Jogo incentiva reflexão sobre Projeto de Vida no ensino fundamental e médio
Caminho do Futuro proporciona autoconhecimento e debates sobre desafios sociais e o potencial de mudança dos jovens. Saiba como levá-lo para sua escola
por Maria Victória Oliveira 5 de julho de 2022
Todos os hormônios, as amizades e as decisões que podem impactar toda uma vida tornam a adolescência um período no mínimo desafiador para os jovens. Na escola, é uma fase de aumento das responsabilidades e debates sobre seus desejos, vontades e expectativas para o futuro.
É aí que entra o componente Projeto de Vida. Uma das finalidades do ensino médio, segundo a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), é a vivência de experiências que permitam aos alunos entender os objetivos de curto, médio e longo prazos. Assim, serão criadas possibilidades para que possam viabilizar seus projetos.
O jogo de tabuleiro Caminho do Futuro, criado pela Associação Movimento Futuro, mostra que pensar sobre decisões para a vida depois da escola não precisa ser algo angustiante que desperta ansiedade nos jovens. Com duração de um ano, a ser realizado com o apoio de professores do ensino fundamental ou médio, a proposta nasceu da necessidade de levar às escolas espaços de diálogos sobre sonhos combinados com o desenvolvimento de habilidades socioemocionais.
(Clique na imagem abaixo para ver mais fotos):
“Em 2015 começamos um projeto piloto inspirado na metodologia do Instituto Elos e do The Future Project, que traziam o protagonismo das pessoas para transformar o entorno. Como o desafio era fazer algo gamificado para a escola, que colocasse o estudante no centro da sua aprendizagem, de 2015 a 2018 foi um período de testar a metodologia de game, articulando com o estudo sobre a educação e o desenvolvimento da criança e adolescente”, explicam Isabella Alchorne e Sofia Carvalho, cofundadoras da associação. “Além disso, fomos percebendo como o Caminho do Futuro se relacionava com Projeto de Vida e como isso era crucial dentro da perspectiva de uma educação integral”, complementam.
Mesmo que inicialmente o jogo não tenha sido planejado para corresponder às dimensões do Projeto de Vida, a BNCC trouxe essas três dimensões em 2017 – eu, o outro e o nós – que, no fundo, são as mesmas estruturas do jogo do Caminho do Futuro. “Caminho do Futuro é uma metodologia que trabalha Projeto de Vida porque parte do mesmo princípio de desenvolver o eu, depois pensar no outro e construir um nós significativo”, afirmam.
O jogo
Formado por seis passos – interagir, confiar, sonhar, planejar, realizar e contagiar –, o Caminho do Futuro tem o objetivo de construir, conjuntamente, durante o período letivo, um mapa para mostrar aos estudantes onde eles estão e incentivá-los a descobrir para onde querem ir. Escolas interessadas em aplicá-lo devem entrar em contato com o Movimento Futuro.
Para que pensem sobre os desafios de suas comunidades e possíveis trajetos para resolvê-los, é necessário, primeiro, que conheçam essas problemáticas. “Olhar o entorno como uma proposta pedagógica, intencionalmente planejada, faz com que eles enxerguem belezas e problemas que, no cotidiano, passam sem reflexão”, conta Isabella. Nessas saídas de observação, são promovidos diálogos com a comunidade e pessoas que estão circulando no entorno da escola, o que traz concretude para os debates de sala de aula.
“Se chegarmos apenas perguntando qual o sonho [daquele estudante] para o mundo, vamos escutar respostas padrão. Só sonhamos com o que conhecemos de alguma forma. Por exemplo, quando perguntamos aos estudantes ‘como gostariam de resolver tal problema’, todas as vezes, sem exceção, ouvimos ‘vamos fazer cartazes’, porque essa é a resposta que eles conhecem. Então precisamos trabalhar primeiro o autoconhecimento desse estudante e empoderá-lo para acreditar que tem talentos cruciais para promover uma sociedade melhor”, explica Sofia sobre a primeira etapa do processo.
Em seguida, na etapa confiar, a metodologia incentiva que os alunos, juntos, possam criar e planejar um evento colaborativo com toda a comunidade, como se fosse um ensaio para o projeto que vão desenvolver posteriormente.
No terceiro passo, sonhar, os jovens devem estudar o entorno e identificar, em conjunto com a comunidade, os desafios reais, e elaborar um plano de intervenção para a questão. Nos passos seguintes, planejar e realizar, os alunos devem tirar as ideias do papel e colocar a mão na massa para tornar o projeto realidade. “Para nós, os sonhos representam desejos para uma sociedade melhor, que são pensados e planejados pelos estudantes, que criam soluções que visam resolver algum problema”, afirma Isabella.
A sexta e última parada, contagiar, representa a celebração de todo o processo, relembrando as habilidades socioemocionais desenvolvidas, como as descobertas de si mesmo, a colaboração da turma, a empatia e diálogo com o entorno, a autonomia no planejamento, a liderança ao longo do processo e a capacidade de resolver conflitos.
“Todos estes momentos de partilha são essenciais para consolidar o aprendizado dos estudantes, celebrar as vitórias e refletir sobre o que não correu bem para que seja possível construir uma sociedade mais justa, com estudantes que sabem o seu poder de transformação no mundo”, completa Sofia.
Relacionadas
📖10 planos de aula sobre Projeto de Vida para você usar agora
🎦 Assista ao webinário: Como planejar aulas de Projetos de Vida?
🎧 Ouça agora o podcast Projete-se: Projetos de Vida na escola
Reflexões sobre capacidade de mudança
A Associação Movimento Futuro tem parceria com algumas escolas onde aplica a atividade Sofia e Isabella reforçam que é necessária uma relação próxima entre a gestão escolar, as famílias e os professores, no sentido de construir uma conscientização sobre o protagonismo dos estudantes e os projetos que serão criados e tocados por eles.
Os benefícios para realização do projeto são vários, e não é necessário ter experiência prévia com Projeto de Vida para participar, como foi o caso de Maria do Rosário Evangelista, que, em 2019, trabalhava na Escola Estadual Mademoiselle Perillier, em São Paulo (SP).
A instituição foi uma das que recebeu a equipe do Movimento Futuro para o desenvolvimento do jogo. Antes da vivência, Rosário não trabalhava Projeto de Vida com seus alunos. “Hoje, eu enxergo meus alunos de um jeito diferente enquanto professora. Aprendi que desenvolver habilidades com eles não é o suficiente. É necessário mostrar que eles são capazes e são protagonistas.”
A educadora conta que as vivências durante a realização do jogo possibilitaram mudanças não só para os alunos, que tinham diversas questões relacionadas à indisciplina, mas também trouxe pontos positivos para os professores da escola. “Uma das turmas participantes do projeto era difícil e tinha diversos problemas, era muito desmotivada e tinha alunos faltosos. Nós não sabíamos como resgatar essas crianças, e o Movimento Futuro chegou e nos deu um impulso. Foi uma iniciativa nova e diferente.”
Rosário conta que as interações e o incentivo ao protagonismo jovem foram pontos altos do projeto, que conseguiu mostrar aos adolescentes sua capacidade de colocar a mão na massa e transformar sua realidade. “Fomos a um evento de empreendedorismo, que eles nunca tinham participado, e ficaram encantados em ver jovens fazendo e construindo projetos e ações. Com isso, entenderam que também tinham capacidade. Tenho contato com alguns alunos até hoje e sei que estão buscando realizar seus sonhos.”
A responsável por convidar a Associação a atuar na escola foi Rosemari de Paula Souza Silva, professora de língua portuguesa e Projeto de Vida. Ela conta que o jogo seguiu o formato proposto pela associação, de um ano letivo, mas com etapas adaptadas ao tempo, espaço e características da escola, respeitando a especificidade daquele contexto em questão.
“Foram desenvolvidas atividades internas e externas ao espaço escolar, colocando os alunos no centro de todo o processo. Na interação entre o planejamento das aulas dos educadores e as etapas do jogo, foi possível observar um entusiasmo e confiança surgir durante as aulas. Ficou evidente a evolução nas habilidades que envolvem a leitura, oralidade e escrita, bem como a capacidade de lidar com as próprias emoções”, conta Rosemari.