Música ensina idioma e conecta conhecimentos de diversas áreas
É possível ir além de momentos de descontração isolados e apresentar mais do que a gramática quando a música entra como recurso para aprender uma nova língua
por Luciana Alvarez 11 de fevereiro de 2021
Música diverte, descontrai, emociona. Tudo isso já faz dela um excelente instrumento para o aprendizado de um segundo idioma, quando o estudante precisa ter uma escuta atenta para pronunciar as palavras corretamente. A música, contudo, pode contribuir ainda mais dentro de sala de aula – e não só na hora de uma pausa das atividades tradicionais. Com bom planejamento e uma dose de criatividade, ela amplia o repertório cultural, desenvolve o pensamento crítico e ainda associa conhecimentos de diferentes campos dos saberes.
Professora de inglês há 18 anos, Arabelle Calciolari, que conquistou o Prêmio Educador Nota 10 em 2019, sempre usou músicas infantis e populares nas suas aulas, mas foi só mais recentemente que sentiu que precisava ampliar o significado do que apresentava às crianças. “Tive uma fase que fiquei me questionando: qual é a minha importância como professora, qual é o papel da língua inglesa na vida dessas crianças? Se eu não estivesse aqui, faria falta?”, lembra-se ela, que há 11 anos trabalha na rede municipal de Jundiaí, interior de São Paulo, com alunos do ensino fundamental 1.
Foi assim que começou a fazer projetos culturais. Primeiro com literatura, depois com música. Arabelle elaborou uma sequência didática para o 3º ano em que adota a música “True Colors” para falar sobre o lápis cor de pele. Depois, trabalha com músicas dos Beatles. “Essas sequências e os projetos têm um objetivo de trabalhar uma questão social, histórica ou cultural. Tenho essa visão de que meu papel é muito maior do que só ensinar a língua”, afirma.
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As músicas não entram sozinhas nas aulas de Arabelle. O livro “Cor de Coraline” também amplia as possibilidades de reflexão sobre a cor da pele das pessoas. As músicas dos Beatles vêm acompanhadas de documentários, trechos de filmes e livros que contam um pouco do contexto da época, da segregação nos Estados Unidos, das histórias de Rosa Parks e Martin Luther King. Dessa forma, o inglês contribui para o desenvolvimento pleno do aluno.
“Já fiz um projeto de hip hop junto com a professora de educação física. Os que escolheram o estilo e eu, como não conhecia muito, fui pesquisar. Estudamos a história, os principais nomes; convidamos dançarinos e grafiteiros para a escola”, relembra.
Conheça o projeto da professora Arabelle Calciolari premiado no Educador Nota 10
Além de integrar várias áreas do conhecimento, as músicas em inglês podem apoiar um processo de integração da escola inteira. Durante a pandemia, o Sistema de Ensino Energia, de Florianópolis (SC), passou a organizar shows de talentos mensais, ao vivo no YouTube. Todos alunos e famílias eram convidados a participar se apresentando ou apenas assistindo. De forma natural, o inglês começou a se destacar.
“A gente percebeu, de uma maneira muito forte, que as crianças estavam tocando e cantando músicas em inglês. Aí decidimos aliar a noite de talentos com o foco no inglês”, conta Karine da Luz, coordenadora da educação infantil e ensino fundamental 1.
Aproveitando o interesse e o conhecimento dos próprios estudantes, em outubro o colégio fez em outubro um evento temático sobre Halloween. “Foi um momento cultural que inclui desde a educação infantil. Cada turma fez algo para apresentar. Uma vez vídeos de culinária macabra, outra fez uma recriação do trailer de ‘Thriller’, do Michael Jackson”, cita Karine. Dessa forma, a música foi inserida dentro de uma lógica cultural, multidisciplinar e agregadora.
Para que a música seja uma forma descontraída de aprendizado, mas que ela não fique limitada à diversão, Jucymar Boccazio, mentora do Edify, diz que a palavra-chave é planejamento. “A música é uma ferramenta pedagógica importante para potencializar e promover aprendizados. Mas não se for uma ação isolada. É preciso haver intencionalidade – saber o que eu quero desenvolver nos meus alunos – assim como planejamento”, afirma.
Jucymar ressalta ainda que a música proporciona tanto atividades individuais quanto coletivas. No primeiro caso, elas fortalecem a compreensão auditiva e trabalham a pronúncia. As atividades em grupo podem incluir pesquisa, dramatização e transformação da obra. “Elas promovem uma série de habilidades socioemocionais, como saber ouvir, respeitar as diferenças, ter gosto por aprender”, diz.
Ainda que seja uma estratégia lúdica, o trabalho com música deve sempre ser acompanhado e avaliado. “Aqui, a autoavaliação também é muito relevante. Se conhece os objetivos, o aluno ganha o senso de progresso, percebe que já estende palavras, o sentido delas e aplica expressões idiomáticas em outros contextos. Tudo isso faz com que conquiste a autoconfiança”, explica Jucymar.
* A professora Arabelle Calciolari é convidada do próximo evento Edify hub – Aprendizagem de línguas nas escolas. Inscreva-se