Ensino remoto e ensino digitalizado: um retrato destes 7 meses - PORVIR
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Coronavírus

Ensino remoto e ensino digitalizado: um retrato destes 7 meses

Conteúdos acabaram hierarquizados para dar prosseguimento aos estudos, sem entender que esta situação poderia demorar mais tempo do que estamos passando

por Doug Alvoroçado ilustração relógio 6 de outubro de 2020

Nossa profissão nos fez acostumar com o nosso posto de trabalho mais comum: a sala de aula. Este espaço riquíssimo e presencial nunca foi planejado para dividir espaço com sua virtualização, porém a pandemia que se apresenta nos “catapultou” para um tempo novo, de novidades tecnológicas. Alguns surfaram nessa onda. Outros, meio atabalhoados, estão se erguendo e vendo o que virá. Uma grande parte apenas espera a onda passar.

Muitos se reinventando para dar conta deste ensino remoto, ou ensino à distância, ou apenas ensino. Alguns investindo em sua formação para atuar em mais esse campo. Outros sendo levados a tal lugar sem muitas escolhas. O Ensino Remoto Emergencial foi a solução encontrada para dar conta deste período de isolamento físico e o distanciamento geográfico (nunca isolamento e distanciamento social, pois enquanto sociedade estamos juntos e conectados, agora em diversas plataformas).

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– Paulo Blikstein: O coronavírus também vai contaminar a educação?

Para começar, temos que diferenciar de uma vez por todas que o que experimentamos nestes sete meses não é o que chamamos de educação a distância. Segundo o MEC (Ministério da Educação), a EAD é a modalidade educacional diferente, que tem por prerrogativa ser a distância desde sua aceitação pelos discentes até sua conclusão. Alunos e professores estão separados, física ou temporalmente. O uso das tecnologias aqui cabe muito bem para coordenar estes encontros virtuais em ambientes de troca e aprendizagens. Só por esta definição entendemos que não vivemos EAD, mas um ensino remoto. Mas será que vivemos este de fato.

No meu entendimento de pessoa que vive o ciberespaço como vida, entretenimento e trabalho o que experimentamos foi o ensino remoto emergencial. Tivemos que, praticamente, migrar, em poucos dias, toda a estrutura das escolas para ambientes de trabalho virtual, usando ferramentas síncronas, assíncronas, feitas para serem educativas e até as que não nasceram com esta finalidade. Fomos tateando, mais acertado que errando, mas conseguimos fazer vinte anos de evolução educacional tecnológica caberem em dois meses.

Este ensino remoto emergencial nos ferramentou com estratégias didáticas e pedagógicas, verdadeiramente diminuindo o impacto do período de isolamento, causado pela pandemia do Covid-19. A grande perda deste formato acidental é que não foi (e nem podia ser) obrigatório. Isso permitiu acessos e não-acessos de muitos. A aula remota emergencial tinha a cara e a vontade de fazer online, mas o gosto e a esperança de voltar para o presencial. Logo, assuntos e conteúdos foram elencados e hierarquizados para dar prosseguimento aos estudos, sem entender que esta situação poderia demorar mais tempo do que estamos passando.

O ensino remoto de fato pressupõe que conteúdos devem ser ministrados de maneira online. Síncrono, assíncrono, em videochamadas ou em transmissões. Estudar remotamente é fazer parte do rol de alunos sem nem mesmo ter estado lá. O ensino remoto, se aplicado de fato para o futuro permitirá que alunos estudem em dois estados ao mesmo tempo. Ou que façam português em uma escola, matemática em outra e completem a sua formação com curso de idiomas online. O remoto não nasceu pra ser presencial e se estivermos com vontade de voltar para o presencial não estamos fazendo ensino remoto corretamente. Podemos fazer ou não fazer. Tentar e não conseguir é não fazer.

O ensino remoto que vivemos agora tem mais similaridade com o ensino digitalizado do que o ensino digital. Explico a diferença.

Este ensino digitalizado é migrar do presencial para o virtual. Folhas, atividades, cursos e métodos que cabem no presencial foram encaixados no virtual. Ferramentas virtuais e aulas foram feitas para “simular” a experiência presencial. Mas em nenhum (ou em poucos) momentos foram pensados para a experiência nascida e vivida 100% online.

Um professora veio a mim em uma conversa informal e perguntou:

– Como faço para manter meus professores calados nas reuniões online? Se eu simplesmente mutá-los vai parecer grosseria!
– Faça da mesma maneira que você faz nas suas reuniões presenciais, respondi.
– Não consigo fazer nas reuniões presenciais…

É a velha história de colher uma fruta diferente plantando a mesma semente. Ou criamos estratégias para a nova ética e vivência virtual, ou vamos apenas reproduzir virtualmente o que vivemos presencialmente. Lembrando que não acho isso ruim e não menosprezo um para erguer outro. Apenas acredito que são lugares diferentes, com valores diferentes e potencialidades diferentes.

Viver uma experiência remota de fato pressupõe acreditar e criar estratégias para este formato de aulas, entendendo como ele funciona e como cada aluno vive e experimenta a sua navegação online. Entender o acesso significa entender as entregas e didáticas, as aprendizagens e as avaliações. Hoje precisamos somar aos nossos estudos preocupações como tempo de tela, entretenimento versus educação, aprendizagem gamificada ou camuflada, educação midiática e suas aplicações dentro e fora do ambiente virtual, entre outras coisas.

Não vamos deixar-nos abater, pois o futuro trará mais coisas ainda. Este desafio de aprender a aprender a ensinar está intrínseco na tarefa de ser professor. Assim vamos nos desenvolvendo para trilhar e construir os futuros possíveis de nossa profissão em “cyber-futuros” não tão distantes.


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coronavírus, educação infantil, educação online, ensino fundamental, ensino híbrido, ensino médio

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