Faculdade forma trabalhador mais velho por projetos
College for America, nos EUA, oferece curso superior barato, online e sem aulas expositivas para adultos que trabalham
por Tatiana Klix 29 de maio de 2014
Imagine uma faculdade sem aulas, nem provas e na qual é possível se formar no tempo que os estudantes quiserem ou conseguirem? Ela existe nos Estados Unidos e se chama College for America, uma instituição fundada em outubro de 2013 e ligada à Universidade do Sul de Nova Hampshire (SNHU, na sigla em inglês). Para se formar nessa escola, os alunos precisam realizar projetos que comprovem que eles desenvolveram um conjunto de competências exigidas pelo programa. E isso ocorre somente através de interação online.
A College for America foi concebida por um laboratório de inovação criado pela universidade. A instituição, que já tem 80 anos, está preocupada com o futuro da educação superior nos Estados Unidos, cujo modelo atual enfrenta dificuldades de financiamento, com o volume de empréstimos estudantis superando o de créditos disponíveis. Por isso, um dos grandes diferenciais do programa é o preço. A formação custa US$ 2.500 por ano, o que representa pelo menos a metade do que é cobrado por cursos semelhantes em instituições voltadas a alunos de menor renda, os chamados community colleges.
O diploma ao qual os alunos têm acesso na College for America é um “Associate Degree”, um curso de formação de tecnólogos que também corresponde aos dois primeiros anos de um bacharelado nos EUA, uma formação sem equivalência no ensino superior brasileiro. Como os alunos não têm obrigação de assistir a aulas, algumas pessoas que participaram da fase piloto, que começou em janeiro de 2013, já estão com o canudo na mão. Outras, com menos disponibilidade ou mais dificuldades, poderão demorar mais do que tempo considerado usual.
“Os alunos devem trabalhar nos projetos no seu ritmo, até que satisfaçam todos os critérios estabelecidos por nós. Eles não recebem notas, mas também não fazem as tarefas apenas uma vez, podem tentar até que consigam comprovar que adquiriram as competências esperadas”, explicou ao Porvir a diretora acadêmica da faculdade, Cathrael Kazin.
Essa flexibilidade foi pensada para atender à demanda do público-alvo da instituição, que são trabalhadores que não tiveram oportunidade de fazer faculdade quando acabaram o ensino médio e também não teriam tempo ou dinheiro para frequentar uma universidade tradicional em meio às suas atribuladas rotinas. O modelo se destina a pessoas que já estão no mercado de trabalho, mas sentem necessidade de melhorar sua formação para conquistar melhores oportunidades, uma realidade também muito comum no Brasil, onde apenas 12% dos que têm 25 anos ou mais têm curso superior completo.
“Temos alguns alunos com idade para estar na faculdade, mas muitos têm entre 40 e 60 anos. Há muitas mulheres, principalmente, que gostariam de ter ido para a faculdade, mas acabaram casando, tendo filhos, e não conseguiram. Agora, 20 anos depois, elas estão voltando”, conta Kazin.
Os estudantes da College for America têm acesso a um sistema online onde encontram instruções, recursos, fontes e indicações de onde devem pesquisar o que não sabem ainda para realizar os projetos, assim como as competências que precisam cumprir e os critérios pelos quais serão avaliados. Cada um deles também conversa desde o início com um tutor, que ajuda a definir e planejar os projetos a serem feitos, tira dúvidas e tenta antecipar dificuldades que podem surgir. “A maioria dos nossos alunos são adultos que trabalham, têm família e o tutor tenta orientá-los sobre quando eles vão fazer o trabalho, como vão fazer e em que ritmo. Eles chegam a fazer questionamentos desse tipo: ‘Se algo acontecer com o seu filho, como você vai fazer o projeto?’”, diz diretora acadêmica.
Para receber o diploma, é preciso realizar de 20 a 55 projetos, dependendo da complexidade de cada uma dessas atividades. Alguns são menores, como escrever uma redação, e outros maiores, como uma tarefa de história da arte em que os alunos devem criar uma exposição virtual de um museu e ensinar como observar os trabalhos artísticos, como se fossem um guia. Ao todo, os estudantes devem comprovar 120 competências em áreas como comunicação, pensamento crítico e negócios.
Uma vez concluídos, os projetos são submetidos a uma comissão que os analisa a partir de rubricas em até 48 horas. Isso significa que os avaliadores observam uma série de critérios que, por sua vez, correspondem às competências exigidas. Se os alunos atingem o esperado, seguem em frente. Se não, recebem um relatório com comentários sobre cada critério.
Esse modelo de avaliação, totalmente focado em projetos, segundo a diretora, é inédito e revolucionário, porque deixa bem claro para os alunos o que é exigido deles e o que eles devem cumprir. “Existem outras instituições que usam projetos, mas nós fazemos apenas isso e avaliamos só a partir deles, o que nos faz ser muito diferente de outras universidades. Elas não sabem o que um aluno pode fazer. Elas sabem apenas que curso a pessoa fez, mas não sabem o que aprendeu”, afirma.
Crescimento rápido
A College for America ainda é insignificante no contexto das mais de 1.000 community colleges que atendem 13 milhões de alunos nos EUA, segundo dados da AACC (American Association of Community Colleges) de 2011. Mas seu ritmo de crescimento é acelerado. Em junho de 2012, quando o laboratório que inventou o modelo foi criado, quatro pessoas trabalhavam nele. Em seguida, recebeu apoio e financiamento da Fundação Bill & Melinda Gates, e no ano seguinte já fundou a nova faculdade. Hoje, com cerca de 50 funcionários, atende 500 alunos, número que cresce todos os meses, e já prevê oferecer o mesmo sistema para quem quiser concluir o bacharelado a partir de setembro.
Por enquanto, só pode participar do programa quem for indicado por uma empresa ou associação comunitária, que normalmente também fornece um auxílio para pagar pelo curso. Mas a ambição dos criadores é transformá-lo num modelo que possa ser replicado e diversifique o ensino superior nos EUA.