Tecnologia estimula engajamento de famílias na educação
Ferramentas facilitam a comunicação com a escola e incentivam a participação dos pais na rotina escolar dos filhos
por Marina Lopes 23 de fevereiro de 2016
De um lado, as escolas precisam contar com uma maior participação dos pais. Do outro, os pais querem acompanhar a rotina escolar dos filhos, mas encontram dificuldades de comunicação e tempo no seu dia a dia. Para resolver esse problema, algumas ferramentas estão utilizando a tecnologia para aproximar família e escola.
Pai de uma menina de cinco anos e um menino de dois, o engenheiro Vahid Sherafat percebeu que a agenda escolar não era uma estratégia muito eficiente para intermediar a relação entre a família e a escola. Ao lado de outro pai, o engenheiro Samin Shams, que também tem dois filhos, ele teve a ideia de desenvolver uma ferramenta que pudesse facilitar esse processo.
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Após estudarem estratégias de comunicação das escolas e escutarem o ponto de vista das famílias, os engenheiros identificaram um discurso contraditório: se por um lado as escolas diziam que os pais não estavam interessados nos recados, por outro, os pais respondiam que gostariam de acompanhar a rotina escolar dos filhos, mas a escola se comunicava mal com eles. “Percebemos um desalinhamento entre a escola e a família”, conta Sherafat.
Ao notar essa dificuldade, ele e o sócio desenvolveram o aplicativo ClassApp, que facilita a comunicação entre a família e a escola. Como uma espécie de WhatsApp voltado para educação, a ferramenta tenta substituir a tradicional agenda de papel. No entanto, diferente do popular serviço de mensagens instantâneas, o engenheiro diz que o sistema traz mais controle e segurança para ser utilizado no ambiente escolar.
“O WhatsApp entrou pela janela da escola como um indicador de que ela não está se comunicando bem com os pais. Da mesma forma que ele trouxe algumas vantagens, também criou alguns problemas, como a dispersão na comunicação e os contatos [que ficam visíveis para todos]. O ClassApp faz uma comunicação privada. Nenhum pai tem acesso aos contato de outros pais e a escola também não disponibiliza os números para os funcionários. Os contatos ficam escondidos dentro de um sistema”, explica, ao mencionar que também existe a possiblidade de enviar lembretes sobre compromissos escolares dos alunos.
O aplicativo, que começou a ser testado no colégio da filha há 18 meses, hoje está sendo utilizado por quase 100 escolas do país. Embora boa parte delas sejam particulares, o ClassApp também está desenvolvendo uma experiência piloto com 12 escolas de ensino técnico em São Paulo. A solução apresentada pela startup paulista foi finalista do programa Pitch Gov, que selecionou projetos com soluções inovadoras para colaborar com o governo estadual de São Paulo. O ClassApp também está sendo lançado no mercado internacional, fechando parceria com uma escola canadense e abrindo uma filial da startup nos Estados Unidos.
Ao ser adquirido, o ClassApp pode ser configurado para disponibilizar diferentes canais de interação. As escolas podem optar por permitir a comunicação direta entre pais e professores, ou apenas possibilitar que as mensagens sejam enviadas para um departamento específico ou coordenador pedagógico que irá transmitir recados para sua equipe. “A tendência que observamos é que as escolas começam mais centralizadas e depois perdem o receio”, conta o engenheiro.
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Com quatro filhos, a psicóloga Daniela Aiach tinha o desafio de acompanhar diferentes e-mails e agendas ao mesmo tempo. Há um ano, a Escola Projeto Vida, em São Paulo, onde os filhos estão matriculados, adotou o aplicativo como estratégia de comunicação com os pais. Segundo ela, a ferramenta facilitou o acompanhamento da rotina escolar deles. “Você não tem problema de esquecer nenhum compromisso. É mais fácil de você relembrar”, conta.
Por meio de mensagens de celular (SMS), a ferramenta EduqMais também utiliza a tecnologia como suporte para aumentar o engajamento da família na rotina escolar dos alunos. Criado pela empresa MGov, com apoio da Fundação Lemann, o serviço envia conteúdos e propostas de atividades cotidianas para que os pais possam desenvolver em conjunto com os filhos.
A ferramenta surgiu com base nos resultados da pesquisa Cultivando a Aprendizagem, desenvolvida pela Fundação Lemann, Omidyar Network e IDEO. De acordo com o estudo, antes dos pais se envolverem com a escola e influenciarem mudanças positivas na área, eles precisam estar engajados com a educação dos próprios filhos. Embora eles tenham o desejo de participar, muitos não sabem por onde começar e também não se sentem seguros para ajudar nos conteúdos escolares.
“Nós percebemos que a participação dos pais na educação dos filhos acontece especialmente na formação para a vida, que eles entendem como sua responsabilidade e se sentem seguros nessa posição. Eles não se sentem preparados para apoiar no currículo, mas se sentem preparados para ajudar os filhos em decisões fundamentais para o seu crescimento”, explica Maúna Baldini, gerente do EduqMais.
A partir da percepção de que muitos pais não se sentem qualificados para ajudar os filhos em conteúdos escolares específicos, a ferramenta estimula que eles colaborem com o desenvolvimento socioemocional dos estudantes e também conversem sobre assuntos presentes no cotidiano da família. Ao longo da semana, são enviadas mensagens sem custo sugerindo atividades simples, como trabalhar em equipe para fazer algum reparo na casa ou ir ao mercado juntos para comparar preços dos produtos e conversar sobre finanças domésticas.
Durante oito semanas, ao longo de 2015, a solução foi testada em um projeto piloto que envolveu dois mil pais de 145 turmas do 6º e 7º ano do ensino fundamental, de 47 escolas públicas localizadas em São Paulo, Rio de Janeiro e Fortaleza. Neste ano, a ideia é expandir o alcance para 10 mil pais e alunos de 145 escolas.
As atividades do EduqMais seguem as características de cada faixa etária, levando em conta o desenvolvimento de habilidades socioemocionais e um olhar focado no que é possível ser feito dentro de um contexto familiar. “Será que no bairro onde essa família mora é possível levar o filho em uma biblioteca? Tentamos sempre levar para um lado que não cobra o pai de algo que ele não é capaz de fazer ou ter naquele momento”, conta a professora Fabile Scorciapino, responsável pela curadoria de conteúdos.
De acordo com Scorciapino, conforme os alunos crescem e adquirem maior autonomia para fazer atividades sozinhos, a família tende a se distanciar mais da educação deles. “Eu acho que a ferramenta cumpre a função de dar pequenos alertas para esse pai, que em meio à correria do dia a dia, mesmo trabalhando e tendo pouco tempo com filho em casa, existem coisas que ele pode fazer para se aproximar”, diz.