Danças do TikTok podem ensinar algoritmos e pensamento computacional
Atividade com alunos do 3º ano do ensino médio em São Paulo proporcionou mais dinamismo e participação na aula
por Caio Vinícius Gonçalves de Oliveira 26 de outubro de 2022
Sou professor de três turmas de 40 alunos do 3º ano do ensino médio na disciplina de Inovação e Startups, da Fundação Bradesco (SP). A implementação do Novo Ensino Médio ainda é algo novo para eles: o perfil dos estudantes é bem diverso, com alguns querendo seguir a carreira em tecnologia, outros em medicina, direito e diversas outras áreas.
Diante deste cenário, sempre tento desenvolver atividades que aliem habilidades técnicas e soft skills (habilidades relacionadas ao comportamento social), buscando atrair o interesse desses alunos e trazer referências do cotidiano deles. Para a aula de algoritmos e pensamento computacional, estava buscando formas mais dinâmicas de transmitir os conceitos em aula, até que me deparei com o vídeo abaixo, que foi minha inspiração para essa atividade:
Então propus uma atividade dividida em duas partes:
– Na primeira etapa, eles assistiram a este trecho do vídeo, que traz uma coreografia, para então descrevê-la na forma dissertativa de um algoritmo. O objetivo dessa etapa foi estimular a absorção da ideia de decomposição (um dos pilares do pensamento computacional). Também queria que eles treinassem a habilidade de pensar uma etapa de cada vez com um alto nível de detalhe, especificando qual membro do corpo deveria se mover, para qual direção e até mesmo quantos graus, dependendo da ação.
– Na segunda etapa, os alunos assumiram o papel de criar uma coreografia de até 30 segundos, no formato TikTok, para que o outro grupo tentasse interpretá-la e reproduzi-la, seguindo uma entrega que deveria conter:
- Decomposição: como podemos quebrar em problemas menores a criação da coreografia?
- Padrões: das dancinhas existentes, existe algo em comum entre elas que pode auxiliar a resolver nosso problema?
- Abstração: quais características são essenciais para termos a coreografia?
- Algoritmo: passo a passo da dancinha, de forma detalhada.
A atividade gerou uma dinâmica muito grande na sala, o que de certa forma trouxe o desafio de conter uma euforia enorme. Contudo, ao mesmo tempo, engajou estudantes que participavam menos das aulas. Criou-se um cenário que eu apelidei de “caos organizado”. No momento das apresentações, também enfrentei outra questão: convencê-los a dançar na frente de toda a sala.
Nessa situação, deixei bem claro que ninguém era obrigado a participar. Mas sempre gosto de citar o livro “A coragem de ser imperfeito”, da Brené Brown, como uma lição de que você não precisa ter medo de se mostrar vulnerável para os outros. Compartilhei minha própria experiência com a timidez até chegar onde estou hoje, como professor.
No começo houve certa resistência. Conforme os primeiros grupos toparam o desafio, cada vez mais senti que a vontade de participar da brincadeira ganhou espaço, ao ponto de alguns grupos ficarem ansiosos para apresentar sua coreografia. Alunos que até então disseram que não participariam, seja por timidez ou até mesmo medo de dançar em público, sentiram-se mais confortáveis para arriscar a coreografia na frente de todos.
Trazendo uma referência muito viva no cotidiano deles, pude perceber um aumento no engajamento dos estudantes, com uma atividade divertida. Ao mesmo tempo, eles puderam exercitar e constatar o quão é difícil dar instruções claras e estruturadas e como cada etapa do pensamento computacional é fundamental no momento de planejar um algoritmo.
O que é preciso para replicar esse projeto?
Essa é uma atividade que se enquadra na categoria computação desplugada, ou seja, não é necessário nenhum recurso tecnológico, somente papel, caneta e criatividade. Acredito que a principal dica é: seja bastante detalhista ao descrever cada etapa dos movimentos. É preciso, também, que sejam estabelecidos alguns limites sobre quais músicas e movimentos não são permitidos.
A entrega, neste caso, foi um documento com o algoritmo no formato narrativo, realizada via AVA (Ambiente Virtual de Aprendizagem). Foram avaliados o uso correto de estruturas lógicas de programação como condicionais e laços de repetição, bem como a clareza nas instruções do algoritmo.
Caio Vinícius Gonçalves de Oliveira
Formado em jogos digitais pela FMU, é pós-graduado em marketing e gestão pela ESPM. Tem experiência em agência de publicidade, na área de criação e desenvolvimento web, e no trabalho como analista de tecnologias educacionais, além de forte dedicação ao terceiro setor, assumindo cargos de forma voluntária em organizações como Mapa Educação, AIESEC e outros projetos sociais dedicados à educação.