Hologramas em tamanho real aproximam professor e estudantes em aulas online
Conheça o projeto do educador Alberto Rodrigues, de Piraju (SP), que encontrou na projeção holográfica uma maneira de minimizar o distanciamento social durante a pandemia.
por Alberto Rodrigues dos Santos 29 de setembro de 2021
Com o distanciamento social por conta da Covid-19, a educação foi uma das áreas mais afetadas e precisou se adaptar rapidamente para atender a milhares de estudantes.
Perguntas começaram a surgir sobre quais ferramentas, meios e metodologias poderiam ser utilizados, focando nas habilidades socioemocionais, e como poderíamos manter o vínculo dos estudantes com a escola. Com isso, o profissional da educação precisou se reinventar, lançando mão de tecnologias digitais.
A grande questão era: como podemos minimizar o distanciamento social durante a pandemia utilizando as tecnologias digitais? Após refletir sobre essa pergunta, surgiu uma hipótese:
– E se as aulas fossem ministradas por um “professor holográfico”? Como seriam?
Pensando nessas possibilidades, desenvolvi o projeto “Arte e projeções holográficas em tempos de pandemia”, utilizando o que já existe disponível na internet como ferramenta para reduzir a distância com os alunos durante a quarentena.
Processo de criação
A ideia foi ressignificar técnicas de imitação holográficas (holograma caseiro e projeção holográfica em tamanho real) difundidas nas plataformas de vídeos, transformando-as em um meio de comunicação entre professor e estudantes para ensinar arte por meio da “Contação de Histórias”.
A holografia caseira é uma técnica de imitação holográfica onde utilizamos a projeção de imagens gravadas previamente em aparelhos celulares. A técnica funciona com a utilização de um display transparente colocado sobre o celular, possibilitando a visualização em 3D da imagem do vídeo.
Já a técnica de projeção holográfica em tamanho real foi adaptada por mim para promover o encontro entre os alunos no retorno às aulas. É uma técnica de projeção holográfica em tamanho real que criei com o auxílio de um projetor e uma superfície transparente feita de acrílico, na qual foi possível visualizar o holograma dos alunos em tamanho real, causando a sensação da presença dos mesmos em sala de aula.
O projeto foi desenvolvido com crianças da educação infantil e ensino fundamental 1 da Escola Municipal Professor Gilberto Bonafé em Piraju, interior do estado de São Paulo, alcançando cerca de 200 estudantes, além de suas famílias.
Metodologia utilizada
O objetivo principal foi trabalhar as habilidades socioemocionais dos alunos durante a quarentena de forma lúdica, leve e divertida.
O projeto foi dividido em duas partes. Na primeira, os vídeos eram sobre contações de histórias ou explicações sobre movimentos artísticos que eram visualizadas na casa dos alunos por meio do holograma caseiro.
Como leciono para crianças de diferentes faixas etárias, produzia dois vídeos semanais; um sobre contação de histórias para as pequenas e outro, para as maiores, sobre movimentos artísticos.
A segunda parte do projeto foi desenvolvida no retorno às aulas. A ideia foi dar voz aos alunos, colocando-os como protagonistas de suas histórias vivenciadas durante o período de distanciamento da escola, utilizando uma técnica de projeção holográfica em tamanho real – possibilitando um encontro virtual entre os alunos que foram divididos em turmas separadas em dias alternados.
A ideia de criar aulas holográficas partiu de um projeto desenvolvido em 2016, intitulado “Holograma postal”, no qual os alunos participaram de um estudo sobre os tipos de comunicações, desde a comunicação via carta, passando pelo movimento de Arte Postal, e-mail, Skype até a holografia.
Nesta época, questionei sobre a presença física do professor em sala de aula:
– E se um dia, as aulas fossem ministradas por um professor que não está presente?
Com a quarentena, tal situação parecia se concretizar. Então, pensei em resgatar este projeto e adaptá-lo para o ensino remoto colocando em prática a teoria pensada anteriormente.
Mão na massa
Para iniciar o projeto, pesquisei diversos materiais para facilitar a confecção dos displays. Então, reciclei embalagens de presentes feitas de plástico transparente.
Os displays foram feitos com quatro partes no formato de trapézio de 5 cm de altura cada e, unidos, formam uma pirâmide invertida. Foram produzidos artesanalmente 200 displays que foram higienizados com álcool 70% e ensacados.
Para solucionar a questão da distribuição e facilitar a comunicação de todos os envolvidos no projeto, pensei em criar vários grupos de WhatsApp para explicar a proposta e combinar a retirada dos displays em horários marcados previamente na escola.
Aproveitei o mesmo canal do YouTube “Holograma postal” do projeto anterior e postei os vídeos gravados para o acesso dos pais e alunos.
Desta forma, poderia manter um canal de comunicação direta com os pais e estudantes, atingindo um maior número de participantes, além de acompanhá-los por meio de relatos, vídeos, fotos e áudios enviados durante o projeto.
Desenvolvimento do trabalho
O primeiro passo foi a criação dos roteiros das aulas para serem gravadas. Transformei meu quarto em um estúdio. Coloquei na parede um tecido na cor verde limão para criar o efeito de chroma key, posicionei o celular em um tripé e iniciei as gravações.
Em seguida, baixei as imagens no meu computador e editei os vídeos. Nas edições, inseri objetos em 3D, animações de figuras criando a impressão de que eu interagia com as imagens.
Depois, publiquei os vídeos em um canal do YouTube e enviei os links para os grupos.
Nas aulas, trouxe histórias que abordavam assuntos como: empatia, solidariedade, união, medo e diversidade. Além dessas aulas, também trabalhamos uma variedade de artistas e movimentos artísticos como: Almeida Junior, Kandinsky, Leonardo da Vinci, Van Gogh, Michelangelo, Arte Rupestre e Arte Egípcia.
Refleti muito sobre essa prática e pensei em dar continuidade após a volta às aulas.
Holografia na escola
Penso que neste momento de retorno é preciso dar voz aos estudantes, ouvir e promover a partilha de suas experiências. Mas como proporcionar o encontro entre os alunos neste momento de distanciamento físico, em que alguns voltaram para a escola e outros ainda estão em casa?
Para implementar o projeto de “Holografia na escola”, desta vez desenvolvendo uma técnica que permite a projeção de hologramas em tamanho real, pensei em gravar com cada turma relatos sobre a pandemia norteados por perguntas como: “Como você se sentia durante a quarentena? O que você pensa sobre o futuro depois da pandemia?”
Em seguida, editei os vídeos em casa e depois os exibi aos demais alunos como uma forma de compartilhamento sobre histórias, sentimentos, emoções, promovendo um encontro virtual.
As projeções foram feitas em tamanho real em uma superfície de acrílico transparente na tentativa de “causar uma ilusão óptica” parecida com um holograma. Tais projeções foram exibidas para os alunos que estão frequentando a escola e, por meio dos hologramas caseiros, para os alunos que optaram por ficar em casa.
Além de possibilitar esses encontros para o compartilhamento de histórias, a holografia possibilitou a vinculação com os conteúdos curriculares de cada ano e faixa etária.
Desta forma, o projeto proporcionou o vínculo do aluno com a escola, além de possibilitar a canalização de sentimentos e emoções por intermédio das tecnologias digitais.
O papel fundamental da arte pós-confinamento
Ao mapear o processo durante a quarentena e com a volta às aulas, percebi muito medo e insegurança dos alunos, familiares e professores. Havia muitas dúvidas sobre os protocolos e como seria a convivência dentro da escola. Percebi que era preciso dar voz aos alunos e trabalhar a escuta atenta/afetiva de todos. Penso que, neste momento, as linguagens artísticas são fundamentais para canalizar emoções reprimidas com o confinamento.
O ato de “contar e ouvir” as histórias por meio das projeções holográficas em tamanho real estimulou a empatia, o acolhimento, a capacidade de estar no lugar do outro. Viver a experiência a partir do encontro virtual com imagens digitais previamente gravadas gerou um ambiente de confiança e tranquilidade para um retorno saudável, principalmente, emocionalmente.
Os feedbacks recebidos foram os melhores possíveis. Acredito que a forma de ensinar proposta a partir das projeções holografias chamou a atenção das crianças e despertou o interesse pelos assuntos abordados.
O eixo temático “arte interativa”, proposto na BNCC (Base Nacional Comum Curricular), nos orienta a identificar e manipular diferentes tecnologias e recursos digitais para acessar, apreciar, produzir, registrar e compartilhar práticas, de modo reflexivo, ético e responsável.
Penso que as soluções estão aí. A questão é: como fazer? Como ressignificar estas ferramentas e trazê-las para a educação? Como transformar o que já existe na internet (entretenimentos) em ferramentas para ensinar?
Resultados alcançados
Em nosso projeto, a arte aliada às tecnologias ajudaram a canalizar os sentimentos dos alunos sobre a pandemia e isso impactou a sociedade, as famílias, amigos e seu ser, convidando-os a fazerem uma viagem para dentro de si.
Com isto conseguimos:
- minimizar o distanciamento social provocando a reflexão crítica sobre os conteúdos abordados;
- compartilhar histórias por meio das tecnologias digitais, proporcionando a construção de conhecimentos e desenvolvendo habilidades e competências em todos os envolvidos, colocando o aluno como protagonista no processo de ensino e aprendizagem.
Embora saibamos que nada substitui a presença do professor e da professora na escola, a utilização das técnicas de projeções holográficas proposta pelo projeto foi uma poderosa ferramenta no preparo desses alunos para o presente e o futuro, uma vez que vivemos em um mundo cada vez mais mediado por estas tecnologias em todos os aspectos da vida. Por isso devemos, enquanto profissionais da educação, estar sempre atualizados sobre as novidades tecnológicas que aparecem, criando conexões com os assuntos atuais, temas emocionais e conteúdos curriculares.
Quando a professora doutora Lúcia Santaella nos disse que o celular é “o mundo na palma da mão”, ela também nos ensina que na educação contemporânea o celular precisa ser um aliado, não um vilão, porque ele também é fonte de consulta, criação e produção de conhecimento.
Minha ideia foi realmente misturar as coisas, pois entendo que para descobrir novas possibilidades é necessário, antes de tudo, estar ciente de que precisamos romper com velhos paradigmas e propor experiências que às vezes podem dar certo ou não. Penso que são nas tentativas que vamos avançar, ou pelo menos criar uma centelha de luz na busca de nosso objetivo principal: um ensino de qualidade.
Alberto Rodrigues dos Santos
Mestre em artes pelo Instituto de Artes da Unesp (Universidade Estadual Paulista), graduação em artes pelas Faculdades Integradas Regionais de Avaré e professor efetivo de Arte da Rede Municipal de ensino de Piraju. É vencedor do Prêmio Professor Transformador 2020, com o projeto "Códigos da cidade", do Prêmio Arte na Escola Cidadã, em 2013, com o Projeto "Curta Folclore" e duas vezes finalista do Prêmio Educador Nota 10.