A gestão de escolas privadas diante do imprevisível em 2022 - PORVIR
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Inovações em Educação

A gestão de escolas privadas diante do imprevisível em 2022

Depois de quase dois anos de aulas remotas, quais foram os principais aprendizados da gestão escolar na retomada presencial?

Parceria com Isaac

por Ruam Oliveira ilustração relógio 17 de novembro de 2022

Em 2022, com a volta a um modo de aulas predominantemente presencial, certas práticas e processos entraram em choque com o jeito que a escola sempre funcionou, e coube às lideranças se adaptar ao novo cenário. Quais foram os aprendizados deste período que ainda são válidos? E como os planejamentos futuros devem levar em consideração tais vivências?

Estas são algumas das perguntas que talvez rondem as mentes de muitos gestores e gestoras escolares Brasil afora. E com razão. Ao se deparar com o crescimento no uso de tecnologias digitais, por exemplo, muitos gestores precisaram reformular a dinâmica da escola. 

Carol Lyra, diretora geral do Colégio Anglo Sorocaba, pontua que a escola já realizava algumas atividades baseadas em tecnologias digitais desde 2019. No entanto, esse uso ampliado pelas aulas remotas serviu como uma forma de fazer com que o corpo docente se aproximasse ainda mais de tais ferramentas. 

Ela afirma que um dos muitos aprendizados deixados por esse período é que, mesmo aqueles profissionais que não tinham tanta afinidade, passaram a enxergar com mais gosto tais ferramentas. “Os professores que tinham mais dificuldade ou mais resistência em adotar a tecnologia na sala não tiveram muita saída. E a consequência disso foi que, no nosso retorno, eles já sabiam usar com alguma facilidade e intimidade aplicativos para tornar suas aulas, mesmo as presenciais, mais interessantes e dinâmicas”, comenta. 

A capacidade de buscar e descobrir ferramentas digitais que ajudassem a dinamizar as aulas contribui, também, com a perspectiva de que a inserção de tecnologias digitais nos ambientes físicos tende a permanecer. Para a diretora, essa prática se reflete no planejamento escolar, que já prevê um engajamento maior dos professores na busca e na implementação desse tipo de ferramenta. 

É preciso ampliar o que entendemos como aprendizagem: ela inclui os aspectos acadêmicos e os socioemocionais.

Simone Andre, consultora educacional

Lucia Mateus, secretária-executiva do Colégio Sinergia, de Navegantes (SC), avalia que os aprendizados com a tecnologia durante as aulas remotas seguem sendo úteis para os dias atuais, inclusive na coordenação. Ela destaca a otimização de diversos processos escolares, como correção de provas e lançamento de notas, feitos por intermédio das ferramentas digitais. 

“Hoje, as várias ferramentas disponibilizadas no sistema acadêmico estão incluídas no planejamento: desde o uso contínuo da lousa digital ao material de apoio online, bem como a produção acadêmica, a prova online, o parecer descrito online… Tudo está disponível no sistema acadêmico que usamos internamente e que, no pós-pandemia, passou a fazer parte do cotidiano educacional”, diz a gestora.

Pontos de atenção

Só que o ano letivo não se resumiu a encontrar as melhores maneiras para adoção de tecnologias e ferramentas digitais. Entre algumas das principais dificuldades encontradas por diretores e coordenadores, conciliar o cuidado com a recomposição de aprendizagens e com a gestão de pessoas são temas que se sobressaem. A consultora educacional Simone André destaca que tais atividades foram realizadas, em muitas situações, sem o devido diagnóstico. 

“A necessidade de recompor aprendizagens e vínculos na escola, muitas vezes, foi trabalhada como a velha e ruim recuperação, sem diagnóstico das necessidades de aprendizagem, sem priorização do que é essencial entre essas necessidades, sem engajamento real dos professores e estudantes nesse processo e sem considerar as vivências de educadores e estudantes”, aponta. 

Simone reforça que não apenas os estudantes, mas professores, famílias, gestores e a comunidade escolar como um todo vivenciam um cansaço grande, fruto de desafios socioemocionais causados pelo distanciamento social e a retomada das aulas presenciais. “Sugiro que os gestores criem espaços de escuta, participação e colaboração entre professores, dando suporte para que eles se vejam mais capazes de dar suporte aos estudantes”, diz. 

Ao longo do período pandêmico, de acordo com a especialista, ficou claro que a escola possui grande valor para toda a comunidade escolar e para a sociedade. Os gestores devem, portanto, valorizar esse aspecto, ressaltando essa importância.

“Em segundo lugar, é preciso ampliar o que entendemos como aprendizagem: ela inclui os aspectos acadêmicos e os socioemocionais. E são esses últimos que fazem da escola um lugar de estabilidade, resiliência e colaboração para enfrentar as múltiplas crises que estão em jogo na educação hoje. E, finalmente, que educação se faz com as pessoas”, pontua.

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Outros eixos

Áreas que antes não possuíam tanto destaque, como a saúde mental, entraram de vez na vida e no horizonte dos gestores escolares. Problemas como bullying, depressão, ansiedade e dificuldades de socialização cresceram e aparecem com cada vez mais frequência dentro dos muros da escola. Qual a melhor maneira de enfrentar essas questões? 

Maira Piovezana, líder de diagnóstico escolar na Motrix, destaca: durante seu período enquanto gestora, cuidando de turmas do ensino fundamental e médio, o retorno presencial se mostrou desafiador porque muitos dos estudantes apresentaram diversos problemas de disciplina, concentração ou até mesmo uma etiqueta de como se portar em sala de aula. 

O aprendizado mais importante, que a humanidade havia esquecido, foi olhar o outro, enxergar o que o outro precisava e ser solidário.

Lucia Mateus, secretária-executiva do Colégio Sinergia

Saber como se comportar no espaço escolar, para Maira, é uma construção que começa na educação infantil. “Quando o aluno chega nas séries finais do ensino fundamental ou no ensino médio, [o comportamento] tem um impacto muito grande. É o combinado social da escola que foi perdido”. 

Neste aspecto, há um aprendizado a respeito das expectativas dos gestores com o retorno presencial. “Ninguém estava esperando esse tipo de comportamento”, comenta Maira. Isso porque havia, também, de grande parte dos gestores, uma esperança de tranquilidade na retomada das aulas que não se mostrou real no fim das contas. 

Aprendendo a comunicar

Esses novos desafios impostos fazem surgir percepções mais sutis que, igualmente, influenciam na maneira como os gestores pensam ao administrar suas escolas. “O aprendizado mais importante, que a humanidade havia esquecido, foi olhar o outro, enxergar o que o outro precisava e ser solidário. Seja no ensino do uso de equipamentos e metodologias ou no simples ato de ouvir em um momento que foi tão difícil para todos”, reflete Lúcia. 

O exercício dessas sensibilidades se converte, inclusive, no trato entre comunidade escolar e famílias. O distanciamento social e o uso de plataformas digitais fizeram com que a comunicação fosse repensada em muitos sentidos. 

Como uma espécie de legado, a pandemia deixou suas marcas nesse âmbito. Lúcia comenta que a tecnologia, por exemplo, além de facilitar processos administrativos, também encurtou o caminho em direção às famílias. 

Essa relação tão mais próxima foi sentida por muitos gestores. Maira percebeu uma melhora na comunicação durante as aulas remotas, mas isso se tornou uma lacuna no retorno ao presencial. Muitas famílias passaram a acompanhar mais de perto seus filhos e filhas, em uma interlocução mais direta com a escola, o que tende a diminuir devido a um novo modelo estabelecido. 

“A necessidade de recompor aprendizagens e vínculos na escola, muitas vezes, foi trabalhada como a velha e ruim recuperação, sem diagnóstico das necessidades de aprendizagem

Simone Andre, consultora educacional

Os aprendizados em relação à comunicação, aponta Carol, atravessaram diferentes etapas vivenciadas ao longo da pandemia. De início, as famílias e a comunidade passaram por uma crise por temerem pela saúde dos filhos e pelo aprendizado. “Depois, quando a gente volta à escola, percebemos um movimento de gratidão imensa aos professores. Os pais, ao acompanharem as aulas remotas, viram o perrengue que é a gente ter uma turma grande e alfabetizar todo mundo”, relembra a gestora. 

No entanto, esse sentimento acaba oscilando. A suposição da diretora é que toda a complexidade envolvendo a saúde mental pode transbordar de casa para outros ambientes, como a escola, por exemplo, e isso acaba caindo no colo do gestor. 

“Acredito muito que aqui na escola as pessoas amam o que fazem. Conversar com uma família, tentar mostrar o nosso trabalho e tentar diminuir a dor e o julgamento faz parte do que a gente faz”, conclui. 

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