Recuperar ou acelerar a aprendizagem? O caminho está na aprendizagem ativa
Propostas que façam sentido aos estudantes para que participem ativamente de seu próprio processo de aprendizagem podem ajudar a evitar desmotivação e desengajamento, além de promover recuperação e mais fixação do conteúdo
por Maria Victória Oliveira 12 de novembro de 2021
Dizer que 2020 e parte de 2021 foram anos letivos “perdidos” e vazios em termos de aprendizagem significa desconsiderar todos os feitos e esforços de equipes pedagógicas, professores e das próprias crianças e jovens para continuar os estudos durante a pandemia. Entretanto, é impossível não considerar que o período trouxe incertezas e múltiplos desafios que devem ser pensados nesse momento de retorno total às aulas presenciais.
Nesse sentido, a aprendizagem ativa pode ser uma abordagem aliada não só para promover a recuperação de conteúdos que eventualmente foram menos estudados ou compreendidos, mas também para acelerar a aprendizagem dos estudantes.
Motivação
Uma possibilidade real que se coloca diante de famílias e escolas nesse momento é a evasão escolar. Se alguns jovens realmente não voltarão a frequentar a escola, outros verão pouco sentido em fazê-lo, o que pode acarretar baixo engajamento e desmotivação.
Nas aulas remotas, os recursos utilizados para apoiar o processo de ensino aprendizagem foram muito ampliados. Nesse contexto, Juliana Ferrari, psicóloga, mestre em psicologia escolar e do desenvolvimento humano e gerente pedagógica da Camino Education, enxerga a aprendizagem ativa como uma metodologia que pode ajudar a “dar a liga”.
“Tivemos conversas com algumas crianças que falaram que não precisam ir para a escola porque podem aprender tudo pelo YouTube. Como ampliamos muito os recursos, acredito que, nesse retorno às aulas presenciais, a aprendizagem ativa talvez seja uma das únicas formas para reforçar que o estudante precisa sim ir para a escola porque a vida real é mais do que o conteúdo. Ele realmente pode aprender por vídeos e textos, mas também deve aprender a resolver problemas, tarefa complexa que vai exigir que aprenda bastante coisa.”
Compreensão do propósito
Diretamente conectada à motivação, está a compreensão do propósito sobre o que estão aprendendo. Assim, para Juliana a aprendizagem ativa torna-se uma estratégia aliada pois sua primeira preocupação é dizer ao aluno o objetivo do que ele está fazendo.
“Quando apresentamos problemas reais para o estudante, estamos trazendo uma justificativa do uso daquela aprendizagem em sua vida. Eu considero que quando você diz que a aprendizagem dele tem valor, ou seja, que aquilo ele sabe vai fazer o mundo um lugar melhor porque ele vai resolver problemas reais e vai existir de um jeito que impacta mais, isso traz muito mais significado para a aprendizagem.”
Segundo a gerente, compartilhar os objetivos não só de aprendizagem – aquilo que querem que o estudante aprenda –, mas o propósito de cada atividade é um movimento de dar razão às propostas pedagógicas.
Assim, a aprendizagem ativa conta com alguns mecanismos. Um deles é o planejamento reverso, que significa pensar as práticas e atividades a partir dos objetivos, o que vai ajudar a realização de uma curadoria muito mais cuidadosa dos recursos que serão utilizados, evitando que crianças e jovens fiquem sobrecarregados de conteúdos e recursos.
Retomada e fixação do conteúdo
Além de promover mais sentido ao aprendizado, a metodologia ativa também representa uma possibilidade de processos de retomada dos conteúdos que já foram vistos e maior fixação dos novos conhecimentos adquiridos. As duas opções são válidas e serão de extrema importância com o início de um novo ano letivo, dessa vez totalmente presencial.
É nesse ponto que a ciência da aprendizagem mostra duas estratégias: a retomada e a elaboração e codificação. Em linhas gerais, a retomada diz respeito a pedir que o estudante use conhecimentos adquiridos em diferentes contextos e momentos. Uma atividade no final do ano, por exemplo, pode demandar aprendizados do começo do ano. “Quando você pede para o estudante usar o conteúdo de trigonometria para prever e prevenir desabamento de prédios, você está mostrando que esse conhecimento tem um uso em outro cenário e essa transposição ajuda na fixação”, explica Juliana.
A codificação, por sua vez, é a relação estabelecida com o que está sendo aprendido, ou seja, como o aluno pode enxergar que aquilo que aprende na escola pode inseri-lo na resolução de problemas da vida real, o que também ajuda a fixar o que foi visto.
Para jovens que iniciaram o ensino médio em 2020, por exemplo, foram dois anos bastante complexos em termos de estudo, considerando a quantidade de conteúdo que precisou ser aprendido remotamente – sem contar as questões de desigualdade de acesso à internet e equipamentos no Brasil.
Especialmente nesse contexto do ensino médio, Juliana pontua a importância da elaboração de projetos que promovam essa retomada e conexão de conteúdos vistos em diferentes anos e em diferentes formatos, seja nas aulas presenciais ou online, além de propostas que usem os interesses dos alunos, engajem e estimulem a curiosidade.
Mais engajamento e participação
Oferecer propostas que coloquem o aluno no centro e que façam sentido a estudantes cada vez mais antenados foi o que motivou a Leaders School, uma escola particular de Campinas (SP), a adotar a CLOE, plataforma que dispõe o conteúdo em expedições temáticas.
“Nós sempre trabalhamos por projetos aqui, e os livros didáticos não estavam mais atendendo a visão que temos do aluno enquanto protagonista, e não o conteúdo. Nós percebemos o quanto os estudantes interagem de maneira feliz, ativa, alegre e engajada quando estão participando ativamente da aprendizagem”, comenta Vânia Mesquita, pedagoga, mestre em educação escolar e diretora da Leaders School.
A plataforma começou a ser usada com a educação infantil e ensino fundamental em 2021, e Vânia comenta sobre a importância de poder moldar os conteúdos e atividades de acordo com a realidade das famílias e o planejamento da escola. “Dentro de uma expedição sobre um tema específico, posso incluir mais aulas ou fazer algumas delas da nossa maneira, colocando mais elementos ou tirando aqueles que os alunos já sabem.”
Toda essa articulação com as crianças e famílias para que pudessem acessar os conteúdos de casa deu resultados. Os professores que utilizam a plataforma notam melhora significativa no desempenho do estudante em comparação com aulas mais tradicionais, com mais engajamento dos estudantes, o que pode ter um efeito positivo na recuperação.
“A recuperação da aprendizagem vai acontecer de uma maneira espontânea a partir do trabalho com metodologias ativas, envolvendo projetos e uma aprendizagem baseada em desafios e em solução de problemas. O aluno não se sente diferente dos outros porque a sala de aula passa a ser uma equipe trabalhando a sua motivação, com cada um trabalhando suas habilidades e todos se sentindo participantes do aprendizado”, completa.
Na volta às aulas presenciais, Vânia pontua a importância de os educadores observarem de perto o desenvolvimento diário dos estudantes, considerando que cada criança tem suas habilidades particulares e tempo de aprendizagem.
– Entenda as 10 competências gerais que orientam a Base Nacional Comum