“Quem mais influencia um professor são os outros professores”
Karen Cator, presidente-executiva da ONG Digital Promise, dos EUA, discute inovação no sistema público de ensino em visita ao Brasil
por Vinícius de Oliveira 21 de dezembro de 2016
Usar tecnologia em sala de aula não é mais uma opção. É imperativo. Mas o caminho até o nível de engajamento que cria nos estudantes uma dedicação de corpo e alma por saber mais requer estratégias baseadas em pesquisa, relação estreita entre professores e compartilhamento de histórias de sucesso. Para contar como esses pilares sustentam suas atividades da ONG (Organização Não-Governamental) Digital Promise, a executiva Karen Cator participou na última quarta-feira (14) de um evento sobre inovação no sistema público de ensino promovido pelo CIEB (Centro de Inovação para a Educação Brasileira), em São Paulo (SP).
Na oportunidade, Karen, que também é ex-diretora do Departamento de Tecnologia Educacional dos Estados Unidos e ex-executiva da Apple na área de educação, analisou como as novas tecnologias podem ajudar a diminuir discrepâncias na aprendizagem, como é possível promover e avaliar o desenvolvimento de competências para o século 21 e como devem ser oferecidas oportunidades de formação continuadas aos professores.
Tanto em sua palestra quanto em conversa posterior com o Porvir, Karen fez questão de ressaltar que não existem mais razões para que o uso de tecnologia não seja priorizado dentro de sala de aula, mesmo em situações que alunos tenham dificuldades com leitura e matemática. “Quando provocados, professores dizem que alunos precisam ser educados para o mundo em que eles vivem. Ninguém pode dizer nos dias de hoje que as tecnologias e a internet não são necessárias para os estudantes aprenderem. Isso não é desculpa”, afirmou.
desculpa
Quando fala de inovação, a presidente-executiva da Digital Promise sempre coloca em paralelo a necessidade de compartilhamento de experiências bem-sucedidas. “Mostre vídeos, tente fazer com que as pessoas visitem essas classes dos mais diversos jeitos, por realidade virtual, vídeos em 360º, o que seja. Assim conseguiremos ajudar muito mais pessoas a tentar novas coisas para que tenhamos mais estudantes com um alto nível de aprendizado”.
Essa estratégia, segundo Karen, é eficiente porque nenhum profissional gosta de receber ordens de cima para baixo ou de especialistas distantes da realidade escolar. “Quem mais influencia um professor são os outros professores. Eles podem ver o que os colegas estão fazendo, compartilhar ideias, planejar juntos, testar e avaliar”. No entanto, admite, a formação inicial ainda não consegue dar conta de todas as demandas da escola do século 21 e é preciso pensar em um processo contínuo. “O que eles aprendem em faculdades de educação não é tão relevante. Mas no primeiro dia em sala de aula, terão que saber como atender o interesse individual de cada aluno, como trabalhar em laboratórios maker e tantas outras coisas que ainda precisam desenvolver ao longo de carreira”.
Nesse sentido, a Digital Promise tem trabalhando no desenvolvimento de um sistema de microcredenciais que já conta com 250 badges oferecidos por diferentes instituições de ensino para atestar que o docente concluiu um curso para o desenvolvimento de determinada habilidade. Enquanto professores podem criar sua própria trilha alinhada tanto à necessidade dos alunos quanto aos objetivos da escola, gestores públicos conseguem ter um acompanhamento contínuo e uma identificação mais eficiente das boas práticas dentro da rede.
E como o trabalho em sala de aula para o desenvolvimento dessas competências não se encaixa em provas tradicionais, Karen também sugere que docentes passem a estimular seus alunos a criar portfólios. “Eles podem mostrar seus melhores exemplos de colaboração, de pensamento crítico, onde resolveram um problema e como criaram uma solução”. Nesses registros, explica, também haveria espaço para o progresso em matemática. “Não são apenas as notas. É o trabalho e sua articulação com rubricas das habilidades do século 21”.
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Empreendedores
Na conversa com o Porvir, a executiva também detalhou como é importante que empreendedores se apoiem em pesquisas para que governos e diretores escolares não imaginem que o produto digital surgiu “do nada”. “Pode ser uma pesquisa baseada em motivação, nas relações interpessoais ou de como se aprende matemática”, descreve.
Um segundo passo envolve a identificação dos dados que terão que ser analisados diariamente para a melhoria do produto. Além disso, é importante descobrir se alunos conseguem transpor o conhecimento para outras situações, fora da tela.
Todo esse trabalho também precisa levar em conta o contexto dos alunos, ou seja, se estão em um centro urbano ou em área rural, em escola pública ou privada, etc. “Ao invés de dizer se o produto funcionou ou não, é melhor avaliar se ele é eficiente para um determinado grupo de estudantes, mesmo que não tenha ajudado os demais. E aqui, devemos mostrar as evidências, não só a média de desempenho”.