7 projetos científicos que buscam mudanças sociais
Na maior feira de ciência jovem da América Latina, alunos propõem estudos que visam transformar sociedade
por Redação na Rua 3 de novembro de 2014
Por Danilo Mekari, do Portal Aprendiz
O surgimento do universo, a Pangeia, a teoria da relatividade, a gravidade e as marés do oceano são algumas das descobertas científicas mais complexas da história da humanidade. Mas engana-se quem pensa que ciência se resume a grandes explorações. Na Mostratec (Mostra Internacional de Ciência e Tecnologia), realizada na semana passada no Centro de Eventos Fenac, em Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, pequenos inventores com grandes ambições apresentaram propostas que visam a transformar o planeta em que vivemos. De todo o mundo, aproximadamente cinco mil escolas estiveram representadas nos corredores e estandes do evento, sendo 70% da rede pública e 30% da privada. Ao todo, 488 projetos participaram da maior feira de ciência jovem da América Latina.
O Portal Aprendiz esteve na Mostratec e selecionou sete projetos que procuram transformar a sociedade a partir de uma experiência local, promovendo a discussão de uma nova escola e uma nova cidade. Confira:
1) Células Estudantis de Aprendizagem Cooperativa: uma estratégia para a aquisição de competências cognitivas e intervenção pedagógica no ensino básico
Estudantes da EEEM Senador Fernandes Távora, em Ereré (Ceará), Danillo e Bruna observaram que um dos problemas da aprendizagem estava na relação entre os próprios alunos dentro da sala de aula. Eles propuseram, então, a criação de Células Estudantis de Aprendizagem Cooperativa: atividades em que os alunos ensinam uns aos outros no contraturno da escola, sem a mediação de professores. “Na nossa turma, a aprovação subiu de 59% para 80%”, revela Bruna. Com os resultados positivos, a coordenação pedagógica e a diretoria aceitaram implementar as células nas outras seis turmas de ensino médio.
2) Portal Transparência: um instrumento para o exercício da cidadania
A mineira Júlia sempre se interessou por política. Tanto que, em 2011, foi eleita Vereadora Mirim de sua cidade natal, Ipatinga. Desde então, estuda as contas e os dados da gestão municipal disponíveis no Portal Transparência, transformando em planilhas e gráficos o que considera uma linguagem “difícil de entender”.
“Acredito que tudo é disponibilizado de uma maneira excessivamente técnica e financeira. Mudei e passei a entender melhor como funciona a cidade”, explica a garota. Ela lembra da paralisação de dois meses de professores e alunos em 2011, quando o investimento da prefeitura em educação havia caído 6,8%. “No ano seguinte, aumentou 3,3%. Mas foram só os ânimos se acalmarem para, em 2013, o corte de gastos voltar com tudo.”
A transparência nas contas públicas é lei desde 2009, mas as pesquisas de Júlia mostram que 95% dos habitantes de Ipatinga não a conhece. “Tenho certeza que isso não ocorre só na minha cidade”, lamenta.
Em seu objetivo de semear o interesse pela política nos colegas, já conseguiu mobilizar sua comunidade escolar. Apesar de sonhar em compor a Câmara Municipal de sua cidade, Julia tem dúvidas quanto ao seu futuro. “Quero me formar em medicina e só depois fazer ciência política. Hoje, como jovem cientista, tenho receio de entrar na política. Será que eu vou continuar sendo livre assim?”
3) De casa para a escola: relações entre configurações e atitudes familiares e o desempenho escolar
Foi baseado no conceito de família tentacular – na qual a configuração tradicional entre pai, mãe e filhos inexiste – que os jovens Gabriela, Rithila e Marcus Vinicius, da Escola Alef Paraisópois (SP), buscaram entender o que prejudica tanto as crianças das escolas públicas em sua comunidade.
Segundo eles, essa mudança no conceito familiar não foi acompanhada pelas instituições de ensino, levando a um aumento da reprovação, da distorção idade-série e do abandono escolar.
Com base em pesquisas realizadas na rede pública de Paraisópolis, os jovens querem propor um modelo de escola que entenda essa nova configuração e, com isso, proporcione mais autonomia e independência aos alunos. “Vivemos essa realidade e queremos transformá-la”, afirma Marcus Vinicius.
4) O papel do núcleo de mulheres nos partidos políticos: discursos e práticas de 2014
A posição da mulher na sociedade brasileira também foi tema de trabalhos científicos da Mostratec. Alunas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, Bruna, Gabriela e Joana estudaram o papel do núcleo de mulheres nos partidos políticos em Esteio/RS. “Começamos com uma questão básica: por que eles existem? Depois, descobrimos que o que a sociedade machista impõe para a mulher também é replicado dentro do partido”, explica Joana.
Em um dos partidos pesquisados, por exemplo, a explicação para o baixo quórum do núcleo era a dupla jornada das mulheres: cuidar de casa e fazer política exigem muito tempo e dedicação. Elas citam ainda o número de vereadores de Esteio: 7 homens e 3 mulheres, exatamente como determina a cota eleitoral de gênero. “Os partidos não valorizam a mulher”, conclui Bruna.
5) A questão feminina na periferia de São Paulo: o programa Bolsa Família e a perspectiva de empoderamento
A questão de gênero também foi estudada por Fernanda e Manuela, da Escola Lourenço Castanho (SP). As garotas queriam descobrir como o Estado brasileiro enxerga a mulher que vive nas periferias urbanas, a partir do fato que 93% dos beneficiários do Bolsa Família são do sexo feminino.
“O Bolsa Família tem um potencial de empoderamento muito grande, quebrando a lógica de hierarquia na sociedade. Mas o Estado não pensa nisso, e só dá para a mulher porque acredita que é ela quem cuida de casa e dos filhos”, aponta Fernanda.
As garotas marcaram uma reunião com a Secretaria Municipal de Política para Mulheres de São Paulo e pretendem propor a realização de um questionário com as mulheres que vão retirar o benefício nos bancos. “Nosso objetivo é mapear as fragilidades da lei”, cita Manuela, lembrando que “mesmo após a criação da Lei Maria da Penha, a violência de gênero continua crescendo”.
6) O processo de formação da identidade do migrante nordestino a partir de diferentes discursos
Está enganado quem pensa que as ofensas declaradas aos nordestinos nas redes sociais acontecem apenas em períodos eleitorais. Foi com base nessa premissa que as estudantes Natália, Luíse e Isadora, do Colégio Giordano Bruno (SP), pesquisaram a relação entre o discurso xenófobo das redes sociais e a literatura brasileira que trata da população do nordeste. Para elas, os nordestinos “possuem identidade fragmentada e sempre reconstruída por conta da migração”. “Analisamos a gramática e as maneiras que a linguagem emprega ideologia”, explica Natália.
Nas redes sociais, a maioria dos discursos desconstroem a identidade nordestina, apelando a desqualificações. Já no livro O Quinze, de 1930, no qual a romancista Rachel de Queiróz retrata a jornada de uma família retirante, existe a construção de uma identidade que se aproxima muito mais do nordestino. “Diferentemente das redes, o narrador sustenta uma relação simétrica com os personagens.”
7) A prática de atividades físicas e desportivas como meio para ressocialização de reeducandos na unidade prisional de Imperatriz (MA)
No início de 2014, os acontecimentos chocantes na penitenciária de Pedrinhas, no Maranhão, abriram os olhos do mundo para a ineficácia do sistema carcerário brasileiro. O jovem maranhense Kaíque, do Colégio Santa Cruz, resolveu estudar como a atividade física poderia ajudar na ressocialização de detentos em um presídio de Imperatriz (MA). “O esporte ajuda a manter o corpo e a mente sãos”, defende Kaíque. “Estimular a realização de atividades físicas dentro da prisão é um método de assistência social que está previsto na lei brasileira, mas na maioria das vezes não é cumprido.”
Além de ser benéfico para corpo e alma, o esporte reduz o stress e cria laços entre os detentos. Sua pesquisa revelou que 98% dos presos tem vontade de realizar atividades físicas, e 95% deles acredita que isso facilitaria a ressocialização.
O jovem maranhense quer a participação de profissionais de Educação Física e psicólogos no projeto, que apresentará à Câmara Municipal de Imperatriz.
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