América Latina pode inspirar o Brasil a melhorar formação de professores de inglês - PORVIR
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Inovações em Educação

América Latina pode inspirar o Brasil a melhorar formação de professores de inglês

Conferência na Inglaterra traz propostas para avanço em larga escala na proficiência de docentes da educação básica

por Renan Simão ilustração relógio 18 de maio de 2018

Se há um país que o Brasil precisa ficar de olho para implementar uma reforma educacional para o ensino do inglês, esse lugar é o Panamá. É o que diz Alberto Costa, gestor da Cambridge Assessment English, departamento sem fins lucrativos da Universidade de Cambridge que prepara e avalia professores de inglês e é referência em exames de proficiência. “Lá, eles treinaram 800 professores em nível nacional; pode ser pouco, mas se tivéssemos 400 aqui, já seria muito”, afirma o executivo em palestra na IATEFL, conferência internacional de professores de língua inglesa para estrangeiros realizada em Brighton, no Reino Unido, em abril.

O programa Panamá Bilíngue rapidamente elevou o nível de proficiência dos professores para B1, que permite conversas sobre experiências do dia a dia e produção de textos simples. Segundo dados do consultor independente Daniel Lowe, o governo do país da América Central gasta, desde 2014, 8 mil dólares por professor com o programa de capacitação, combinando treinamentos locais (9 meses; online e presencial) e internacionais (intercâmbio de um trimestre na Inglaterra). Os resultados são medidos pela certificação Cambridge CELT-P, para o ensino de alunos de 6 a 12 anos, e CELT-S, de 11 a 18 anos.

“A maior reclamação dos professores treinados é o sotaque britânico nos testes. Eles não estão acostumados com isso”, diz o inglês Lowe, que atua na etapa de avaliação do projeto. Uma possível mudança nessa dinâmica seria a ordem das capacitações. Primeiro, os professores estudam fora do país e depois há formação online e presencial. Para Lowe, o processo deveria ser invertido para melhor proveito do uso da língua no exterior.

No Brasil, a grande maioria dos docentes (85%, segundo dados do Ministério da Educação) não possui proficiência no idioma e menos da metade alcançou formação adequada para a disciplina no ensino fundamental, segundo o Censo da Educação Básica de 2017. A este quadro, soma-se que agora a língua inglesa será lecionada obrigatoriamente a partir do 6º ano do ensino fundamental. Com os novos objetivos da Base Nacional Comum Curricular, também há mais ênfase no ensino da língua com uma visão intercultural.

Com mais professores bem formados, o Panamá oferece a alunos de ensino médio a possibilidade de frequentar aulas de inglês fora da grade curricular e os de educação primária têm mais aulas semanais na grade de inglês e ciências – esta lecionada no idioma. Segundo estudo da Cambridge English, de Costa e Evelina Galaczi, 78 tutores de professores são necessários para garantir a sustentabilidade do projeto.

Venezuela
O caso venezuelano, por sua vez, demonstra como pode ser feita a correção em um modelo de ensino de inglês. Em 2007, o novo currículo nacional tornou o inglês disciplina obrigatória desde o 4º ano. Mas estudos apontaram que os professores ensinavam o idioma predominantemente usando o espanhol e sem a metodologia adequada por falta de formação.

Desde 2013, o British Council realiza em parceria com a iniciativa Micromision Simon Rodriguez (MMSR) um programa de capacitação e avaliação. São 50 tutores formando 500 professores-tutores e 2 mil professores por ano. Por conta de um nível baixíssimo de proficiência (de A0 a A1), os professores participam de um curso de dois anos aos finais de semana, além de observações de aula. Docentes de outras disciplinas e não-educadores também foram selecionados para o treinamento. O objetivo é impactar oito mil escolas do país e mais de um milhão de estudantes.

Aulas e materiais desenvolvidos pelos professores tentam elevar o interesse dos alunos pelo destaque ao contexto local, com temas como meio ambiente e geografia. Com alvo em uma proficiência primária, há muita repetição, os planos de aula têm etapas em espanhol e a parte em inglês tem roteiro destacado.

“O processo tem de ser sustentável. Tutores e autores de materiais didáticos precisam ser do próprio país”, diz a consultora inglesa Wendy Arnold, consultora independente do projeto. Sua orientação para o Brasil é também a de muitos professores a seus alunos. “O professor tem de usar o inglês fora da aula. Se não usa, vai perder o domínio. Por isso, o próximo passo do projeto é estabelecer redes de professores para que possam se observar e aprender entre si”, observa.

O que é preciso para adaptar
Sejam de natureza educacional, cultural ou política, há diversos fatores para considerar antes de fazer adaptações a partir de um sistema de formação continuada estrangeiro – mas há evidências de princípios e práticas centrais que devem ser seguidos.

É o que dizem os pesquisadores da Cambridge University Press Silvana Richardson e Gabriel Diaz em palestra no IATEFL. Baseando-se na análise de estudos de caso, a argentina e o uruguaio apresentaram algumas recomendações.

Outros destaques
Em meio a centenas de palestras em uma semana de conferência (assista a algumas delas aqui e aqui), destacamos abaixo conteúdos específicos do IATEFL 2018 relacionados à BNCC de inglês.

Para Valéria França, gerente de treinamento da Cultura Inglesa Idiomas e ex-presidente da Associação Brasileira de Professores de Inglês (Braz-Tesol), o que mais chama atenção sobre o congresso e a associação IATEFL é como essas iniciativas tomaram proporções internacionais. “A importância disso para os profissionais de ensino de língua inglesa que não são falantes nativos da língua é significativa. Deixa bem claro que qualquer professor de inglês, desde que tenha uma boa formação em seu próprio país e sempre busque um desenvolvimento contínuo, é um professor de inglês.”

De acordo com ela, não há mais espaço no mundo globalizado para uma escolha de professores de inglês que sejam apenas falantes nativos. “Esta mensagem ficou clara durante o congresso, onde este assunto voltava em várias palestras e workshops – somos todos professores de inglês e nosso país de origem não é mais uma questão”.

Alguns temas sobressaíram ao longo do congresso: a relevância da pesquisa acadêmica na práxis pedagógica; a importância de uma pedagogia crítica, que promove um pensar global e a relevância de um novo pensar sobre o papel da avaliação e testagem.

Na plenária da pesquisadora espanhola Lourdes Ortega, Valéria também disse que foi realçada a importância de manter o campo de pesquisa acadêmica sobre aquisição de uma segunda língua alinhada com o campo da prática pedagógica, buscando o lado pragmático. Segundo ela, a pesquisa às vezes gera resultados que são difíceis de digerir: como, por exemplo, o fato de que aprender o inglês mais cedo não seja necessariamente melhor (e esta foi uma fala de Ortega que deixou muitos professores assustados, já que, para Valéria, “quase todos nós trabalhamos em instituições onde ensina-se Inglês para crianças bem pequenas, com a promessa de um desenvolvimento mais rápido na aquisição da língua estrangeira”); e que alunos mais velhos podem sim aprender tão bem quanto alunos mais novos. “Não podemos tapar nossos olhos para as pesquisas e temos que fazer parte deste ambiente e usar estas oportunidades para aprimorar nossa prática pedagógica”, afirma a brasileira.


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avaliação, educação online, ensino fundamental, ensino médio, ensino superior, formação continuada, personalização, tecnologia

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