Educação corporativa muda para atender novas demandas
Em um mundo em transformação, empresas adotam novas metodologias para desenvolver competências deixadas de lado durante o período escolar
por Vinícius de Oliveira 8 de abril de 2016
Em muitos países, as profissões que mais buscam candidatos a uma vaga de trabalho não existiam há 10 anos e, ao que novos estudos indicam, o ritmo de mudança só vai acelerar. Um novo relatório divulgado pelo Fórum Econômico Mundial mostra que 65% das crianças que ingressam hoje no sistema de ensino vão acabar trabalhando em funções que ainda não foram criadas. Tal situação, segundo profissionais de recursos humanos ouvidos pela pesquisa, demanda – além de mudanças no ensino formal – uma nova atitude de empresas, que precisam estar preparadas a capacitá-los a partir do momento em que são contratados.
“As pessoas estão chegando às empresas sem saber se comportar”, diz Marcelo Veras, presidente da Inova Business School e há 17 anos no setor de educação executiva. Para ele, a escola vê um filme diferente daquele que é exibido no mundo real e isso traz consequências até para tarefas simples dentro de uma corporação. “Eu aprendi na marra quando cheguei à minha primeira multinacional. Quando entrei, pensei ‘Por que ninguém me contou que eu tinha que me preparar para isso aqui?’. Mesmo dominando tudo na minha área, eu não sabia me vestir direito, negociar e nem como lidar com pessoas de culturas diferentes”, afirma.
Assim como mostrou o guia temático sobre competências socioemocionais, Veras afirma que parte da origem e também da solução para o problema está na educação básica. Naquele material, o Porvir mostrou com exemplos práticos como é possível, desde a primeira infância, desenvolver essas competências e como elas trazem consequências diretas na vida adulta.
Para entender o que acontece no mercado de trabalho, desde 2006, Veras tem entrevistado executivos de grandes empresas. Após mais de 170 conversas, mapeou 27 competências, divididas em técnicas e comportamentais que, juntas, proporcionam uma boa gestão. Com isso em mãos, criou um teste que pode ser feito diretamente em seu blog e que já teve 500 participantes desde o final de 2015. “A importância de cada competência depende de alguns fatores, como tipo de empresa e fase da carreira”.
Entretanto, Veras coloca seis delas como muito importantes logo nos primeiros anos de carreira e capazes de gerar diferenciação em relação aos demais recém-formados. No caso das comportamentais, o comprometimento/execução e capacidade de relacionamento. Entre as técnicas, estar por dentro de tendências e futuro (entender o que pode acontecer na área de atuação) e ter raciocínio analítico. Por fim, na área de gestão se destacam liderança e empreendedorismo. “A média geral é tão ruim que aqueles que conseguem desenvolvê-las colocam metade dos concorrentes para trás”, diz.
Integrante do conselho de diferentes empresas, Veras diz que todas manifestam uma opinião comum durante as reuniões: “As universidades não entregam o que a gente quer”. Por isso, explica, empresas pensam em criar universidades corporativas. Por outro lado, elas não sabem como fazer porque não são da área de educação. Assim, consertar o carro enquanto ele ainda está em movimento acaba abrindo oportunidades para parceiros de menor porte e empreendedores.
De olho nesse movimento, empresas como a Tuttolabs, que iniciou suas atividades em 2014, têm levado ao ambiente corporativo metodologias como ensino híbrido e gamificação, que o Porvir já trata com mais frequência quando fala sobre educação básica, técnica ou superior. O objetivo é acabar com as tradicionais apresentações de slide que pouco engajam o funcionário e entregar uma solução personalizada para cada área de atuação.
“Em um aplicativo para vendas, a gente está desenvolvendo um podcast porque o colaborador precisa fazer dez visitas por dia e não vai ter tempo [de fazer as atividades no escritório]. Enquanto espera para ser atendido, ele pode escutar quais são os atributos do produto e dizer se gostou ou não do conteúdo”, explica Rafael Pinho, sócio-fundador da empresa.
Para um cliente do ramo farmacêutico, Pinho conta que a estratégia utilizada foi a gamificação para engajar os vendedores, profissionais considerados de perfil imediatista. “Eu começo a rankear no aplicativo os profissionais que tiveram melhor desempenho e, no final do ano, eles recebem benefícios. E estamos conversando com parceiros de milhagens para plugar essa tecnologia em um programa de pontos reais”, diz.
Outra solução encontrada para atender os mais diversos tipos de usuário é o ensino híbrido, que se mostra eficiente para atender as diferentes agendas ao conciliar o ensino presencial e as plataformas online. “Na educação, é difícil saber todos os caminhos que alguém percorre para obter conhecimento. A melhor forma que se consegue fazer isso é usar mais de um canal, como áudio, texto e vídeo”.
Todas essas novas soluções têm um inimigo comum: as apresentações de slides. Para o executivo da Tuttolabs, o mercado vive um “caminho sem volta”. “As empresas ainda estão com um processo do começo dos anos 2.000. Existe muito “passa-tela” ou PPT (arquivo de apresentação digital) e é preciso entender que a educação ajuda na entrega de resultado”.