Jornalismo como ferramenta de apoio à educação antirracista - PORVIR

Inovações em Educação

Jornalismo como ferramenta de apoio à educação antirracista

Textos e outras produções jornalísticas podem servir como contexto e apoio dentro da sala de aula na busca por uma educação antirracista

Parceria com Revista Qualé

por Ruam Oliveira ilustração relógio 9 de novembro de 2023

Embora estejam frequentemente conectadas à internet, crianças e adolescentes se beneficiam enormemente do contato com notícias de fontes confiáveis, crucial para a conscientização sobre diversos temas, inclusive a educação antirracista. Incidentes racistas, cada vez mais presentes na mídia, refletem as realidades vividas por crianças e jovens negros. As escolas, ao utilizarem reportagens para introduzir o tema, promovem debates mais aprofundados e construtivos.

Recentemente, tomaram conta dos noticiários os sucessivos episódios de racismo sofridos pelo jogador brasileiro Vinícius Jr., do time espanhol Real Madrid. Somente após dez denúncias é que um clube foi punido devido às agressões. No final de outubro, Vini Jr. conquistou o Prêmio Sócrates, honraria concedida pela revista francesa France Football para ações de solidariedade realizadas por jogadores.

“Ao ver o caso de racismo sofrido por Vini Jr., trouxe o caso para discussão em sala de aula e os alunos ficaram claramente incomodados”, relata Aldeci Ribeiro, professora do ensino fundamental 1 na EMEF (Escola Municipal de Ensino Fundamental) Antonio Carlos Rocha, em São Paulo (SP). 

A proposta inicial era discutir imigração e, diante dos ataques sofridos por Vini Jr., a educadora optou por incluir a temática do racismo, considerando que ele é um jogador atuante em um país estrangeiro. “Pensando em migração, como se sentia o Vini Jr. com esses ataques racistas estando lá na Espanha?”, perguntou à turma. 

A DRE (Diretoria Regional de Educação) da Penha, onde se localiza a escola Antonio Carlos Rocha, concentra um dos maiores índices de estudantes migrantes da cidade de São Paulo. Muitos também sofrem com preconceito, racismo e xenofobia. Este último tema foi explorado nas aulas de Aldeci, a partir da reflexão suscitada pelas violências sofridas pelo jogador.

“Formulamos uma campanha contra o racismo e a xenofobia, a princípio dentro da nossa sala, onde temos alunos migrantes. Também usamos o tema no dia a dia, como ponto central de atividades pedagógicas: formação de frases, distância entre países, gráficos com dados sobre o tema, entre outras coisas”, conta a professora. 

A consulta a diversas reportagens feita pela professora Aldeci e sua turma foi apenas o começo do projeto de educação antirracista desenvolvido na escola. Outros estudantes passaram a debater o tema, incentivadas pelo vídeo produzido e pelos cartazes afixados na escola.

Jornalismo como material formativo 

Cada vez com mais frequência docentes buscam reportagens e textos jornalísticos para contextualizar diferentes temas. E a experiência da EMEF Antonio Carlos Rocha virou notícia na Revista Qualé, publicação feita especialmente para crianças e jovens. “O jornalismo é fundamental dentro das escolas porque colabora com a educação midiática, que se faz urgente em nossa sociedade devido à quantidade de informações que esses jovens recebem”, aponta Claudia Gabionetta, coordenadora pedagógica da Revista Qualé. 

Por meio desse recurso, professores podem fazer mais facilmente a ligação entre fatos do mundo real e os conteúdos já trabalhados nos currículos para desenvolver uma aula mais engajadora no presente, mostrando que eles ainda acontecem, como é o caso do racismo. “Quando a Revista Qualé noticiou o caso do Vini Jr., que é uma personalidade importante para crianças e adolescentes, foi uma forma de aproximar os alunos do tema. Porque eles sabem, refletem e se informam sobre o assunto entendendo que isso não pode acontecer”, afirma. 

Claudia sugere que, por meio do apoio das ferramentas jornalísticas, os professores podem incentivar a cidadania dos estudantes, impulsionando-os a serem mais ativos na defesa dos direitos humanos e no combate a violências. 

“O jornalismo é uma ferramenta muito potente para incentivar o pensamento crítico, o poder de argumentação e um olhar mais apurado com o mundo ao nosso redor. Além de ajudar em habilidades como interpretação de texto, por exemplo, ele também pode ser usado de forma multidisciplinar”, afirma Maria Clara Cabral, diretora da Revista Qualé. 

Temas que são considerados mais complexos, como guerras, bullying ou até mesmo saúde mental, tornam o jornalismo um importante aliado para a educação.

Além de possibilitar uma aproximação com os estudantes, como citado por Cláudia, por meio da apresentação de figuras de destaque – como o Vini Jr. – a turma pode atuar de forma mais ativa, sendo protagonistas de ações variadas no ambiente escolar. 

“Mostrar os assuntos de formas propositivas, apresentando não apenas o problema, mas as soluções também ajuda muito. É o que chamamos na Qualé de jornalismo de solução. Queremos ajudar a formar jovens conscientes dos problemas que os cercam e que saibam que podem fazer parte da mudança”, afirma Maria. 

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Educação antirracista pautada na informação

Aos 11 anos, Ana Clara Larchete, conhecida na internet como Clarinha Larchete, ganhou notoriedade nas redes sociais ao recriar fotos de artistas negras como Michelle Obama, Isabel Fillardis, Tereza de Benguela, entre outras. A ideia foi de sua mãe, Daiane Braz, a fim de ensiná-la sobre amor próprio após a pequena sofrer episódios de racismo. 

Durante conversas com familiares ela foi descobrindo temas importantes na luta antirracista e também para se defender de ataques. Um dos assuntos que chamou a atenção da menina foi o colorismo, tema sugerido por ela para a equipe da Revista Qualé. 

“A Clara é uma menina negra de pele clara, e todas as vezes que ela se dizia negra as pessoas questionavam, tentavam tirar dela aquilo que ela é. Então começamos a ensinar para ela que existem pessoas negras com várias tonalidades, tanto os de pele clara quanto os retintos”, explica Daiane. 

A sugestão de pauta de Clarinha foi atendida pela revista. Na reunião, quando ainda fazia parte da turma editorial da revista, a menina explicou aos demais a importância de tratar do tema, inclusive para o fortalecimento da própria identidade. 

“Reportagens assim trazem uma consciência sobre quem eu sou, e quando crianças da idade dela olham para reportagens assim elas têm orgulho, fazem com que elas consigam absorver informação”, conta Daiane. 

A escola também é espaço para o fortalecimento de identidades. Como aconteceu com Clara, por meio de reportagens os docentes conseguem desenvolver diálogos significativos com as crianças, promovendo a ampliação de repertório e, como destacado por Maria Clara, desenvolvendo o poder de argumentação. 

Como aproximar o jornalismo das atividades em sala de aula?

Confira as recomendações de Claudia Gabionetta, coordenadora pedagógica da Revista Qualé

  • As atividades de leitura apoiadas em notícias oferecem aos professores uma oportunidade para elucidar conceitos de análise e compreensão. Tais práticas capacitam os estudantes a desenvolver habilidades de expressão oral e a adotarem uma postura crítica.
  • É possível explorar conteúdos jornalísticos do audiovisual, como documentários, trechos de entrevistas, reportagens em vídeo e podcasts. Neste caso, vale utilizar tanto os que são produzidos por veículos de imprensa quanto incentivar que os estudantes produzam seus próprios materiais.
  • A leitura estimula o interesse e amplia os conteúdos apresentados, promovendo assim a postura investigativa dos estudantes por meio do desenvolvimento de projetos de pesquisa sobre assuntos variados.
  • A exploração das características dos diferentes gêneros textuais jornalísticos é um recurso que apoia a criação de um jornal local, escrito pelos próprios estudantes.
  • Textos jornalísticos são importantes base para explicar quais são os elementos que comprovam sua veracidade, enfatizando a importância da verificação de fatos.
  • A realização de debates baseados em temas atuais e relevantes de nossa sociedade, como racismo, homofobia, meio ambiente, entre outros, é uma prática importante. 

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TAGS

educação antirracista, educação infantil, educação midiática, ensino fundamental

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