Estereótipos sobre meninas nas ciências começam muito cedo na escola
Pesquisadores descobrem que aos 6 anos, muitas crianças já acreditam que meninos são mais interessados do que meninas em STEM, abordagem que integra ciências, tecnologia, engenharia e matemática
por Jackie Mader, The Hechinger Report 16 de junho de 2022
Logo no início do ensino fundamental, muitas crianças já acreditam que os meninos estão mais interessados do que as meninas em ciência da computação e engenharia. Esse estereótipo pode afetar a disposição das meninas em participar de aulas e atividades de STEM (sigla em inglês para ciências, tecnologia, engenharia e matemática), e até mesmo afetar as escolhas de carreira no futuro.
Essa é a principal descoberta de um estudo divulgado recentemente por pesquisadores da Universidade de Houston e da Universidade de Washington, ambas nos Estados Unidos, que entrevistaram 2.500 alunos do 1º ao 12º ano para entender quais estereótipos as crianças têm em relação ao interesse de meninos e meninas em STEM, e como tais estereótipos afetam a participação nessas áreas.
Na primeira série, muitas crianças já acreditam que os meninos estão mais interessados do que as meninas em engenharia, segundo o estudo. Na terceira série, as crianças acreditam que o interesse baseado em gênero também se aplica à ciência da computação. Curiosamente, a pesquisa revelou que os estereótipos sobre quem está interessado em STEM são mais fortes do que os estereótipos sobre o potencial de cada um. A crença de que as meninas acham matemática e ciências menos atraentes mostrou ter um impacto maior no interesse das meninas em STEM do que a crença de que elas podem não ser boas nisso.
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“Essas crenças, à medida que o tempo passa, ficam ligadas à sua própria motivação e interesse”, disse Allison Master, professora assistente da Faculdade de Educação da Universidade de Houston e principal autora do estudo. “Estereótipos são profecias autorrealizáveis.” No relatório, Allison e seus coautores concluíram que tais estereótipos “podem enviar às meninas um sinal de que elas não pertencem e dissuadi-las de desenvolver interesse nesses campos”.
Essas descobertas sugerem que o combate aos estereótipos em ciências deve começar cedo. Alisson afirma que é importante observar as mensagens ligadas a gênero que as crianças recebem por meio dos brinquedos ou a maneira como os produtos relacionados a STEM são comercializados para um gênero específico. Famílias e professores devem estar cientes de qualquer preconceito de gênero nas oportunidades que oferecem às crianças para se envolverem em STEM e nas mensagens que podem enviar sobre quem é interessado (ou ser bom) em atividades de ciências. Oferecer às crianças a chance de interagir de maneira positiva com STEM também pode ser útil, proporcionando boas experiências para recorrer quando encontrarem estereótipos, acrescenta Allison.
Nem todas as crianças têm acesso a tais experiências, no entanto. A pesquisa mostra que os professores de educação infantil são menos propensos a oferecer aulas e atividades de ciências nas salas de aula da primeira infância quando não se sentem confiantes sobre seu próprio conhecimento na área. Alguns programas para crianças pequenas direcionam suas atenções justamente para essa fase, tornando a ciência o centro de seus currículos e trabalhando com professores para expandir seus conhecimentos sobre as disciplinas.
Na cidade de Nova York, a Brooklyn Preschool of Science foi lançada em 2012 para expor diariamente as crianças aos conceitos de ciência. Carmelo Piazza, diretor-executivo e educacional da escola, disse ter descoberto que a ciência é uma maneira natural de despertar o interesse das crianças. Os alunos da pré-escola passam tempo observando insetos, fazendo modelos de larvas de farinha durante a aula de arte e brincando com robótica, com tempo suficiente para atividades independentes e aulas que se concentram em uma questão central que as crianças trabalham para responder.
Embora Carmelo reconheça que os esforços de algumas escolas podem ser frustrados por orçamentos limitados, ele disse que há maneiras de incluir a ciência nos currículos criando mais oportunidades de aprendizado práticas e baseadas em pesquisas, como a criação de experimentos científicos com utensílios domésticos. Permitir que as crianças examinem insetos ou construam carros com embalagem de leite, por exemplo, são formas de baixo custo de trazer a ciência para a sala de aula, afirma.
“As crianças são cientistas natas”, ressalta. “Você tem que fazer isso quando eles são jovens. E quando assimilam o conteúdo, vão começar a entender e não ter medo.”
Aqui estão algumas conclusões adicionais, que podem ser lidas na íntegra no Proceedings of the National Academy of Sciences, uma publicação científica:
- As meninas mostraram menor interesse e senso de pertencimento em ciência da computação e engenharia se tivessem estereótipos mais fortes sobre meninos gostando desses campos.
- Mais de um terço das crianças acredita que as meninas estão menos interessadas do que os meninos em ciência da computação. Dezoito por cento das crianças acreditavam que as meninas estavam mais interessadas.
- Aos 8 anos, as meninas já foram impactadas pelos estereótipos: se lhes dissessem que meninas geralmente não estavam interessadas em uma atividade, elas mostravam menos interesse nessa atividade. Por outro lado, elas eram mais propensas a tentar uma atividade se lhes dissessem que meninos e meninas estavam interessados.
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Este conteúdo foi produzido por The Hechinger Report, um veículo independente e sem fins lucrativos focado em desigualdade e inovação em educação. Reproduzido no Porvir mediante autorização.
This story was produced by The Hechinger Report, a nonprofit, independent news organization focused on inequality and innovation in education.