Realidade aumentada torna aula de anatomia palpável
Romero Tori desenvolve experimentos para treinamento de procedimentos médicos e recursos para visualização 3D de prédios
por Vagner de Alencar 1 de outubro de 2012
Tecnologia e educação, não é de hoje, andam juntas. O retroprojetor, o videocassete e até mesmo, quem não se lembra, o mimeógrafo já foram recursos inovadores algum dia. Agora, a bola da vez são as tecnologias interativas, como a RA ou realidade aumentada, recurso que projeta para o espaço físico elementos virtuais interativos que tornam o aprendizado mais interessante. Na educação, ainda que timidamente, a RA vem sendo usada como forma de tornar alguns conteúdos educacionais mais próximos dos alunos, por exemplo, em aulas de anatomia, no estudo da estrutura de prédios e ainda no treinamento de procedimentos médicos.
“No Brasil, ainda estamos em fase de pesquisas em laboratório, com poucas aplicações em sala de aula. No exterior, é mais fácil encontrar exemplos”, afirma Romero Tori, especialista em tecnologias interativas pela USP (Universidade de São Paulo), que se apresenta no Inova Educa 3.0, evento que acontece nesta segunda-feira em São Paulo.
Atualmente, Tori está desenvolvendo ferramentas de realidade aumentada para o ensino de anatomia, no treinamento de procedimentos médicos e odontológicos nos centros de pesquisa que coordena, como o Interlab (Laboratório de Tecnologias Interativas) na USP, além do programa de iniciação científica e do grupo de pesquisa em tecnologia aplicada no Senac.
Um desses experimentos, usado no ensino de várias disciplinas, é o livro em 3D. Como uma publicação normal, ele pode ser folheado com as mãos, mas o conteúdo, em vez de estar escrito no papel, é projetado sobre as páginas. Outro exemplo é o projetor de raio-x virtual, que permite observar as estruturas internas de prédios, máquinas e outros objetos. “Este projetor permitirá que alguns estudantes de engenharia visitem uma obra e observem detalhes das estruturas, em vez de fazê-lo por meio de plantas ou imagens [em papel]”, explica.
Mais um dos recursos tecnológicos em estudo é a criação de um atlas anatômico 3D, que permite que os estudantes manipulem, por exemplo, pedaços do corpo humano ou dentes, como se estivessem nas suas mãos. Além disso, há ainda um sistema que simula uma agulha de punção ou de injeção para treinamento médico. “No momento, estamos testando com a simulação de punção de mama e anestesia bucal”, afirma.
De acordo com o especialista, as tecnologias interativas permitem que alunos passem a ser mais ativos no processo de aprendizagem, deixando de ser consumidores para se tornarem produtores de conteúdo. “Por estarem mais próximos da realidade e do interesse dos alunos, [as tecnologias interativas] possibilitam uma maior motivação e participação. Muitos recursos têm custo mínimo, já existem programas gratuitos e que podem trabalhar com material reciclável e barato, como cartolina”, diz.
Rede pública
Na rede pública, outro exemplo de tecnologia interativa vem sendo utilizado no colégio estadual Embaixador José Bonifácio, em Petrópolis, Rio de Janeiro. Desde 2009, o professor Guilherme Hartung está utilizando a realidade aumentada para ensinar biologia, ciências, física, além da criação e modelagem de jogos educativos aos estudantes de ensino médio, como já mostramos em uma matéria do Porvir. “Sem demérito ao seu trabalho, pelo contrário, posso dizer que não há grandes dificuldades tecnológicas para promover atividades como essa”, conta Tori.
Segundo ele, muitas vezes, a desmotivação dos professores é reflexo da falta de apoio e incentivo à implementação dessas novas tecnologias. Há, no entanto, outro obstáculo anterior e maior. “O desconhecimento e o preconceito relativo a novas tecnologias por parte de muitos professores e pedagogos”, diz.
O especialista afirma que a escola não pode criar um cenário diferente daquele que é vivenciado pelos alunos. Ao contrário, precisa aproveitar a motivação que as crianças e os jovens têm com as novas tecnologias para usá-las como aliadas, em vez de tentar proibi-las. “Hoje, mesmo alunos de baixa renda possuem acesso a celular e internet, ainda que em lugares públicos. Participam de redes sociais, tuítam, assistem a filmes no Youtube. Essa é a realidade de grande parte da população de jovens”, afirma.
Para Tori, é preciso que os responsáveis pela educação pública – diretores, coordenadores e professores – se conscientizem de que a realidade dos alunos que chegam à escola hoje é muito diferente. “Precisamos pensar com a cabeça de século 21, não de século 20 ou, pior, século 19, como, infelizmente, algumas escolas ainda pensam.”