Estudantes protagonizam evento para falar de educação na perspectiva do jovem
Educação 360 Jovem reúne alunos de diferentes regiões do país para debater currículo, metodologias e formas de participação
por Marina Lopes 17 de abril de 2018
“As gerações são outras, mas os métodos de ensino são os mesmos de anos atrás.” Foi assim que Gianluca Vilela Piccin, 15, do Colégio Novo Tempo de Santos, no litoral de São Paulo, deixou claro o recado: os jovens querem mudanças na educação. Para debater o que e como eles querem aprender, o evento Educação 360 Jovem, que pela primeira vez foi totalmente voltado para o tema de juventude, teve o protagonismo de quase 80 estudantes de diferentes regiões do país. O encontro aconteceu nesta segunda-feira (16), no Museu do Amanhã, localizado na região central do Rio de Janeiro (RJ).
Em uma plateia dividida majoritariamente entre educadores e estudantes, o evento promovido pelos jornais O GLOBO e Extra contou com a presença dos jovens para falar sobre currículo escolar, metodologias e formas de participação. Em diferentes painéis, eles dividiram o palco com especialistas em educação e ainda contaram com o apoio de colegas de diferentes escolas, que mesmo sem subir ao tablado, puderam acompanhar o debate com lugar reservado nas primeiras filas e ainda tinham espaço durante todo o dia para trazer questionamentos e reflexões ao microfone.
Entre os participantes, estiveram presentes dez estudantes das cinco regiões do país que fazem parte do Conselho Jovem do Porvir, uma iniciativa criada para estimular a produção de conteúdos e a mobilização social em prol da participação do jovem na transformação da educação. São eles: Ana Clara Nunes, Curitiba (PR), Anna Júlia Lustosa, Belém (PA), Caio Henrique Santos, Recife (PE) Gianluca Piccini, Santos (SP), Jaíra Lima, Porto Velho (RO), Mariana Lima, Campo Grande (MS) Rafael Paiva, Salvador (BA), Tamires Costa, Porto Alegre (RS), Túlio Fogagnoli, Rio das Ostras (RJ) Yasmin Oliveira, Cuiabá (MT).
Boa parte das demandas apresentadas pelos jovens carregaram o desejo por uma escola mais conectada com os seus interesses e uma formação capaz de ajudá-los a enfrentar os desafios da vida. “A escola também tem que nos preparar para viver e atuar na sociedade, não dá para ficar só nos conteúdos acadêmicos”, diz Eduarda Pessoti, 16, de Aracruz (ES), que estuda na Escola Sesc de Ensino Médio, no Rio de Janeiro (RJ).
Aquecimento
Na véspera do Educação 360 Jovem, os cerca de 80 estudantes presentes no encontro participaram de uma espécie de “esquenta” no Hotel Intercity Porto Maravilha, na região portuária do Rio de Janeiro. Durante uma tarde, eles se dividiram em três grupos e debateram coletivamente questões que guiaram os três painéis do evento: O que jovens querem aprender? Como os jovens querem aprender? Como os jovens devem participar da educação?
A partir das reflexões feitas nos grupos, os próprios jovens elegeram representantes para subir ao palco do Educação 360. A ideia era que eles fossem responsáveis por compartilhar com o público as principais discussões, conclusões e propostas conversadas com os colegas de diferentes estados.
O que os jovens querem aprender
Depois de traçar um panorama do ensino médio brasileiro, que segundo especialistas e jovens precisa de mudanças, o primeiro painel do evento debateu o currículo na perspectiva dos estudantes. Eles defenderam mais liberdade de escolha, carga horária das disciplinas personalizada, espaço para falar sobre diversidade e conhecimentos sobre política, cidadania e como lidar com as emoções.
“Os jovens são o futuro do país. Se não aprendermos a ser críticos, quem será por nós?”, questiona a Bárbara Souza Faria Correa, 15, do Sesi Senai Aparecida, de Goiânia.
Para Ítalo Dutra, chefe da área de Educação do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância) no Brasil, apesar da dificuldade que as escolas enfrentam para transformar as reivindicações dos estudantes em mudanças concretas, elas precisam criar uma metodologia para ouvir os jovens. “Nós precisamos fazer processos de escuta sobre o que vocês [estudantes] querem aprender” defende. “Tem coisas que o estado brasileiro, a sociedade e as famílias precisam ofertar para vocês, mas tem coisas que vocês precisam fazer escolhas.”
Como os jovens querem aprender
Com foco nas metodologias, o segundo painel trouxe a voz dos jovens para debater formas de aprender que consideram os ritmos, tempos e interesses de cada estudante. “Quando a gente fala como quer aprender, a gente lembra desse ensino de quarenta alunos enfileirados. Isso é muito cruel”, diz a estudante Rafaela Obrownick Lopes, 16, da Escola Estadual José Maria Matosinho, de Campinas (SP).
Na visão da estudante, a mudança de métodos não requer necessariamente muitos recursos. Isso pode ser feito dentro da realidade de cada escola, seja com livros, com filmes e com atividades práticas. “Os alunos querem entrar em uma sala onde os olhos dos professores brilham”, diz.
“O segredo é esse: o aluno tem que ser o protagonista e a gente tem que perder o medo disso”, sugere o professor de artes Jayse Ferreira, que desenvolveu novas metodologias baseadas nos interesses da sua turma na Escola de Referencia em Ensino Médio Frei Orlando, em Itambé (PE). O empreendedor e educador Fábio Zsigmond, sócio-fundador do Mundo Maker, iniciativa que promove a alfabetização digital por meio de projetos, também destacou uma questão fundamental apresentada pelos jovens durante todo o encontro: a necessidade do estudante encontrar sentido no que está sendo apresentado na escola. “Você tem que saber desde o início qual o propósito daquilo que você vai ensinar e aprender.”
Como deve ser a participação dos jovens
Em um período onde os estudantes demonstram cada vez mais que desejam participar da educação, boa parte das escolas ainda não abrem espaços para que eles se envolvam nas decisões cotidianas. No terceiro painel, Ana Clara Nunes,15, que fez parte da ocupação do Colégio Estadual do Paraná em 2016, destacou que a educação deve ser feita com os estudantes. “Até onde vai a participação da juventude? Ela só vai até onde a direção deixa? É importante lembrar que os estudantes têm autonomia, e a gente luta.”
Ao compartilhar a experiência da sua instituição com a gestão democrática, a diretora Flávia Rezek, da Escola Municipal Rio de Janeiro, que tem uma das 15 maiores notas do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) disse que as portas da sua sala estão sempre abertas para atender as demandas dos jovens. “Protagonismo é desenvolver a consciência de que os jovens são os agentes do seu futuro.”
“A escola tem que ser um exercício da democracia que a gente quer. Estamos vivendo uma crise de valores tão profunda, que é a escola que pode recuperar isso. Eu aposto muito na escola com essa possibilidade de reconstrução da dinâmica do diálogo, da possibilidade de uma nova sociedade a partir dos desejos que vêm dos jovens”, encorajou Gabriel Medina, analista sênior no Instituto Unibanco.
No encerramento do evento, com o objetivo de apresentar justificativas, princípios e propostas concretas para apoiar a participação de jovens na educação, também aconteceu o lançamento do documento “Juventudes pela Educação: Propostas para fortalecer a participação das juventudes brasileiras em prol da melhoria da educação”. O material foi desenvolvida pelo Movimento Todos pela Educação, em parceria com o Instituto Inspirare e o Instituto Unibanco, com a contribuição de um grupo de mais de 60 colaboradores, entre jovens e adultos que atuam nas áreas de educação e juventude.
O Educação 360 Jovem teve o patrocínio master do Sesi, patrocínio da Fundação Telefônica e Colégio pH, além de apoio da TV Globo, Futura, Unesco, Unicef, Instituto Inspirare, Uber e Companhia das Letras.