Escuta ativa faz escola superar crise e se tornar referência - PORVIR
Crédito: Pedro Ventura/Agência Brasília

Diário de Inovações - Gestão

Escuta ativa faz escola superar crise e se tornar referência

A gestora Ana Élen, do CEF (Centro de Ensino Fundamental) 15 do Gama (DF), conta como abriu as portas da sala da direção para ouvir alunos, equipe e comunidade – e transformou em referência uma escola antes apelidada de "sovaco do diabo"

Parceria com Isaac

por Ana Élen Ferreira Moitinho ilustração relógio 31 de julho de 2023

“Sovaco do diabo”. Assim era conhecido o CEF (Centro de Ensino Fundamental) 15 do Gama quando assumi a direção, em 2007. Os grandes índices de violência e tráfico de drogas atravessavam os muros da escola localizada no Distrito Federal, em um bairro periférico de alta vulnerabilidade. A própria comunidade foi criando, em torno dela, as referências mais terríveis em relação à educação: era considerada a pior escola do Gama, com janelas quebradas, pichações nas paredes e frequentes casos de violência. O Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) era 2,7 de 10, um dos piores do estado. Poucos professores aceitavam trabalhar no CEF e isso favorecia ainda mais o estigma de preconceito com os estudantes. 

Motivada pela busca constante de promover um ambiente inclusivo e acolhedor, decidi adotar uma abordagem inovadora na gestão da escola. O primeiro passo foi a aquisição de um sofá a ser instalado na sala da direção, cujas portas ficaram abertas à escuta ativa dos alunos, professores, equipe e responsáveis. Percebi que, para realmente compreender as necessidades e expectativas de todos, era crucial estabelecer um espaço físico e emocionalmente confortável, no qual todos se sentissem à vontade para compartilhar suas opiniões, preocupações e ideias. Acreditava que o engajamento e a participação efetiva dessa comunidade nos processos decisórios poderiam ser a chave para a mudança.

A compra do móvel foi possível por meio de uma doação de um amigo da escola que compartilhava do nosso objetivo de transformação. Com o sofá na sala, passamos a planejar e definir o local ideal para sua instalação, levando em consideração a privacidade e a acessibilidade.

Ana Elen, diretora do CEF 15, em Brasília
Pedro Ventura/Agência Brasília Ana Élen, diretora do CEF 15 desde 2007.

A escuta ativa permitiu que os alunos se sentissem parte do processo de transformação. Eles perceberam que suas vozes eram valorizadas e que tinham o poder de influenciar as decisões que afetam suas trajetórias escolares, o que ampliou seu engajamento nos estudos e nas atividades.

Os professores também se beneficiaram da escuta ativa. Eles puderam compartilhar suas frustrações, desafios e ideias para melhorar o ensino e o ambiente de aprendizagem. Essa abertura ao diálogo também proporcionou um espaço para que se sentissem apoiados e encorajados a buscar soluções transformadoras para os problemas enfrentados.

Além disso, a escuta ativa permitiu que pais e responsáveis se envolvessem de maneira mais significativa na vida escolar de seus filhos. Eles foram convidados a participar de reuniões, encontros e grupos de discussão, nos quais puderam expressar suas preocupações e contribuir com ideias para a melhoria do ambiente e dos processos em si. Esse engajamento fortaleceu a parceria entre a escola e os pais, resultando em uma maior cooperação e suporte mútuo.

Com o passar do tempo, a escuta ativa se tornou uma prática enraizada na cultura da escola. As relações interpessoais melhoraram, a confiança foi restabelecida e o clima geral se tornou mais positivo e acolhedor. A escola deixou de ser conhecida como a pior do Distrito Federal e o apelido de “sovaco do diabo” se tornou apenas uma lembrança do passado.

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Caminhos para a transformação

Enfrentamos desafios ao longo do processo de adoção dessa abordagem. Inicialmente, houve ceticismo por parte da comunidade escolar, que não estava acostumada a ser ouvida e não compreendia o valor de um espaço acolhedor para a escuta ativa. Para superar a resistência, compartilhamos pesquisas e estudos que demonstravam os benefícios da escuta ativa na promoção de um ambiente escolar mais saudável e propício à aprendizagem.

A capacitação e o treinamento foram essenciais para garantir o sucesso da iniciativa. Realizamos oficinas e palestras, envolvendo professores e integrantes da equipe, para transmitir a importância da escuta ativa, as habilidades necessárias e as melhores práticas para sua implementação. Dessa forma, todos estavam preparados para utilizar o sofá como uma ferramenta efetiva de engajamento e participação. O móvel se tornou um espaço sagrado para as conversas: as vozes de alunos, pais, professores e funcionários eram acolhidas e consideradas em todas as tomadas de decisão.

Como resultado dessa abordagem, a escola passou por uma transformação notável. Os índices de drogadição, evasão e fracasso escolar diminuíram drasticamente. A comunidade escolar se sentiu integrante das mudanças e passou a se envolver em projetos e iniciativas para melhorar a qualidade de vida na escola, que acabou se tornando uma referência positiva na rede do Distrito Federal. Todos esses fatos mostram que a escuta ativa melhora o clima escolar, tornando-o acolhedor, colaborativo e respeitoso, onde todos se sentem valorizados e ouvidos. 

Dicas para as escolas implementarem a escuta ativa incluem:
– ter uma liderança comprometida, 
– comunicar e divulgar a importância da escuta ativa, 
– oferecer treinamentos e capacitações, 
– criar espaços acolhedores, 
– estabelecer práticas consistentes, avaliar sua eficácia, e reconhecer os envolvidos.

Seguindo esses passos, as escolas podem melhorar a comunicação, o engajamento dos alunos, as relações interpessoais, a solução de problemas, a participação dos pais e o clima escolar.

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Isaac

Ana Élen Ferreira Moitinho

Professora da SEEDF (Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal) há 27 anos e, desde 2007, é diretora do CEI 15 Gama. Graduada em Pedagogia e Psicologia da Educação pela UnB (Universidade de Brasília, onde também se tornou especialista em gestão escolar. Também é especialista em Educação Profissional e Tecnológica pelo Instituto Federal do Espírito Santo. Atualmente, é mestranda em Educação pela Florida Christian University, em Orlando (EUA). Ganhadora do Prêmio ao Professor pela SEEDF, recebeu o Prêmio de Gestão Escolar pelo Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação). Foi agraciada com duas medalhas: Mérito Buriti e Troféu Iaras. Embaixadora da Educação no Brazil Conference na Universidade de Harvard (EUA) em 2019, é coordenadora regional da Rede Conectando Saberes.

TAGS

gestão democrática, gestão escolar, socioemocionais

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