Escola é lugar de debate sobre causas e consequências do trabalho infantil
Neste 12 de junho, Dia Mundial contra o Trabalho Infantil, o Porvir reúne planos de aula, vídeos e materiais para apoiar professores e estudantes a refletir sobre um dos problemas mais graves do país
por Ana Luísa D'Maschio 12 de junho de 2023
Trabalho infantil: você o nota em seu dia a dia?
Acompanhe a cena a seguir:
“Nos faróis da Avenida Tiradentes, próximos da Estação Armênia do metrô, região central da cidade de São Paulo, meninos se reúnem aos fins de semana para fazer malabares. Mas não são apenas malabaristas. Com tinta no rosto e fantasiados de palhaços, tornam-se o colorido na cidade cinza. No concreto, a pintura grita. É a busca pela visibilidade, a forma encontrada para dizer: ‘Olha, gente! Estou aqui!’. Um silencioso pedido de socorro, quase inconsciente.”
O trecho acima é do premiado livro-reportagem “Meninos Malabares – Retratos do Trabalho Infantil no Brasil” (Editora Panda Books), da jornalista Bruna Ribeiro e do fotojornalista Tiago Queiroz Luciano. Lançada em 2021, a publicação reúne histórias de meninos e meninas em situação de trabalho, tão invisíveis para a sociedade quanto os malabares que pedem dinheiro nos faróis.
Uma das principais violações de direitos humanos, o trabalho infantil afeta, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 1,768 milhão de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos. E escancara também o racismo: desse total, 66,1% são pretos ou pardos. No mundo, somam-se mais de 160 milhões de meninos e meninas no trabalho precoce.
O livro explica: trabalho infantil é toda forma de trabalho realizado por pessoas abaixo da idade mínima permitida de acordo com a legislação de cada país: no caso brasileiro, proibido para quem ainda não completou 16 anos, mas, se realizado na condição de aprendiz, é permitido a partir dos 14 anos.
Clique na imagem para conferir mais fotos do livro “Meninos Malabares”:
Combater os mitos relacionados ao trabalho na infância, como “é melhor do que roubar”, “não mata ninguém”, “traz futuro e forma o caráter da criança” é papel de toda a sociedade, inclusive da escola. Entender suas causas e consequências também. Em todas as esferas, é preciso reforçar a proteção integral da criança e a defesa de seus direitos fundamentais, garantidos pela Constituição Federal e pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), por meio de estratégias de enfrentamento.
Como a escola pode identificar casos de trabalho infantil? |
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Ao detectar possíveis casos em sua turma, informar a coordenação pedagógica é o primeiro passo, como informa o portal Criança Livre de Trabalho Infantil, que reúne reportagens, materiais de apoio e conteúdos formativos sobre o assunto. “É importante que a família seja chamada à escola para uma conversa que esclareça os impactos negativos do trabalho precoce e o fato de não ser permitido legalmente. A escola também pode entrar em contato com o CREAS (Centro de Referências Especializado da Assistência Social) do local de moradia da criança e do adolescente em questão, para verificar a possibilidade de a criança e/ou a família serem incluídas nas políticas socioassistenciais existentes”, orienta o site. |
O Dia Mundial contra o Trabalho Infantil, 12 de junho, foi instituído pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) em 2002, ano da apresentação sobre o primeiro relatório global na Conferência Internacional do Trabalho. Para reforçar a importância de levar o assunto para a sala de aula, o Porvir selecionou materiais de apoio para o planejamento pedagógico. Confira!
Sugestões de atividades
Cartilha Pedra, Papel e Tesoura
Com textos de apoio escritos por especialistas sobre a realidade do trabalho infantil na região sudeste, o material reúne conteúdo pedagógico para subsidiar atividades em escolas e organizações sociais. No YouTube, ainda é possível conferir as animações das crianças que participaram das oficinas do projeto realizado pelo Canal Futura, com apoio da Cidade Escola Aprendiz.
Guia para professores: como trabalhar o tema na sala de aula
O material didático da Cidade Escola Aprendiz reúne as atividades pedagógicas da Cartilha Pedra, Papel e Tesoura (citada acima) e apresenta sugestões de trabalhos e debates que podem ser realizados a distância.
Manual do professor
O livro “Meninos Malabares”, citado no início do texto, disponibiliza, gratuitamente, sugestões alinhadas às competências e às habilidades da BNCC (Base Nacional Comum Curricular), com propostas de atividades ligadas à leitura da obra.
Direitos humanos em educação
Lançado em 2009, o programa Mais Educação reunia, em cadernos pedagógicos, uma série de atividades educativas, com material de pesquisa e muitas referências. Um deles aborda os direitos humanos de maneira ampla, com sugestões de oficinas e encontros para debater a proteção integral e os direitos da infância e da adolescência garantidos por lei.
MPT em Quadrinhos
O Ministério Público do Trabalho disponibiliza para download uma série de histórias em quadrinhos que abordam questões trabalhistas e direitos humanos. Alguns dos títulos são voltados ao enfrentamento do trabalho infantil e à importância do trabalho adolescente protegido pela lei de aprendizagem.
O preço da liberdade (2018)
Prêmio Nobel da Paz em 2014, Kailash Satyarthi é um ativista do movimento indiano pelos direitos das crianças e adolescentes. O filme “The Price of Free” (“O preço da liberdade”, em tradução livre) mostra como ele deixou a carreira de engenheiro para resgatar mais de 115 mil meninos e meninas da escravidão, criando um movimento global contra o trabalho infantil com sua fundação, a Kailash Satyarthi Children’s Foundation.
Ausência (2014, de Chico Teixeira)
Serginho é um menino de 14 anos que trabalha em uma barraca de feira, cuida do irmão mais novo e de sua mãe, alcoólatra. O filme aborda os ritos de passagem do adolescente.
Trabalho infantil ontem e hoje (2014, Tribunal Regional do Trabalho 5, Bahia)
Produzido pela Secretaria de Comunicação do TRT-5, o documentário traz histórias de vítimas de trabalho infantil – à época da filmagem, eram mais de 4 milhões de crianças e adolescentes nessa situação.
Brasil x trabalho infantil (2014, TV Cultura)
Também realizado em 2014, o documentário feito pela TV Cultura reúne especialistas para debater as causas e consequências do trabalho precoce.
Carreto (2009, de Cláudio Marques e Marília Hughes)
O curta-metragem traz a história da amizade de um menino que trabalha como carregador, usando um carrinho de pedreiro, com uma menina da mesma idade.
Sementes (Emicida e Drik Barbosa)
A canção dos rappers Emicida e Drik Barbosa é uma das ações da campanha nacional de 2020 contra o trabalho infantil. A ação foi realizada pelo MPT (Ministério Público do Trabalho), FNPETI (Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil), OIT (Organização Internacional do Trabalho) e TST (Tribunal Superior do Trabalho).
Relampiano (Lenine e Paulinho Moska)
Trata do trabalho infantil nas ruas. O comércio ambulante é considerado uma das piores formas de trabalho infantil. A exposição à violência nas ruas e ao consumo de bebidas alcoólicas comprometem o desenvolvimento da criança e podem causar a evasão escolar, entre outros problemas.
Morro Velho (Milton Nascimento)
Em uma lista de 10 músicas sobre trabalho infantil, o jornalista musical Pedro Alexandre Sanches selecionou essa canção que trata do trabalho precoce no campo e do racismo. “Menino branco e menino negro crescem juntos na fazenda. Menino branco pega na viola, menino negro pega na enxada. Moço branco vira doutor, moço negro fica na fazenda. Homem branco vira patrão, homem negro fica empregado.”
Miséria S.A (O Rappa)
O jornalista Juca Guimarães também fez uma curadoria de raps que tratam do trabalho infantil nas grandes cidades. Entre as indicações, está a música do primeiro álbum da banda carioca O Rappa. Nesta letra, Marcelo Yuka conta em primeira pessoa a rotina de vendedores mirins e ambulantes nos transportes do Rio de Janeiro.
Criança não trabalha (Palavra Cantada)
Composta por Paulo Tatit e Arnaldo Antunes, a música trata dos direitos da infância e alerta contra o trabalho infantil. Uma maneira lúdica de abordar um assunto tão sério com os pequenos.
“Carvoeirinhos” e “Meninos do Mangue” (Roger Mello)
Com muita delicadeza, o escritor e ilustrador Roger Mello retrata a dura realidade de crianças em diferentes situações de trabalho. Em 2014, foi o primeiro brasileiro a receber o prêmio Hans Christian Andersen, maior honraria internacional em literatura infanto-juvenil, pelo livro “Carvoeirinhos” (2009), sobre um garoto que trabalha em uma fornalha. Em “Meninos do Mangue” (2001), retrata o dia a dia dos catadores de caranguejo.
“Crianças Invisíveis” (Elisiane Santos)
Procuradora do Ministério Público do Trabalho de São Paulo (MPT-SP), Elisiane Santos tem uma longa trajetória em defesa dos direitos da infância e, neste livro, ela se debruçou na relação entre o trabalho na infância e o racismo. “A história da infância negra no Brasil é uma história de trabalho, violência e opressão, que começa no período da escravização, que se modifica em relação a vínculos e formas a partir da abolição formal desse sistema na legislação em 1888, mas que se desdobra nas ruas e se reproduz até os dias atuais”, comentou, em entrevista disponível aqui.
“O sonho de Lu Shzu” (Ricardo Gómez e Tesa González)
Lu é uma menina chinesa que trabalha em uma fábrica de brinquedos. O livro mostra a dura rotina da fábrica e a produção de produtos aos quais a criança, explorada pelo trabalho, dificilmente terá acesso. A contadora de histórias Fafá Conta fez a leitura durante um debate sobre o tema, a convite da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano da Paraíba, em 2020.
Rede Peteca
União das siglas PETI (Programa de Enfrentamento ao Trabalho Infantil) e ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), a Rede Peteca é um programa de educação contra a exploração do trabalho da criança e do adolescente.
Coordenado pelo procurador Antonio de Oliveira Lima, do Ministério Público do Trabalho do Ceará, o projeto promove eventos online e presenciais, para professores e estudantes. Também realiza, anualmente, o Festival Prêmio Peteca, voltado à produção dos estudantes em sala de aula sobre a temática.
A Rede ainda modera um grupo de WhatsApp, voltado para troca de experiências entre escolas.