Encarar e aceitar a vulnerabilidade ajuda no desenvolvimento de crianças e jovens, defende educador
Na 3ª edição virtual do Congresso LIV, Eduardo Valladares compartilhou experiências pessoais para defender a importância de mais acolhimento, debate sobre emoções e espaço ao erro nas escolas
por Maria Victória Oliveira 2 de setembro de 2021
Para quem cresceu em uma escola onde o debate sobre sentimentos, características pessoais e habilidades socioemocionais não existia, pode ser um desafio compreender a fala de Eduardo Valladares de que “a educação do futuro não existe sem vulnerabilidade.”
O educador e designer de experiência de aprendizagem usou seu espaço durante a terceira edição virtual do Congresso LIV (Laboratório Inteligência de Vida), realizado nos dias 24 e 25 de agosto, para defender por que, depois de ter passado 16 anos como um professor que pouco se comunicava com os estudantes, ele acredita que “vulnerabilidade é potência’, tema de sua exposição.
Para Valladares, foram múltiplas e sucessivas as mudanças em sua vida depois que, em 2014, ele adotou uma postura de ouvir mais os seus alunos, e promover o acolhimento, ação que ele julga como fundamental no mundo de hoje.
Entretanto, o educador fez questão de reforçar que uma coisa não exclui outra: não só é possível, como aconselhável trabalhar conteúdos pedagógicos, mas, ao mesmo tempo, reservar momentos para discutir as habilidades socioemocionais e promover situações que estudantes e professores possam expressar suas emoções e sentimentos.
“Eu defendo o ensino de disciplinas e conteúdos, mas será que isso é mais importante do que desenvolver nas nossas crianças e jovens um espírito criativo, corajoso, cooperativo e de vulnerabilidade?”, questionou.
Autoconhecimento é fator determinante
Antes de falar sobre emoções, é necessário conhecê-las, o que também implica uma compreensão do mundo em que se vive. Eduardo comentou que se antes falava-se em um mundo V.U.C.A, isso é, repleto de volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade, hoje alguns estudiosos já apontam para um mundo B.A.N.I, acrônimo em inglês para fragilidade, ansiedade, não-linearidade e incompreensão, muito conectado, por exemplo, com a realidade imposta pela pandemia de Covid-19.
Diante desse contexto, o educador questiona se professores e professoras pelas salas de aula do mundo todo estão realmente abordando e levando em consideração esses fatores nas suas relações com crianças e jovens. “Eu defendo a tese de que a educação do futuro não funciona sem vulnerabilidade, mas, para isso, precisamos trazer muita coisa para a sala de aula. Será que, por exemplo, estamos sendo empáticos com nossos alunos?”.
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Esse processo de autoconhecimento também envolve os educadores. Compartilhando sua trajetória pessoal, Eduardo comenta a influência de algumas leituras, como o livro “A Coragem de Ser Imperfeito”, da pesquisadora e escritora Brené Brown. “O livro traz no título a frase: ‘Como aceitar a própria vulnerabilidade, vencer a vergonha e ousar ser quem você é.’ Percebi que tinha vergonha de mostrar minhas falhas. Comecei a conversar mais com meus alunos, entender mais o mundo deles e buscar mais compreensão sobre coragem, ousadia, falha e perfeição.”
Como falar de dor e sofrimento na escola
Que atire a primeira pedra quem nunca sentiu que não podia responder verdadeiramente à pergunta “Está tudo bem? Como você está?”. Eduardo citou o livro ‘Ostra feliz não faz pérola’, do escritor Rubem Alves, para evidenciar a pressão para que as pessoas sejam felizes ou estejam sempre bem em todos os ambientes, como na escola e no trabalho.
“Se partirmos do pressuposto de que todos temos e teremos dores e dificuldades e se diminuirmos nossa resistência a essa dor ao aprender a lidar melhor com ela e realmente senti-la, talvez tenhamos menos sofrimento. Está na hora de trazer o debate sobre como lidar melhor com nossos sentimentos e emoções para a escola”, explicou.
É dessa forma que se colocar em uma posição vulnerável, isso é, sentir medo, mas se propor à ação mesmo com medo relaciona-se à máxima ‘sentir é aprender’, tema do evento.
“Assumir sua autenticidade e identidade é vulnerabilidade. É quando entramos em um espaço de incerteza, assumimos riscos e fazemos uma exposição emocional. São atos de coragem, formas de nos colocarmos no mundo e enfrentar aquilo que nos dá medo. Então, no final das contas, a vulnerabilidade está mais para força do que para uma fraqueza e é por isso que vulnerabilidade é potência. Quando descobrimos que podemos ser vulneráveis e reconhecemos nossas verdadeiras habilidades, isso passa a ser uma potência na nossa vida.”
Vulnerabilidade e o erro
Para Eduardo, a temática não está apenas relacionada à postura das pessoas enquanto seres humanos, mas também à forma como os processos são conduzidos, por exemplo, na escola. Assim, vulnerabilidade também significa uma nova visão e abordagem sobre erros. “A aprendizagem do futuro pede, no presente, que sejamos mais vulneráveis e abertos a falhas, a falar ‘errei, tudo bem, vou recomeçar e tentar de novo’”.
Além disso, essa mudança na forma de encarar as coisas, nesse caso os erros durante um processo de aprendizagem, conecta-se ao acolhimento, cada vez mais necessário entre crianças e jovens, como aponta o educador.
“Nossos alunos e filhos estão precisando de mais acolhimento, de serem abraçados, envolvidos, escutados com empatia e conexão. Nossos educadores, diretores e coordenadores estão precisando de mais incentivo, daquele ‘tapinha nas costas’, de apoio. E para dar esse incentivo, precisamos de atualização, que significa entrar no mundo dos jovens e entender do que eles gostam, o que estão sentindo e do que estão precisando”, completa.