reformas no sistema vocacional requerem tempo, como demonstrado pelos casos de sucesso da Malásia e Cingapura, que levaram décadas para sentir os efeitos de políticas relacionadas. Diante disso, a partir de estudos do Banco Mundial, Josefina traçou algumas recomendações:
- Promover um portfólio de competências com foco em habilidades fundamentais e técnicas exigidas pelo mercado de trabalho;
- Equilibrar a autonomia e a responsabilidade do sistema, com o governo garantindo a qualidade, enquanto estudantes e o setor privado participam da definição do que é essencial;
- Realinhar o financiamento para recompensar resultados e aumentar o suporte em áreas subatendidas;
- Fornecer informações detalhadas e claras é crucial.
“Em resumo, há oportunidades para melhorar o sistema de TVT e superar os desafios atuais. Devemos focar na qualidade, relevância e equidade, aproveitando as lições aprendidas de outros países e o potencial das tecnologias para impulsionar a transformação. No entanto, é importante expandir de forma cuidadosa para não comprometer a qualidade”, disse.
Tendências internacionais e o Brasil
E quais são as lições que o Brasil poderia utilizar para acelerar essa agenda? Quais são as tendências envolvidas? Attilio Di Battista, líder de projetos do Fórum Econômico Mundial, trouxe dados da mais recente pesquisa global na qual 800 empresas de diferentes portes, em todo o mundo, são consultadas a respeito de pontos de vantagem em seus respectivos países e setores. A partir desses dados, a organização extrai tendências que ajudam a prever como serão os empregos do futuro.
Segundo Attilio, muito vai mudar nos próximos cinco anos, com um em cada quatro empregos sofrendo transformações até 2027. Entre as tendências que estão movendo essa mudança, ele menciona big data e inteligência artificial como aquelas que terão um efeito globalmente positivo nos empregos, à medida que muitas empresas implementam esses trazem esse tipo de tecnologia para seus modelos de negócios.
Além disso, na transição verde, a transformação dos sistemas energéticos, adaptação dos modelos de negócios e enfrentamento das mudanças climáticas exigirão investimentos, resultando em novas oportunidades de emprego. Com isso, vagas em sustentabilidade, engenharia, instalação de painéis solares e energias renováveis estão previstos para crescer.
No Brasil, a análise do Fórum Econômico teve apoio do próprio SENAI. No cenário nacional, as empresas estão priorizando a adoção de novas tecnologias, com foco menor no treinamento de trabalhadores em novas habilidades, especialmente no Brasil. No país, 46% das empresas planejam adotar novos materiais e tecnologias, enquanto 61% planejam adotar tecnologias de saúde e cuidados, um índice elevado em comparação com o resto do mundo. O cenário nacional destoa do internacional quando o tema envolve esforços para a requalificação de trabalhadores. Apenas 19% das empresas brasileiras planejam ensinar habilidades tecnológicas, em comparação com a média global de 28%.
Isso é especialmente crítico porque entre as vagas que serão mais demandadas são justamente de especialistas em inteligência artificial e em aprendizado de máquina ou ainda nos setores agrícola ou de mobilidade. “Esses empregos estão crescendo muito agora, vão crescer ainda mais rápido e vão empregar a maior parte da população”, afirmou. Do outro lado, entre os empregos que estão entrando em declínio são aqueles ligados a tarefas administrativas e que estão sendo substituídos por algumas opções de tecnologia.as para promover o desenvolvimento socioeconômico do Brasil. As discussões se concentrarão em identificar abordagens educacionais que contribuam para a neoindustrialização, a transformação digital e o avanço da economia verde.