Tecnologia facilita interação e aprendizado entre pares durante aulas remotas
É possível ir além da aula expositiva e adotar atividades colaborativas apoiadas no interesse dos alunos
por Maria Victória Oliveira 24 de setembro de 2020
A migração do ensino para o ambiente virtual em razão da pandemia de COVID-19 abriu um verdadeiro mundo de novas possibilidades para professores, orientadores e estudantes. Depois de meses nesse modelo, já ficou claro que aulas exclusivamente expositivas não são o suficiente para motivar e engajar os estudantes. Nesse sentido, muito tem se discutido sobre a importância de dar espaço para que alunos se posicionem e se manifestem.
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Para promover encontros que possibilitem diálogos e troca entre pares, entretanto, é necessário que professores compreendam que a interação tem várias formas de acontecer, seja dentro ou fora do horário de aula. Não se trata de mais uma metodologia para sobrecarregar ainda mais os docentes, já tão atarefados com novos aprendizados e demandas durante a quarentena, e sim promover o aprendizado conjunto, manutenção e criação de vínculos e laços entre crianças e jovens.
Luciana Honda, especialista da área de Língua Portuguesa da Camino School, pontua que a troca de experiências entre estudantes é valiosa pois, ao “falarem a mesma língua’ e debatendo temas e conteúdos entre eles, cada um se reconhece dentro do grupo. “Eu sinto que, principalmente no aprendizado a distância, quando os alunos estão interagindo entre si, o aprendizado é mais significativo e tem mais valor. É aquilo que chamamos do ‘aprendizado que fica’. O professor é simplesmente quem acende a luz do caminho do conhecimento, mas somente com esse fio condutor e sem vínculos entre os alunos, muita coisa se perde.”
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Ela exemplifica que uma das turmas da escola está trabalhando amizade e, por isso, a proposta da aula foi usar um determinado tempo para entrar em contato com algum colega. “Não colocamos um roteiro a ser seguido. Incentivamos que as crianças se falassem e depois contassem como foi estar com o amigo.”
Trabalhos em grupo são outra alternativa para possibilitar o contato entre a turma e, ao mesmo tempo, propor o conhecimento dos colegas. Durante a aula, isso acontece com a divisão da turma em subgrupos. As aulas começam com as minitarefas, ou seja, alguns minutos reservados para que a professora introduza o assunto, reforce a importância de trabalhar aquele tema e faça algumas perguntas aos estudantes. “No primeiro momento, tento despertar a atenção e trago alguma informação que vai instigá-los e ser o meu gancho. Dou um tempinho para que pensem sobre o assunto e vamos incentivando aqueles que estão mais quietinhos. Fazemos como se fosse uma mesa redonda, tudo virtual”, explica Luciana.
Em seguida, os alunos são divididos em salas paralelas. Um mesmo subgrupo pode contar com crianças que trouxeram contribuições semelhantes ou opostas, a depender da intenção da professora no dia. “Estamos trabalhando movimentos sociais com o quinto ano do ensino fundamental e, no trabalho de língua portuguesa, sempre conectamos um gênero textual à proposta. Cada grupo deve desenvolver uma reportagem sobre um movimento social escolhido. Os alunos podem se reunir nessas salas paralelas durante a aula ou em um momento extra-aula que definem entre si para conversarem.”
Nesses casos, ferramentas online como a criação de documentos compartilhados facilitam o trabalho e o acompanhamento da evolução dos estudantes pela professora. “Quando eles compartilham o arquivo comigo, consigo acompanhar e dar feedback, indicando se estão indo no caminho certo ou não.”
Menos ruído, mais feedback
Muitos professores têm relatado longas jornadas de trabalho durante o fechamento das escolas para dar conta de todas as demandas. Mesmo assim, é missão quase impossível atender todos os alunos rapidamente. Por isso, para Sérgio Daniel Ferreira, professor e diretor do Instituto CLQ, uma forma de diminuir ruídos de comunicação ocasionados pelo contato mediado por tecnologia é investir em atividades pensadas a partir de rubricas.
“Rubricas nada mais são que uma escala de proficiência que os estudantes devem demonstrar ao professor sobre determinado tema. É como uma espécie de orientação ao aluno. No ensino online, elas servem muito para ajudá-lo a entender o que o professor está esperando dele e como podem realizar determinada atividade”, explica, citando ainda grades de correção utilizadas por corretores de redação como um tipo de rubrica.
Para Sérgio, uma rubrica bem elaborada e descrita pode apoiar o aprendizado do aluno e também diminuir o tempo de resposta do professor. “Uma das coisa que mais dificulta as aulas ou atividades online é a demora no feedback (retorno avaliativo). Se o estudante questiona e a resposta demora, ele acaba esquecendo porque teve aquela dúvida e se desprende da atividade na qual estava engajado. Então, se o aluno leu as rubricas e não se identificou com alguma coisa, ele se comunica com professor que tem uma escala para essas rubricas, e assim ele consegue dar feedback rápido.”
Potencialidades da tecnologia
Apesar de apresentar novas possibilidades de interação e contato mais rápido, também é preciso estabelecer acordos acerca do uso das tecnologias. Sérgio afirma que, se existem momentos que câmeras e microfones devem ser desligados. “Também devemos pedir para que câmeras e microfones sejam ligados para que os estudantes não fiquem apenas dentro dessas bolhas sociais em suas casas.”
Uma estratégia para incentivar essa interação e engajar os alunos é promover a participação de pessoas de fora do círculo escolar, uma vez que o uso massivo de tecnologia durante a quarentena encurtou ainda mais as distâncias. “Uma coisa legal é convidar pessoas para falar de determinado assunto que interligue várias disciplinas, ou até mesmo propor desafios de trabalho em equipe, mesmo à distância. Para tudo isso, um passo importante é envolver os estudantes no processo. Temos a ideia de que todos os pontos da aula devem ser planejados ou esquematizados, mas o professor não precisa pensar em todos os detalhes. Crianças e jovens muitas vezes tem soluções interessantes.”
Em uma das escolas onde atua, a diretoria costumava organizar feiras de profissões para o ensino médio. Sérgio propôs que a prática acontecesse de forma online durante a quarentena, mas com uma mudança: os alunos, divididos em grupos, ficariam responsáveis pelos palestrantes, abertura e divulgação do evento. “Dessa forma, inserimos os estudantes diretamente no processo de construção de sua própria aprendizagem. Isso é uma coisa muito poderosa na educação, que às vezes esquecemos de usar. O professor não vai precisar quebrar a cabeça sozinho, ele vai coordenar múltiplas habilidades e competências que os alunos podem desenvolver com essa atividade, uma estratégia que pode ser usada em diversas níveis de ensino e para diferentes áreas do conhecimento.”
Saiba mais
Neste artigo, Sérgio lista dicas de formatos de atividades online durante a crise do coronavírus, como a realização de fóruns de discussão. Luciana também destaca o uso de múltiplas ferramentas digitais para diversificar o contato e propostas durante a suspensão das aulas, como Jamboard (um quadro online para anotações), Padlet (outra ferramenta para criação de quadros de anotações) e Mentimeter (uma forma de realizar nuvens de palavras online e colaborativamente).