‘Não existe o saber fragmentado, ele é um só’
Para Ruy Cézar Espírito Santo, especialista em formação de professores, a separação por disciplinas é falta de conhecimento
por Fernanda Kalena 20 de março de 2014
A física quântica está aí e deixa uma importante lição para a educação: assim como o universo é formado por átomos que, por sua vez, são formados por energias que se interconectam, quando se trata de conhecimento, não existe saber fragmentado. Para Ruy Cézar Espírito Santo, do curso de pedagogia da PUC-SP, no momento em que o ser humano desenvolve o grande conhecimento de si mesmo, ele percebe que o saber é uma unidade – e isso impacta na escola. “A separação de disciplinas escolares por conteúdos isolados, é fruto da ignorância dessa realidade, no sentido do não saber mesmo, da falta de conhecimento”, afirma o especialista em formação de professores.
De acordo com Espírito Santo, o grande desafio para o educador não é levar o conteúdo aos alunos, mas sim mostrar para eles que o que está sendo estudado faz parte de uma unidade. “Os alunos têm que perceber que o que é levado para a sala de aula faz parte de um contexto maior.” Assim, o educador não se diz contra aos programas pedagógicos serem divididos por disciplinas, mas aponta que o maior problema é a falta de relação e conexão entre elas e com o que acontece nas outras esferas da vida.
“Os professores têm que falar em classe sobre o avião que derrubou aquele edifício em Nova York ou mesmo sobre coisas mais próximas. Por exemplo, caso o pai de um aluno faleça, os educadores têm que falar da morte. Com isso, os alunos percebem que a escola está ligada aos acontecimentos, está ligada aquilo que se passa no mundo”, cita o professor, que participou ontem, em São Paulo, da conferência Educação do Futuro, onde palestrou sobre os desafios na formação de professores.
Formar professores, aliás, é o primeiro passo de uma trajetória que tem como objetivo melhorar a qualidade da educação. “Como é que vai acontecer alguma mudança se o professor não estiver preparado para ela? Não adianta colocá-lo dentro de uma escola como a Escola da Ponte [experiência portuguesa que aboliu séries e salas de aula e passou a basear os conteúdos nos interesses dos alunos], se ele não estiver formado para isso, ele não vai saber como realizar o seu trabalho”, questiona.
Para Espírito Santo, as escolas precisam romper com o aprendizado baseado em prova e nota, se quiserem entrar no caminho da interdisciplinaridade. “Paulo Freire chamava esse modelo de escola bancária. É isso o que definitivamente precisa acabar.” Para tanto, o que precisa mudar é o foco do que é avaliado. “Quando se ensina um conteúdo, o professor tem que perguntar ao aluno coisas como: o que ele aprendeu com isso, o que mais gostou, o que foi mais difícil, qual é a dúvida que fica. E não fazer perguntas de certo e errado”, sugere.
Um exercício que ele conta que costuma a fazer com seus próprios alunos é passar um filme e procurar identificar o aluno com a essência da história. “Não é para ninguém fazer resumo, a ideia é instigar o aluno”. Um que ele recomenda pela boa discussão que proporciona é O Ativista Quântico, de Amit Goswami. “Levanto o debate com questões como: em que medida você viveu a ligação do ser com o fazer? Você tem sido prisioneiro só do fazer? Faço perguntas que fazem o aluno entrar na história e não só falar do filme. É falar dele dentro da perspectiva do filme”.
E é assim, com um trabalho de formiga que o educador acredita que a educação pode ser transformada e melhorada. “Acredito profundamente nas inovações, mas temos que entender que as mudanças não se dão com um estalar de dedos, é um processo. Temos que lutar, criar situações novas, iniciar fases novas, pois quando você inicia uma mudança, possibilita que ela seja reproduzida e se irradie.”