Prêmio reconhece estudantes que usam a ciência para mudar sua realidade
No desafio 'Respostas para o Amanhã', professores e alunos do ensino médio se unem em projetos que transformam suas comunidades de forma sustentável
por Marina Lopes 6 de dezembro de 2017
“No dia que eu sai da minha aldeia, todo mundo veio tirar foto e quis desejar boa sorte. Enquanto estou aqui, os alunos estão torcendo com o coração na mão”, disse o professor Alexandre Surui, enquanto aguardava com expectativa o anúncio dos projetos selecionados pela quarta edição do Prêmio Respostas para o Amanhã, promovido pela Samsung, com a coordenação técnica do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária). Pouco tempo depois, veio a notícia de que a Escola Indígena Estadual de Ensino Fundamental e Médio Sertanista José do Carmo Santana, de Cacoal (RO), era uma das vencedoras nacionais do desafio, que estimula jovens do ensino médio a utilizarem conceitos das ciências naturais e da matemática para solucionar problemas reais das suas comunidades.
Professor do segundo ano do ensino médio da escola, que fica localizada na aldeia Gãpgir, na na área Sete de Setembro, ele desenvolveu com a sua turma um projeto que teve o objetivo de resgatar os etnoconhecimentos indígenas por meio de um estudo sobre plantas medicinais e os seus usos. “Os alunos gostaram demais do projeto porque eles não conheciam as plantas medicinais. Agora eles sabem até fazer o preparo”, conta educador, ao mencionar que os jovens fizeram passeios pela floresta e pesquisas com os sabedores, integrantes da aldeia que
transmitem os conhecimentos tradicionais para as gerações. “Agora o projeto é montar um livro de plantas medicinais e distribuir para que todas as escolas tenham esse conhecimento”, completa.
Com olhar voltado para o desenvolvimento local, a turma do segundo ano da Escola de Ensino Médio Ronaldo Caminha Barbosa, de Cascavel (CE), também conquistou um lugar entre os cinco vencedores nacionais do desafio. “São alunos criativos da escola regular que se sentem inovadores e transformadores do meio ambiente”, celebra a professora Jôseline Maria Sousa Nascimento. Preocupados com a relação entre a doença de chagas e a proliferação de insetos em casas de taipa, eles desenvolveram placas de piso e blocos cerâmicos com biomateriais, a partir de resíduos de borracha, de vidro, de madeira de demolição, de fibra de coco e do solo.
De acordo com ela, projetos como esse, de investigação e interação com a comunidade, trazem motivação para os estudantes, que podem ver a aplicação prática de conteúdos estudados na escola. “SOS Casa é um projeto de empreendedorismo social que usa biomateriais para transformar casas de taipa e de pau a pique. A comunidade é muito pobre, e muitas vezes as melhorias não vêm do governo. Com um projeto científico eles [os alunos] podem desenvolver algo”, destaca.
O sentimento de empoderamento e o engajamento comunitário também acompanharam outros grupos que se destacaram no desafio, incluindo projetos das escolas estaduais: Almirante Barroso, de Vitória (ES); Guilherme Teles Gouveia, de Granja (CE); e de Educação Tecnológica do Pará, de Paragominas (PA). “Cada vez mais, os projetos mostram importantes realidades que precisam ser transformadas. Mais do que isso, eles trazem o envolvimento de forma colaborativa dos alunos. Não é um projeto do professor, mas de toda uma comunidade escolar”, avalia a gerente de Cidadania Corporativa da Samsung Brasil, Isabel Costa, durante a premiação que aconteceu nesta terça-feira (5), em São Paulo.
Inspirado no concurso norte-americano Solve for Tomorrow, que trabalha a aplicação de conhecimentos de STEM (sigla em inglês para Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática), o desafio Respostas para o Amanhã também já foi realizado em outros seis países da América Latina: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Panamá, México. Desde 2014, quando aconteceu a primeira edição no Brasil, já participaram mais de 106 mil alunos de 3.300 escolas de todos os estados brasileiros. “A qualidade dos projetos melhorou muito [neste período]. Nós acreditamos que a premiação é formativa, já que a própria ficha de inscrição serve como um momento de reflexão para o professor. Tentamos analisar as fragilidades de cada edição para produzir conteúdos formativos para o site”, avalia Ana Cecília Arruda, coordenadora de projetos do Cenpec.
Na visão dela, entre as mudanças identificadas na última edição do prêmio, há uma ampliação do entendimento do conceito de sustentabilidade entre os participantes. “Por meio de um percurso formativo, tentamos mostrar para os professores que o conceito de sustentabilidade era mais amplo e envolvida muitas dimensões”, sugere. Além dessa percepção, ela sugere que a participação dos estudantes em desafios nacionais ajuda a desmistificar o campo das ciências da natureza, mostrando que a física e a química também podem estar presentes no dia a dia.
Vencedor da primeira edição, Bruno Henrique de Oliveira, 20, conta que decidiu cursar licenciatura em física depois de ter se envolvido no desafio. Junto com os seus colegas da Escola Estadual Tristão de Barros, de Currais Novos (RN), ele usou lixo eletrônico para desenvolver tecnologia assistiva para pessoas com deficiência. “A gente nem tinha espaço para isso. O nosso laboratório era a garagem do professor, que ficou cheia de equipamentos recolhidos pelo grupo”, lembra. Hoje, no Instituto Federal do Rio Grande do Norte, seu objetivo é dar continuidade ao projeto que surgiu no ensino médio. “Estou tentando desenvolver o protótipo de uma bengala que pode ser reduzida ao tamanho de uma caneta”, compartilha.
E se por um lado os desafios de ciências aproximam os conteúdos da realidade dos alunos, por outro, a metodologia de projetos presente nessas competições também é uma aliada dos professores para estimular o protagonismo jovem e o trabalho em equipe. Esse foi o caso da turma do segundo ano do Colégio Estadual Dom Veloso, de Itumbiara (GO). “A nossa turma era a pior da escola. A partir do momento que a professora Ayanda veio com essa proposta de projeto, mudamos da água para o vinho. Isso foi só um gatilho para todos se empenharem”, diz Vinícius Leonardo, 19, que hoje estuda direito no ULBRA (Instituto Luterano de Ensino Superior).
Para melhorar a saúde pública na zona rural de Itumbiara, a turma fez uma investigação científica sobre o uso da planta Moringa Oleífera no tratamento de água. A partir de testes com cisternas e entrevistas com moradores, eles encontraram uma forma de aplicar os conteúdos de biologia para mudar realidade local, já que moradores da comunidade frequentemente apresentavam sintomas de doenças associadas à ingestão de água contaminada. “Isso faz o aluno se sentir participante. Quando o professor consegue envolver toda a turma, ele consegue ter melhores resultados”, sugere a professora Ayanda Ferreira, que orientou o projeto.
Ter vencido a segunda edição do prêmio, segundo ela, despertou um sentimentos nos alunos e nos professores de que era possível trabalhar e aprender por meio de projetos. “Em 2015, apenas a minha sala tinha feito a inscrição para o desafio. Hoje estamos aqui com seis turmas de ensino médio”, celebra.
Os vencedores selecionados pela banca julgadora do desafio receberam dois notebooks Samsung (um para o professor e outro para o diretor da escola) e tablets para todos os alunos da classe. Também foram concedidos uma menção honrosa e mais cinco prêmios para projetos votados pelo júri popular. Os troféus e medalhas distribuídos foram prototipados por jovens do espaço maker Área 21. Conheça todos os vencedores da quarta edição do Prêmio Respostas para o Amanhã.