Professora de Parintins (AM) cria projeto multimídia para abordar bullying na escola
De maneira interdisciplinar, por meio de cartazes, vídeos e fotografias, alunos do 5º ano são sensibilizados sobre o cuidar e o respeitar o próximo
por Mary Sônia Dutra de Alencar 25 de outubro de 2021
Dialogar com as crianças e proporcionar uma reflexão sobre a diversidade no ambiente escolar tem sido uma questão pertinente e de grande valor em nossa sociedade. A escola desempenha um papel fundamental ao contribuir na construção de cidadãos que respeitem as diferenças entre as pessoas e que construam um bom convívio com todos.
Muitas vezes, as crianças reproduzem atos de preconceito em relação aos seus próprios colegas e demais funcionários da escola, gerando um clima de instabilidade emocional e afetiva – e atrapalhando até mesmo seu processo de aprendizagem. Nos dias de hoje, não é novidade que as crianças venham sofrendo com a prática do bullying e, como consequência, acontecem a evasão, a agressividade, a baixa estima e outras ações depreciativas.
Diante dessa problemática, o ensino fundamental 1 da Escola Estadual Ministro Waldemar Pedrosa (localizada em Parintins, no Amazonas) precisou inserir hábitos saudáveis em um ambiente de convívio mútuo, incentivando a autoestima das crianças a partir da representatividade, promovendo a integração e o desenvolvimento de valores. Para tanto, foi criado o projeto “Soltando a voz: eu tô melhor agora”.
O objetivo era permitir e conhecer situações de boa convivência nas relações entre as crianças e as demais pessoas no ambiente escolar, sensibilizando-as para a formação de bons hábitos, atitudes e práticas sobre o cuidar e o respeitar o outro nas mais diversas características sócio-histórico-cultural-políticas e religiosas, bem como estimulá-las a uma convivência “sem medo”. Com isso, todas as pessoas podem se sentir valorizadas em sua singularidade ao mesmo tempo em que a diversidade é valorizada na sua relação com o outro por meio da empatia e alteridade.
Tudo começou com uma pesquisa qualitativa no ano de 2019, envolvendo todas as crianças do 5º ano A e B do ensino fundamental 1 do turno matutino. A mesma foi aplicada a partir de uma sequência didática conforme a Proposta Pedagógica Estadual para o ensino fundamental 1 e as metodologias pertinentes à educação básica.
Na primeira etapa do projeto, foi feita uma assembleia sobre a convivência na escola, seguida de levantamento de situações de desafetos, agressões, violências que tenham ocorridas no cotidiano escolar (“Essas atitudes são comuns em nossa escola?” “Alguém já presenciou alguma cena como essa, seja na sala de aula, no pátio, ou no recreio?” “Como isso aconteceu?”). A partir desse momento, apresentou-se o termo bullying.
Para explicar o conceito pelas crianças, criou-se uma tabela no quadro, evidenciando todas as palavras que representam esse comportamento e suas consequências na convivência e respeito ao outro. Houve, também, demonstração do processo de sensibilização dos sentimentos por meio de desenhos, falas individuais e coletivas.
Na segunda etapa, foi apresentada a Lei 13.185/15, de Combate à Intimidação Sistemática. Os estudantes realizaram uma primeira leitura individual sobre o documento e discutiu-se as palavras ou expressões que desconheciam, o significado contextual da lei na realidade do município de Parintins como uma garantia de segurança contra o bullying nas escolas ou na vida deles na própria comunidade em que vivem.
Depois, leram em voz alta o parágrafo 1º, do Art. 1º da lei, que considera: “[…] intimidação sistemática (bullying) todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo que ocorre sem motivação evidente, praticado por indivíduo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidá-la ou agredi-la, causando dor e angústia à vítima, em uma relação de desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas”.
Clique na seta amarela ao lado da foto abaixo para conferir a galeria de imagens:
Feito isso, as crianças retomaram as informações anotadas no quadro sobre o conceito de bullying, comparando-as com a definição proposta na lei. Foram pedidas ainda ações que, na opinião deles, poderiam solucionar ou melhorar cada um dos itens mencionados. Essa etapa ainda contou com a realização de entrevistas com os funcionários da escola para saber se a pessoa sofreu, praticou ou presenciou algum tipo de bullying em sua época escolar, com socialização dos relatos do que era praticado em décadas anteriores e o que ocorre nos dias atuais.
Na terceira etapa, foi adotado como referência o texto “Somos contra o bullying”, propondo as seguintes questões dialógicas: “Como a velocidade dos atuais meios de comunicação pode contribuir para que a prática do cyberbullying seja ainda mais ofensiva?” e “Quais sugestões você daria para combater o bullying no ambiente escolar e na internet?”. Tendo feito esse exercício de reflexão, ficou como sugestão a produção de textos informativos, nos diferentes gêneros, que foram utilizados para conscientizar a comunidade escolar.
Na quarta etapa, chegou a vez da “mão na massa”: as crianças produziram seus textos (poesias no estilo SLAM, acrósticos e desenhos) de forma coletiva e individual, utilizando diferentes recursos (vídeos para internet e fotografias) com divulgação de vídeos informativos no site da escola.
As crianças, em sua maioria, no espaço do “Soltando a voz” externalizaram seus sentimentos nos poemas construídos e declamados. Puderam provocar reflexões nas letras dos seus versos e estrofes. Conseguiram perceber que é possível ajudar a si mesmo e ajudar o outro. O respeito foi um dos pontos que mais foi ressaltado em suas produções escritas. A interação em grupo oportunizou o conhecimento e a partilha dos saberes, produzindo o respeito na hora de ouvir as diferentes opiniões.
Percebeu-se que, a partir dessa iniciativa, as crianças já demonstram uma maior sensibilidade e respeito na forma de tratamento entre os pares, colegas e demais pessoas. O projeto foi tão entusiástico que passou a fazer parte do Projeto Político-Pedagógico da escola para que possa ser alcançado a um número maior de crianças e turmas.
Criar possibilidades de inserir novas metodologias na sala de aula ajudou a oferecer um aprendizado de qualidade às crianças e enriquecer mais o trabalho cotidiano no exercício da profissão docente. Sentir-se partícipe da vida escolar de cada um com suas conquistas, avanços e percalços, fez com que nos envolvêssemos ainda mais em leituras, pesquisas e em outras práticas pedagógicas que contribuíssem com o aprendizado.
Conviver com o igual e o diferente é uma constante na sociedade em que vivemos. Ter uma reflexão mais empática e altruísta foi o resultado de seus poemas e a certeza de que o conhecimento é a base para a mudança de uma sociedade melhor para todos.
Mary Sônia Dutra de Alencar
Formada em pedagogia com habilitação em supervisão escolar pela Universidade Nilton Lins (2003). Mestra em educação (desenvolvimento curricular) pela Universidade do Estado do Amazonas (2013), pesquisadora, desde 2011, do Projeto Observatório da Educação (POE/CAPES/UEA). Também é especialista em psicopedagogia pela Universidade Nilton Lins. Licenciada em pedagogia pela Universidade Nilton Lins (2004), é professora da Secretaria de Educação e Cultura do Amazonas (SEDUC-AM) desde 2016 no município de Parintins (AM). Leciona na Escola Estadual Ministro Waldemar Pedrosa e Colégio Nossa Senhora do Carmo.