Aprendizados recentes dão pistas sobre processos que as escolas precisam superar
Colaboração digital, abertura ao novo e aproximação com as famílias estão entre as novas rotinas que devem permanecer na escola em 2021
por Maria Victória Oliveira 2 de fevereiro de 2021
O acolhimento de estudantes e professores na retomada gradual das aulas presenciais em 2021, bem como a importância de diagnósticos para possibilitar processos de recuperação de aprendizagem, não são os únicos pontos aos quais as escolas devem se atentar na volta da vida na escola. Depois de vivências inovadoras, será necessário analisar como incorporar as melhorias alcançadas à rotina escolar e decidir o que deve ficar no passado e não voltar à escola.
Carolina Beltramini, gerente de implementação da plataforma digital de aprendizagem CLOE explica que os benefícios da vivência com o digital em 2020 não se restringem à sala de aula, mas envolvem também a gestão escolar, a formação de professores, o relacionamento entre docentes de outras disciplinas e até mesmo a forma de se relacionar com as famílias. Para a especialista, depois de 2020, as escolas estão mais adaptáveis, ou seja, abriram-se ao uso de novas ferramentas que podem agilizar processos cotidianos.
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Planejamento, colaboração e formação dos professores
Para Carolina, depois do caminho percorrido em 2020, é mais provável que os processos colaborativos aconteçam, uma vez que os encontros que não aconteciam presencialmente entre professores de diferentes disciplinas foram facilitados por reuniões virtuais.
Ao invés de todos os envolvidos em um projeto precisarem se reunir presencialmente em um mesmo ambiente, existe a possibilidade de criar um documento a ser compartilhado com todos, que pode ser acessado remotamente, o que também é aplicável entre os estudantes. Vale ressaltar que esses modelos de interação já existiam antes, mas foram reforçados pelas circunstâncias do distanciamento social.
Esse viés colaborativo também se estendeu ao planejamento de atividades entre o corpo docente e coordenação das escolas. “Eu sinto que tanto a coordenação pedagógica quanto a direção estão mais abertas para visualizar a gestão de conteúdo e planejamento de aula com os professores a partir de ferramentas digitais”, comenta Carolina.
Essa também é a percepção de Ana Paula Martins, coordenadora pedagógica da Camino School, ao defender que um dos mais importantes aprendizados em 2020 foi mudar a mentalidade e buscar maneiras alternativas de desempenhar ações do dia a dia. “Nós temos o hábito de fazer as coisas sempre da maneira como estamos acostumados. Por isso, acredito que a primeira habilidade que não podemos deixar de ter depois de 2020 é olhar para o que estamos fazendo e pensar se não existem formas diferentes, melhores e mais práticas de fazer a mesma coisa.”
Tanto Ana quanto Carolina pontuam ainda que os aprendizados relacionados à formação de professores devem ser levados em conta daqui para frente. Se antes havia preferência para formações presenciais, a impossibilidade das mesmas em 2020 abriu caminho para que os profissionais pudessem enxergar os pontos positivos dos encontros formativos online. Ana Paula explica que o modelo online possibilitou a realização de formações simultâneas para todos os professores, ao invés de um representante acompanhar palestras e depois compartilhar os aprendizados com os demais. “Hoje algumas escolas até pedem para as formações serem online, devido à maior facilidade de encontrar horários que funcionem para mais gente”, completa Carolina.
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Impactos na relação família-escola
Outra mudança facilmente percebida se deu na interação entre a escola e as famílias. Se os grupos de WhatsApp já existiam antes de 2020, com a pandemia eles se multiplicaram, inclusive com a participação de professores e outras instâncias das escolas. Apesar de alguns pais e responsáveis terem experiências não tão positivas nesse quesito, Ana Paula avalia que esse contato alternativo foi um dos facilitadores que possibilitou a relação família-escola em 2020.
“Quando as escolas foram fechadas, tínhamos pouco mais de um mês de aulas, então o relacionamento entre família-escola-estudante estava começando a acontecer. Colocamos isso como prioridade, então os professores entravam constantemente em contato com os responsáveis para perguntar como estavam, se o aluno estava bem psicologicamente, se estava conseguindo acompanhar as aulas. Nós mostramos para as famílias como esse relacionamento é fundamental.”
Para a coordenadora pedagógica, o contato foi uma forma de reforçar que a educação e aprendizagem de crianças e jovens é um dever compartilhado, responsabilidade tanto da família, como da escola, independente se estudantes estão em sala de aula ou em casa.
Uso de plataformas e desenvolvimento dos alunos
Com a suspensão das aulas presenciais, o uso de plataformas digitais marcou grande parte das escolas. Alguns processos adotados no presencial deixaram de existir em muitos casos, como a chamada: o fato de o aluno entregar uma atividade ou estar online em momentos síncronos de aula já configurava como presença.
Além disso, outras possibilidades surgiram com o uso dessas ferramentas. Ana Paula exemplifica que, ao invés de estudantes contarem com um caderno para cada disciplina, podem ter um único para anotações, e direcionar as atividades para as plataformas.
Todos esses processos preveem o desenvolvimento e autonomia dos estudantes e, para isso, a coordenadora reforça que é necessário que professores não subestimem os alunos e tenham sempre em mente que crianças e jovens já nasceram com mais facilidade para lidar com o meio digital do que os adultos.
“No começo da pandemia, os pais ficaram muito preocupados sobre como alunos poderiam ser autônomos. Fomos encontrando maneiras para isso acontecer, desde entrarem sozinhos em uma reunião até carregarem um vídeo na plataforma. Isso foi muito bacana para entendermos que as crianças têm capacidade de serem autônomas e que nunca devemos subestimá-las. Ao contrário: devemos colocá-las em situações que precisam encontrar respostas para os problemas que estão vivenciando”, afirma Ana Paula.
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As necessidades de professores e alunos do século 21
A impossibilidade de ver o novo, atividades que não deem voz aos alunos e processos que não incluam a colaboração são pontos que a escola Genius, de Campinas (SP), pretende deixar para trás depois da vivência de 2020. Maricleise Luiza Januário, diretora pedagógica da escola, explica que apesar de já adotarem processos envolvendo a tecnologia, a suspensão das aulas presenciais fez com que a coordenação, juntamente com o corpo docente, pensasse em novas formas de desenvolver atividades e engajar os estudantes.
“Nós brincamos aqui na escola que existia um tipo de vida antes da pandemia e outro depois dela, é como se os professores tivessem ressurgido. Nós incorporamos isso no planejamento de 2021, encorajando a pensar sobre o que de antes da pandemia seria incorporado a esse novo professor, que tem mais possibilidades de se envolver com novas tecnologias, com uma escuta ativa e olhar diferenciado.”
Tendo a inovação como um dos pilares da instituição, Maricleise conta que foram muitas as formações em 2020, tanto no âmbito da gestão escolar, como na construção de uma rede de apoio aos professores, que incluía o acompanhamento psicológico para quem sentisse necessidade e técnico de colaboradores mais jovens, que davam suporte nas aulas à distância.
Práticas antigas bem-sucedidas foram reforçadas e novas ações adotadas. “Fatores que não usávamos nas aulas presenciais e que passamos a usar à distância com certeza serão aplicados no híbrido e farão parte da nossa didática. Passamos a usar gamificação, o check-in e check-out – momentos destinados a ouvir os estudantes no início e final dos encontros – para conferir um formato com começo, meio e fim, mapa mental para esquematizar e mensurar o que alunos estavam aprendendo, formulários para compor relatórios sobre como os conteúdos estavam sendo absorvidos, personagens virtuais de toda a equipe pedagógica para interagir com os alunos, e outras estratégias.”
Ainda que remotamente, a escola conseguiu colocar em prática o trabalho por projetos que potencializam a aprendizagem dos estudantes ao mesmo tempo que a tecnologia permite traçar uma espinha dorsal de atividades para os professores. “Os professores conseguem organizar seu pensamento com relação ao projeto, deixando claro o processo, os aprendizados, habilidades e competências que estão sendo abordadas em cada proposta. Assim, os docentes conseguiram visualizar que todo o trabalho que tinham no presencial estava sendo realizado no online.”
Atualmente a escola está vivenciando um processo de formação de professores quanto a realização de avaliações diagnósticas e aplicação de protocolos. “Temos discutido como era o professor de antes e como precisa ser depois de tudo isso. Não podemos perder o foco das necessidades não só dos alunos do século 21, mas também dos docentes. Não temos todas as respostas. A única que temos é a importância de trabalhar para que o aluno possa ser o que ele quiser e exercer isso na sociedade.”