Projeto forma professores para trabalhar a criatividade em sala de aula
Projeto vista estimular o acesso à arte e cultura e trabalhar temas dos Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável
por Ruam Oliveira 14 de setembro de 2021
A professora Adriana Girão, que dá aulas na rede municipal de Jijoca de Jericoacoara (CE), resolveu desafiar seus alunos a pensarem fora da caixa. À época, desenvolvia um projeto sobre invenções criativas e contava a história de inventores famosos, como Leonardo Da Vinci.
Ao propor uma atividade que mexesse com a criatividade da turma, ela sugeriu que cada estudante pensasse em um projeto, ferramenta ou dispositivo que gostariam muito de produzir.
Entre as muitas sugestões que recebeu, uma delas foi além: um estudante do ensino fundamental 1 lhe disse que gostaria de criar uma máquina de fazer pintinhos. Ao ser perguntada sobre o motivo, a criança respondeu que os pintinhos eram a coisa que mais gostava e que não queria que eles acabassem.
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A resposta aparentemente inusitada do aluno recebeu aprovação e incentivo da educadora. Não para que ele próprio desenvolvesse uma máquina para produzir ovos, galinhas e pintinhos, mas para que ele não colocasse barreiras para a imaginação. A intenção central de Adriana com atividades como essa é promover autonomia e pensamento criativo nos alunos e isso por meio de ideias autorais.
Trabalhar a autonomia dos estudantes e promover o desenvolvimento de habilidades de forma criativo é algo previsto nas 10 Competências Gerais da BNCC (Base Nacional Comum Curricular). Ao sugerir a criação de uma máquina de fazer pintinhos, o estudante trouxe como repertório algo do seu cotidiano, fortalecendo a ideia de que o aprendizado pode reunir referências vindas de diversos lugares, não somente dos livros didáticos.
Quando se pensa em criatividade em sala de aula, é válido destacar que essa não é uma habilidade inata como possivelmente muitos podem entender. Pelo contrário, há de se ter um exercício intencional para que ela aflore ou um incentivo para que o estudante tenha o desejo de criar e encontrar formas diferentes de pensar.
Juliana Ragusa, coordenadora de Tecnologia Educacional e Inovação na Escola Internacional de Alphaville (SP), aponta que é preciso desmistificar inclusive o termo criatividade e pensar em oportunidades de fazê-la despertar nos alunos.
“A gente fala na escola em desenvolver algumas novas habilidades, algumas experiências que sejam provocadoras do desejo de criar, de fazer diferente. Talvez aí sim a gente chegue àquilo que é um pensamento criativo, ou seja, que é fora do convencional ou do que é pré determinado, mas que tem o desejo de resolver um problema ou de fazer de uma forma diferente”, afirma Ragusa.
Entre as formas de explorar o lado criativo dos alunos, pode existir uma gama grande de temáticas que podem ser trabalhadas em função de melhorar o pensamento criativo. Projetos que sejam transversais, que mesclem temáticas vindas de áreas diferentes tendem a ser bons começos nessa jornada.
O projeto Escolas Criativas, que atualmente conduz atividades com as redes de ensino de Niterói (RJ) e Jijoca de Jericoacoara (CE), trabalha em diferentes eixos criativos. Entre as principais temáticas abordadas estão inovação em educação, sustentabilidade e acesso cultural.
Mardônio Barros, diretor do projeto, conta que tem acompanhado iniciativas no Brasil e no exterior que apresentam resultados positivos quando se trabalha questões socioemocionais e habilidades para além da escola, como relações interpessoais, de trabalho e para a vida em si.
Para ele, expor as crianças a um ambiente de criatividade, que permita acesso à cultura e às diferentes formas de se relacionar com o mundo é fundamental para formar cidadãos que pensam de maneira inovadora.
Quando se pensa na tecnologia, por exemplo, até mesmo a ideia de nativos digitais precisa ser repensada, evitando o pressuposto de que todas as crianças e adolescentes manejam e entendem perfeitamente o uso intencional dessas ferramentas. O educador afirma que é preciso olhar para a tecnologia como algo além de um artefato ou de módulos, e investir em uma alfabetização tecnológica.
A criatividade encontrada na proposta do aluno da professora Adriana dá conta de algo que extrapola o que é considerado “normal”, sem que, no entanto, deixe de conversar com o cotidiano e a realidade que ele encontra na sua própria vida.
Esse diálogo com a realidade dos alunos também têm colocado a educadora para exercitar a própria criatividade. Comandando um canal no YouTube, ela apresenta conceitos de inglês, vocabulário e outras atividades no ensino do idioma usando aquilo que os estudantes conhecem. Ela conta que é trabalhoso, principalmente por às vezes ser colocada para fora do seu lugar de conforto, mas compreende que é necessário se mover para propor coisas novas e diferentes.
A instituição de ensino onde Adriana trabalha também desenvolve atividades ligadas ao projeto Escolas Criativas. Entre as muitas frentes de trabalho, a iniciativa implementa equipamentos nas escolas para o desenvolvimento de atividades com tecnologia, pensamento computacional e os já citados programas voltados para o acesso à cultura e que trabalham a sustentabilidade.
Juliana Ragusa destaca que quando o professor sai do ensino considerado tradicional e propõe atividades mais significativas e de pensamento crítico, ele está permitindo que o estudante se redescubra. O autoconhecimento, que também é uma das competências previstas na BNCC, é uma chance de que o estudante descubra talentos, preferências e construa pensamentos antes não imaginados.
“Eu acho que o grande desafio da educação é a gente desenvolver essas competências maiores nos alunos, entre elas um pensamento mais executivo e mais aberto, mais criativo. Acho que esse é o grande dilema mesmo. [Mas] a vantagem é a compreensão de si mesmo”, apontou Juliana.
Ao propor a criação de uma máquina de fazer pintinhos, o estudante do ensino fundamental 1 do interior do Ceará já conhecia um pouco a respeito de si mesmo, faltava apenas compartilhar com mais pessoas esse desejo e a grande potência imaginativa.
O projeto promove cursos de audiovisual, arte e educação, Cultura e Desenvolvimento – Relatos de Experiências e Formação, fotografia, tecnologias digitais e mais.
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No site da instituição também é possível conferir planos de aula, que são chamados de “Experiências Criativas”, que trabalham arte, música, ciências narrativas e brincadeiras.