Onde estão os museus nos currículos das escolas? - PORVIR
Crédito: Rovena Rosa/Agência Brasil

Inovações em Educação

Onde estão os museus nos currículos das escolas?

Por que esses espaços precisam ser considerados para o planejamento de atividades escolares

por Ruam Oliveira ilustração relógio 6 de setembro de 2022

Prestes a reabrir as portas, o Museu Paulista, mais conhecido como Museu do Ipiranga, em São Paulo, tem previstas diversas atividades para celebrar o momento. O espaço, fechado desde 2013, traz de volta à visitação pública um dos mais belos projetos arquitetônicos da cidade. Entre o dia 7 e o dia 11 de setembro, haverá diversas apresentações de música, dança, teatro e circo.

Além da beleza exterior, a reabertura do museu, no dia 8 de setembro, apresenta aos visitantes mais de três mil peças espalhadas em 12 exposições. A reinauguração marca as comemorações do Bicentenário da Independência do Brasil.

E para quem é professor ou professora de história, esse tipo de visita é um prato cheio. Em se tratando de entender o país, um museu que traz detalhes e informações sobre como a nação foi construída possui grande valor.

Por que é importante que museus apareçam nos currículos escolares?

“Considero os museus espaços fundamentais, porque eles permitem refletir sobre quem somos, sobre o que produzimos como sociedade, sobre o nosso rico e muito diverso patrimônio material e imaterial. São lugares que preservam, comunicam, celebram indícios e manifestações da produção humana nos seus mais variados formatos – o que é uma enorme responsabilidade”, diz Clara Azevedo, mestre em Antropologia Social pela USP (Universidade de São Paulo) e sócia-diretora da Tomara! Educação e Cultura.

Ela destaca que a função social dos museus está em constante debate, e que acaba passando por muitas revisões. Clara também ressalta o papel importante que essas instituições desempenham no momento de uma aprendizagem que vai para além das portas da escola.

Contudo, faz uma ressalva: os museus são espaços de educação não formal, que não necessariamente possuem compromisso prévio com o ensino regular. “O que quero dizer com isso é que os museus não estão a serviço de currículos escolares. Por outro lado, podem contribuir muito com a formação escolar, pois seus acervos e conteúdos têm potencial para dialogar com os diferentes componentes curriculares”, pontua.

Brasil 200 anos

Pedro Castellan Medeiros, um dos coordenadores do Portal do Bicentenário e professor de história no Colégio Rio Branco, em São Paulo, afirma que pensar um planejamento pedagógico escolar que se articula com outras instituições de ensino e outros espaços educacionais é fundamental.

“A educação está na rua, na comunidade que a gente vive, nos equipamentos culturais…”, conta. Em outras palavras, o que o educador está dizendo é que tais espaços podem constar no planejamento pedagógico desde o início.

Nesse sentido, ele vê que os museus também criam oportunidades de diálogos entre o que acontece nas escolas e o que ocorre fora delas. Clara também destaca que uma ida ao museu pode funcionar como forma de aprofundamento. Em outras palavras, esses equipamentos culturais servem para trazer diferentes perspectivas.

Construções e disputas

Conforme explicou Clara, os museus vivem sob forte observância em relação às suas funções justamente porque possuem essa característica de apresentar a história. Ela ressalta, por exemplo, ser fundamental que os professores saibam que os museus não são neutros e o que está exposto nessas instituições passou por uma série de escolhas.

“Tudo isso pode ser caldo para discussão – desde o museu que consegue problematizar ou colocar em perspectiva as suas próprias narrativas até aquele museu que apresenta uma narrativa com menos contradições, todos permitem experiências que podem ser trabalhadas de alguma maneira pela escola”, afirma.

Com a chegada do Bicentenário da Independência, por exemplo, há a possibilidade de construir diálogos sobre a história da independência do país. No caso do Museu do Ipiranga, há uma exposição prevista para se dedicar exclusivamente à questão. Trata-se da “Memórias da Independência“, que ficará em cartaz por quatro meses.

“Quando a gente olha para o passado, a gente olha essas disputas de narrativa acerca dos personagens e dos símbolos que constituíram o Brasil. Quais são esses personagens? Que símbolos são escolhidos e que regiões do Brasil são evidenciadas pra gente pensar a independência brasileira e a construção da nação?”, questiona Pedro.

Para ele, o bicentenário torna-se uma oportunidade para rever essas construções pelos olhos da educação. Como um dos coordenadores do Portal do Bicentenário, ele também nota certa movimentação na construção de materiais didáticos que explorem a história em uma perspectiva mais crítica.

Para além da história

Ao passo que essa área chama mais atenção de quem está em áreas como história e geografia, o caráter de ampliar discussões e ser espaço de aprendizagem além dos muros escolares pode ser aproveitado por outras áreas do conhecimento.

“A meu ver, todas as áreas podem se envolver e se beneficiar de alguma maneira da visita a um museu – e a escola pode trabalhar uma mesma visita em um projeto multidisciplinar, de modo a propor as conexões entre os componentes curriculares e aproveitar ao máximo a experiência. Acho que a visita a um museu possibilita vivenciar, na prática, uma aprendizagem mais integral e menos compartimentada”, diz Clara.

A pedagoga e historiadora Gláucia Lixinski Kulzer, do Museu de História da Medicina do Rio Grande do Sul, aponta que os museus são espaços de aprendizagem interdisciplinar. Ainda mais quando observados para além da ótica de guardar objetos.

“O papel educativo dessas instituições museológicas vai além da conservação e preservação dos objetos”, diz Gláucia. A historiadora ressalta que esses locais possibilitam a pesquisa e a ampliação do conceito de patrimônio, memória e história. Além disso, ela vê como um espaço democratizante do conhecimento por meio de experiências lúdicas.

“Fornecer diferentes formas de aprender e de buscar conhecimento seja na área de matemática, ciências, história em espaços para além do muro da escola é proporcionar aos alunos o exercício do olhar e a experiência de construir o aprendizado de forma leve e divertida“, aponta Gláucia.

Os duzentos anos de Independência também podem servir para explorar outras expressões artísticas e manifestações culturais. Tal como é possível observar aspectos matemáticos, químicos ou científicos vividos ao longos desse período, as possibilidades tecnológicas e de inovação também estão disponíveis para exploração.

O lugar da arte-educação

Em suma, visitas aos museus são também oportunidades de ter contato com a arte. Todavia, Clara Azevedo ressalta que ainda sente que essa é uma área tratada como “menor” dentro dos currículos escolares.

Em contrapartida, alguns documentos já preveem um lugar de maior diálogo a respeito da arte e da criatividade. “A BNCC (Base Nacional Comum Curricular) traz subsídios importantes para esse fortalecimento quando considera que o componente curricular de artes, no ensino fundamental, por exemplo, deve buscar a articulação dos saberes e fenômenos artísticos”, comenta Clara.

Ou seja, a implementação da BNCC também pode contribuir para o avanço da arte-educação nas escolas. Igualmente, a inserção de mais arte nos currículos pode ser facilitada com a adição de mais visitas a museus.


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ensino fundamental, ensino médio

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