Enem e vestibular: como lidar com as emoções dos estudantes nesta fase? - PORVIR
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Inovações em Educação

Enem e vestibular: como lidar com as emoções dos estudantes nesta fase?

Especialistas destacam que os professores devem acolher e oferecer uma escuta ativa aos jovens, seja antes ou depois de realizar a prova

Parceria com LIV

por Ruam Oliveira ilustração relógio 30 de novembro de 2022

Sair do ensino médio significa que uma etapa da vida está concluída e algo novo se avizinha. Para os estudantes que desejam ingressar na faculdade, o último ano dessa etapa de ensino é regado de muitas emoções, entre elas o medo e a ansiedade em relação ao futuro e à aprovação no vestibular. 

“O que eu vou fazer?” ou “Será que eu vou conseguir?” entram na lista das principais perguntas feitas por jovens nesse período. O vestibular e o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) são as portas de entrada na universidade e, em ambos os casos, exigem que os alunos tenham conhecimentos variados sobre muito do que viram ao longo dos anos na educação básica. 

Como as avaliações geralmente afetam o emocional e o psicológico de muitos estudantes, a escola também se torna um espaço de discussão sobre as emoções, o futuro e a incerteza de passar ou não no vestibular. 

É importante que o professor se coloque em um lugar de escuta

Anelise Martins, professora de história e supervisora pedagógica no LIV

“Muitas vezes o aluno tem esse espaço da sala de aula como um local para compartilhar as angústias. É importante que o professor se coloque em um lugar de escuta. Mais até do que tentar entregar soluções para os alunos sobre o que devem fazer, é se colocar nesse espaço de escutar ativamente o que estão trazendo”, diz Anelise Martins, professora de história e supervisora pedagógica no LIV (Laboratório Inteligência de Vida).

A sugestão dada pela especialista é a de escutar para entender o contexto dos estudantes. Levando em consideração que cada aluno tem objetivos distintos sobre o futuro, ela avalia que é importante construir junto aos jovens esse espaço seguro de troca. 

E qual o papel do docente?

O professor Thiago Ribeiro, que dá aulas de geografia no CIEP 198 PROFESSORA ROZA FERREIRA DE MATTOS e no cursinho pré-vestibular comunitário +nós, no Parque Pauliceia, ambos no Rio de Janeiro, tem como principal estratégia tranquilizar os estudantes, destacando que trata-se apenas de uma prova. “Eu sempre abordo que é uma prova, e nem sempre ela é justa, porque vai depender de como você vai estar naquele dia”, conta. 

Ou seja, o docente destaca que há uma parcela significativa dessa equação que não está relacionada ao que o estudante sabe ou não, mas sim a como ele se sente. Ele também diz reforçar aos alunos sobre esse ponto para que não desanimem caso não passem de primeira no vestibular. 

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Essa é uma postura que se alinha com o que pensa Anelise. A supervisora, que também atua em sala de aula, diz que os professores não devem aumentar a pressão sobre os ombros dos alunos. Outra sugestão é não estereotipar os jovens. Uma dica que serve tanto para períodos de pré-vestibular, quanto para outras ocasiões. 

Anelise exemplifica que pode acontecer de ter alunos que não se dedicaram tanto o ano inteiro, e o docente corre o risco de automaticamente colocá-los em caixinhas. “Isso acaba tornando ainda mais desafiador para essa pessoa a relação e aproximação com o conteúdo e com o aprendizado que precisa ter para as provas, para o Enem ou outro exame que for”, pontua. 

Organizando a rotina e expectativas

Para evitar que os estudantes fiquem mais ansiosos do que o normal, os docentes podem trabalhar com eles a gestão das rotinas de estudos. Anelise aponta que é comum que, quanto mais próximo da data da prova, mais os jovens sentem que precisam estudar “vinte e quatro horas por dia”, e não precisa ser assim.

De fato, até mesmo os momentos de descanso contam no emocional dos vestibulandos, ela explica. “Uma das estratégias prévias é ter organização. É não querer resolver tudo em cima hora e ter um planejamento sobre o que vai acontecer a longo prazo. Se possível um plano de estudos que tenha a inclusão dos momentos de descanso, porque senão ficam naquela tensão e vontade de performar bem que são prejudiciais ao próprio corpo”, afirma. 

Outro ponto importante é manter o hábito de descansar e alimentar-se bem. Na hora da prova, concentração e respiração consciente ajudarão bastante

José Ricardo Martins Machado, especialista em educação emocional 

O professor José Ricardo Martins Machado, especialista em educação emocional, pontua que os jovens não devem se forçar a aprender um excesso de coisas novas, porque isso também pode ser fonte de ansiedade. Para ele, a sugestão que os professores podem dar é que os estudantes revisem o que aprenderam até ali. “Outro ponto importante é manter o hábito de descansar e alimentar-se bem. Na hora da prova, concentração e respiração consciente ajudarão bastante”, diz. 

E quando o cenário é negativo?

Quando os estudantes recebem um resultado não esperado, é natural que fiquem frustrados. José Ricardo comenta que, ao ingressar no ensino médio, a maioria dos jovens está pensando sobre o que podem ou querem fazer. Essa perspectiva de enxergar o futuro pode, também, fazê-los entender que o vestibular é algo definitivo, sem chances de novas tentativas, o que não é verdade. 

“Certa vez, uma estudante do 3º ano trouxe a seguinte questão: ‘Professor, passei dois anos sem dar muita importância pra pensar sobre faculdade. Acho que agora é tarde demais!’. A orientação naquele momento foi que ela ainda teria tempo suficiente para fazer suas escolhas. O mais importante é não se sentir pressionado a decidir sobre algo que ainda lhe causa dúvidas”, relembra o educador. 

Com um resultado negativo em mãos, Anelise destaca que a postura dos professores pode ser de tentar ouvir, da perspectiva do estudante, como foi a experiência como um todo. “Às vezes nós professores chegamos em sala de aula já pensando: ‘Meu Deus, tenho pouco tempo, preciso dar o conteúdo’. Com isso ficamos fechados [a ouvir]. Tem que ter um tempinho para perguntar para a turma: ‘Está tudo bem com vocês?’. Hoje em dia já existem diversas pesquisas que mostram justamente que se o aluno não está bem, ele não vai aprender”, comenta Anelise. 

A educadora pontua que é preciso olhar para o socioemocional não só quando o aluno está fora da sala de aula, mas também dentro dela. “Após um resultado negativo, o primeiro passo é acolher.” Ela complementa dizendo que quando o assunto é olhar para o futuro, muitos docentes se detém em um período distante, no que o estudante vai fazer daqui há dez anos. Para ela, é válido também se atentar para o que ocorre no futuro próximo, que é motivo de preocupação dos jovens. 

“O professor pode trazer para a sala de aula sua própria experiência da primeira semana dele na faculdade, de como foi o primeiro ano… Conversar sobre esse processo e se, de repente, não conseguiu passar de primeira ou se conhece pessoas próximas que não conseguiram passar em uma primeira vez na faculdade.”  

Um fim e um começo

Os períodos de vestibular e de ingresso na universidade também representam o fim da educação básica. Esse é um outro tipo de luto que acaba sendo vivenciado pelos estudantes e pode gerar um certo sentimento de vácuo. 

“A escola representa suporte, segurança, rede de apoio e senso de pertencimento. Quando a despedida desta fase está muito próxima, a sensação de vazio e as incertezas passam a se fazer presente. Alguns alunos relatam que em suas casas não há a possibilidade de ficar sem estudar, pois a faculdade deve ser o passo imediato ao concluir o ensino médio. Essa colocação pode gerar insegurança no estudante e, consequentemente, pressa na hora de tomar decisões. Em contrapartida, encontramos jovens que relatam ter espaço maior para pensar em suas escolhas e que está tudo bem se não ingressarem imediatamente no ensino superior”, afirma José Ricardo. 

A escola representa suporte, segurança, rede de apoio e senso de pertencimento. Quando a despedida desta fase está muito próxima, a sensação de vazio e as incertezas passam a se fazer presente

José Ricardo Martins Machado, especialista em educação emocional 

Thiago confessa que a temática sobre vestibular e Enem diminuiu no último ano, dando lugar a outras preocupações como emprego e a necessidade de ajudar nas finanças de casa. “Muitos alunos encaram a conclusão do ensino médio como a finalização dos estudos em si e a hora de entrar no mercado de trabalho”, diz. “Anteriormente a gente conseguia uma inserção maior com eles, mostrando que as perspectivas podiam ser ampliadas, mas com o problema da emergência social que muitos se encontram, eles se veem obrigados a ingressar no mercado de trabalho e acabam não tendo tempo para estudar”, analisa. 

Isabela Bragança, professora de língua portuguesa no Colégio Municipal Tenente General Gaspar Colaço, em Santana de Parnaíba (SP), também sente esse desinteresse por parte de seus alunos. Para ela, muitos aparentam ter perdido as perspectivas de futuro e de cursar uma graduação dado o contexto em que vivem. 

“As minhas turmas são do período noturno, e muitos estão nesse horário porque já trabalham e isso ocupa muito do tempo deles. A maioria não vai para a escola com interesse no ensino superior. Os poucos que se interessam têm potencial, mas bastante dificuldade”, conta a professora. Tal dificuldade também se deve ao fato de que a turma esteve sem professor de língua portuguesa até agosto deste ano.  “Tento motivá-los sempre que eu tenho oportunidade, porque vejo muito potencial neles, mas não é fácil”, conclui. 

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competências para o século 21, ensino médio, socioemocionais

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