O que considerar ao preparar a transição entre ensino remoto, híbrido e presencial - PORVIR
Crédito: FGTrade/iStockPhoto

Coronavírus

O que considerar ao preparar a transição entre ensino remoto, híbrido e presencial

Especialistas reforçam importância de avaliar a evolução da pandemia e indicam como tecnologia e vivências de 2020 podem apoiar práticas baseadas na aprendizagem ativa

Parceria com CLOE

por Maria Victória Oliveira ilustração relógio 27 de janeiro de 2021

Se antes o movimento foi de pensar como adaptar a educação presencial para o mundo online, agora o desafio é o inverso: criar maneiras de adaptar o online para o presencial novamente. A ideia é desafiadora pois não se trata de voltar exatamente ao modelo de antes da pandemia, mas sim incorporar estratégias bem-sucedidas descobertas e colocadas em prática nesse período.

Por mais que “ensino híbrido” tenha se tornado recentemente uma das expressões mais buscadas e ouvidas por professores, o planejamento para 2021 precisa levar em conta o contexto da escola e como a comunidade foi afetada pela pandemia. “Acredito que a primeira coisa a entender é que não existe uma receita, cada rede vai precisar construir seu próprio modelo. Mas considerando que ainda estamos vendo movimentos de fechamento em razão da pandemia, aconselhamos que vale pensar em rotas com grande porcentagem online. Não adianta pensarmos que 2021 vai começar com força no presencial”, explica Leandro Holanda, diretor da Tríade Educacional.

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Para o especialista, existem pontos que cada instituição de ensino deve prestar atenção na hora de realizar seu planejamento: entender sua infraestrutura tecnológica, os conhecimentos de seu corpo docente, a quantidade de aulas presenciais que os estudantes poderão ter, se o modelo adotado será mais presencial ou online, e inúmeros outros fatores, praticamente todos eles com alguma implicação na área da saúde.

Apesar da proximidade do início do ano letivo, o representante da Tríade Educacional reforça que ainda é possível que redes e escolas invistam em momentos dedicados ao planejamento das aulas, que pode ser dividido em fases e contar com reuniões para reavaliação com o desenrolar da pandemia no país.

A potencialidade do ensino híbrido
As aulas online de 2020 não se classificam como ensino híbrido e sim ensino remoto. Isso porque, no ensino híbrido, explica Leandro, há uma preocupação em de fato integrar o que acontece de forma remota e o que acontece presencialmente, e não, por exemplo, transmitir a aula para um grupo que está online ao mesmo tempo em que o professor ministra para outro grupo presencialmente.

A vivência durante o ano passado possibilitou que muitas pessoas pudessem conhecer essa metodologia e, em alguns casos, escolas pudessem experimentar, mesmo que pontualmente, algumas estratégias que podem ser adaptadas para ensino híbrido na retomada das aulas presenciais. (baixe o e-book “O que considerar na implementação do Ensino Híbrido”).

“Algumas redes terão possibilidade de uma maior carga presencial, seja porque a região está com número menor de casos ou porque a escola tem um espaço e estrutura apropriada. Com mais alunos no presencial, alguns modelos de ensino híbrido fazem mais sentido, como os modelos rotacionais. Se a escola for trabalhar com a perspectiva de ter mais alunos online, outros modelos são mais indicados, como o virtual enriquecido, no qual há uma rota virtual que o estudante percorre, que é enriquecida de momentos presenciais para tirar dúvidas e realizar outras atividades”, exemplifica Leandro.

Além dessa visão do ensino híbrido enquanto ferramenta que pode apoiar o combate à pandemia, Diana Tatit, gerente pedagógica da CLOE e integrante do grupo Tiquequê, traz a percepção de uma ressignificação dos momentos presenciais, nos quais há possibilidade de interação com colegas. “Nesse período de quarentena, uma das principais aprendizagens foi a importância do encontro. Isso fez muita falta, em todos os âmbitos. Na educação, a discussão pode ser: por que estamos todos juntos para ler um texto individualmente que poderia ter sido lido em casa?”, reflete.

Para a educadora, se essa discussão já acontecia antes mesmo da pandemia, a vivência em 2020 aumentou o impacto e chamou ainda mais atenção para a necessidade de aproveitar melhor os momentos do coletivo, com diferentes tipos de interação, possibilidade de articulação e trocas e de cada estudante se colocar e esclarecimento de dúvidas.

O papel dos professores na readaptação
Mesmo que a tecnologia tenha tido um papel durante a quarentena, é impossível afirmar que ela se constituiu como uma solução totalmente eficaz, uma vez que muitas redes e escolas não contam com a infraestrutura adequada para disponibilizar atividades online para os estudantes. Nesse sentido, Leandro explica que o ensino híbrido não está necessariamente focado na tecnologia.

“É possível fazer a integração entre remoto e presencial sem ter a tecnologia, com, por exemplo, atividades impressas. Então a lógica do ensino híbrido depende muito mais de pessoas, ou seja, de quem planeja, do que da tecnologia em si”, reforça. Por isso, outra dica a ser considerada no momento de planejamento é avaliar, de acordo com as expectativas, quais habilidades os alunos deverão trabalhar online e presencialmente.

Esse redesenho do currículo – antecipar alguns conteúdos para serem trabalhados online e protelar outros que podem ser vistos presencialmente – pode ser apoiado pelos Mapas de Foco da BNCC, como indica Leandro. As produções do Instituto Reúna apresentam uma seleção de habilidades focais para cada ano do ensino fundamental de acordo com a Base Nacional Comum Curricular, com o objetivo de orientar a flexibilização curricular em situações como a pandemia.

A estratégia pode, inclusive, facilitar a visualização do que foi trabalhado ainda em 2020 e evitar a repetição de aulas no ano letivo que vai começar.

O protagonismo dos estudantes na aprendizagem ativa
Independente da estratégia adotada, algumas redes e escolas passaram a fazer maior uso de atividades que envolvem os estudantes de forma mais ativa, uma vez que, tirando o componente presencial da equação, observar a produção de crianças e jovens é uma das formas mais indicadas para avaliar sua aprendizagem. Por isso, uma das técnicas usadas ao longo do ano que passou foi priorizar atividades que envolvessem os estudantes de forma mais ativa.

“Uma colega que dá aula para o ensino fundamental e médio compartilhou comigo que seus alunos não se sentiam à vontade para ligar a câmera. Então, com a câmera fechada, nós não temos a certeza nem de que o estudante está olhando para a tela. Mesmo assim, olhar para o professor não é garantia de aprendizagem. Por isso, o docente só vai conseguir realmente avaliar se o aluno está aprendendo e participando a partir de suas produções, daquilo que ele próprio realiza”, comenta Diana.

O movimento de colocar o aluno no centro de todo o processo de ensino e aprendizagem está diretamente relacionado à abordagem da aprendizagem ativa, ou seja, dar foco para as ações do estudante, seja uma atividade ou ação intelectual. “Eu acredito que o ensino remoto estremeceu as bases de professores que estavam habituados a fazer as coisas sempre do mesmo jeito. Para aqueles que estão realmente comprometidos com a aprendizagem dos alunos, houve uma transformação e há a perspectiva da construção de da aprendizagem com ferramentas que ajudem a fazer essa educação mais ativa, focada e objetiva”, reforça a educadora.

Aprendizagem baseada em projetos
Se o protagonismo dos estudantes está relacionado a abordagens que incentivam a criação e a mão na massa, uma das metodologias que tem sido utilizada é a aprendizagem baseada em projetos. Para Diana, a essência por trás dessa estratégia é promover uma compreensão do contexto do conhecimento que o estudante está adquirindo. “O que a escola faz, na maioria das vezes, é tirar o conhecimento do mundo e trazer para a sala de aula. Em muitos casos, isso leva a algo totalmente desvinculado. Então o aluno está aprendendo conceitos e fórmulas mas não faz a menor ideia de para que isso serve.”

Para Denise Curi, coordenadora da área de Ciências da Natureza do Colégio São Luís, em São Paulo, a prática da aprendizagem baseada em projetos é composta por etapas claras que devem guiar o trabalho. A existência de um tema com uma pergunta motivadora da investigação é um primeiro passo. A partir disso, desdobram-se algumas fases, como a sensibilização dos estudantes para o problema em questão e a parte da pesquisa – ambas podem ser feitas virtual ou presencialmente -, e o planejamento do projeto em si, ou seja, como o estudante irá responder a pergunta inicial.

“Quando trabalhamos com aprendizagem baseadas em projetos, não estamos pensando apenas no conteúdo ou como o aluno aprende, mas também como ele trabalha com os colegas, como consegue conectar e integrar diferentes conhecimentos e como explica o que aprendeu”, explica Denise.

Em 2020, o Colégio pôde trabalhar diferentes modelos de aula. Do sexto ano do ensino fundamental até o terceiro ano do ensino médio, cada turma estudou um ODS (Objetivo de Desenvolvimento Sustentável) da ONU (Organização das Nações Unidas). O trabalho com um único tema pode envolver conceitos de áreas diversas. Por isso, a coordenadora reforça que a proposta foi inter, trans e multidisciplinar, com envolvimento de mais de um professor de acordo com os objetivos de sua disciplina.

A experiência remota rendeu percepções que serão úteis para os próximos meses de modelo híbrido, como a importância de pensar em atividades presenciais que realmente sejam diferenciais para os estudantes. “O momento presencial deve ser aproveitado para realizar um atendimento mais próximo, tirar dúvidas, para fazer trocas, discussões mais aprofundadas e aquelas atividades que o professor realmente precisa estar junto ou que ficaram limitadas de serem realizadas a distância. Além disso, nessa retomada teremos o cuidado de pensar atividades presenciais que realmente façam sentido. O momento presencial precisa ser rico, valioso, especial e único, caso contrário o aluno pode questionar o motivo de ir para o colégio”, ressalta.

As estratégias de aprendizagem ativa e ensino híbrido podem ajudar nessa missão. Ainda em fase de planejamento para a retomada gradual das aulas presenciais, Denise comenta que a equipe escolar irá considerar a viabilidade, por exemplo, da estratégia de rotação por estações. Nesse cenário, diferentes pontos devem ser observados: o grupo de alunos que está presencialmente na escola deve aproveitar o momento da melhor forma, como realizando experimentos no laboratório de ciências. Ao mesmo tempo, é possível usar a tecnologia para conectá-los aos estudantes do outro grupo, que estão assistindo a aula remotamente.

“Os alunos que estão online devem participar ativamente, e não só passivamente do processo, dando sugestões, palpites sobre como fazer o experimento e ideias de como que o aluno no presencial pode efetuar aquela investigação. Então, nesse sentido, a proposta não pode ser uma atividade experimental de apenas seguir um roteiro simples para comprovar alguma coisa, porque, para isso, existem milhões de vídeos na internet disponíveis, não é preciso estar no laboratório da escola. Entretanto, se a proposta for um problema investigativo e o aluno, juntamente com o seu grupo, precisa pensar qual estratégia vai seguir sem ter um roteiro pré-determinado, aí sim quem está em casa poderá participar da atividade também. É óbvio que quem está no laboratório vai colocar a mão na massa. Então, é necessário ter cuidado para cada atividade prática envolver um grupo diferente”, completa.

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aprendizagem ativa, aprendizagem baseada em projetos, competências para o século 21, coronavírus, ensino híbrido, tecnologia

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