PERA: uma ferramenta de planejamento de experiências remotas de aprendizagem
Como professores e gestores podem pensar em novas atividades para os estudantes no período de quarentena
por Adriana Costa Teixeira / Ana Paula Gaspar 20 de abril de 2020
Diante do cenário de fechamento das escolas por conta do coronavírus (COVID-19), fomos ágeis em começar a listar ferramentas e alternativas para tentar diminuir o impacto das ações de isolamento social na educação. No entanto, na tentativa de chamar a atenção para a especificidade do tema, um grupo de designers e educadoras se juntou para propor uma ferramenta de planejamento de experiências e ter uma visão mais sistêmica e contextualizada da situação complexa na qual estamos envolvidos.
Após montar um plano de contingência, gestores e professores das escolas que estão fechadas começaram a pensar especificamente em como deveriam ser propostas disponibilizadas para os estudantes. O que o grupo notou foi um protagonismo em pensar em recursos digitais e possibilidades, mas ainda sem considerar como todos os componentes dessa experiência se relacionam e se articulam para que as atividades sejam viáveis para todos os envolvidos.
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Baseado no pensamento do design que pressupõe empatia, colaboração e experimentação, as designers e educadoras Ana Paula Gaspar e Adriana Costa propuseram a PERA (Planejamento de Experiências Remotas de Aprendizagem). Trata-se de uma ferramenta de planejamento para ajudar professores e gestores a pensarem em suas propostas de atividades para os estudantes no período de quarentena. Ela ganhou esse nome porque é uma brincadeira com a forma rápida que falamos em português “pera” de “espera!”. E também para lembrar que temos uma situação muito incomum e que precisamos lembrar desses componentes antes de sair propondo atividades. As premissas desse cenário são:
Contingência: o atual momento não obedece às condições normais de temperatura e pressão, portanto, estamos falando de ações emergenciais. Não se trata de EAD (educação a distância) ou de homeschooling (ensino domiciliar). Estas atividades não podem substituir de maneira alguma experiência escolar presencial. Da mesma forma, não podemos ficar sem fazer nada, por isso é importante criar propostas levando em consideração essas circunstâncias.
Complexidade: uma das principais circunstâncias a serem consideradas nesse modelo de planejamento é complexidade de quatro componentes: pessoas, intencionalidade pedagógica, práticas pedagógicas e tecnologia. É importante compreender a relação de interdependência entre quatro componentes para desenhar propostas que façam sentido para o momento atual. O design é a área de conhecimento que as autoras abordam para ajudar na resolução de problemas complexos.
Transformação: as autoras utilizam a expressão “Pedagogia da Contingência” para explicar um olhar para a educação necessário para enfrentar a pandemia. O que podemos aprender com este cenário de experiências remotas de aprendizagem? Tão importante quanto se esforçar para tentar assegurar situações de aprendizagens é refletir, documentar, dialogar e transformar a educação a partir das perguntas e respostas que surgirem.
Conheça cada componente da PERA e saiba como utilizar a ferramenta:
Pessoas
– Professor: é preciso saber quem é o professor e quais competências digitais os professores envolvidos na proposta possuem.
– Estudantes: o mais desafiador é adequar as propostas de acordo com a faixa etária e nível de desenvolvimento dos estudantes. Observa-se que, quanto mais jovem, menos autonomia para fazer atividades remotas os estudantes terão.
– Família: as autoras consideram as famílias como os sujeitos mais inéditos nesse processo. A importância da família na educação não é novidade, mas ela nunca esteve tão envolvida como neste cenário de pandemia. É preciso muita atenção e empatia para propor atividades remotas. Recomenda-se que haja muita escuta e diálogo para construir proposta que possam contar com o apoio das famílias de forma realista e leve.
– Gestores: é importante manter vivo o projeto pedagógico da escola. Em parceria com gestores escolares, alinhe a abordagem a ser seguida para não inventar a roda. Gestores são, geralmente, guardiões da visão pedagógica da escola e da rede de ensino. Isso quer dizer que é importante verificar se as propostas estão alinhadas com as políticas e cultura da comunidade já estabelecida antes da pandemia.
Intencionalidade pedagógica
Este não é um componente novo. As discussões da implementação da BNCC (Base Nacional Comum Curricular), por exemplo, contribuíram muito para que estivéssemos atentos para a importância de começar qualquer planejamento pelas expectativas e objetivos de aprendizagens. Na pandemia não é diferente, mas precisamos pensar o que é importante agora. Especialistas chamam a atenção para a importância de priorizar o desenvolvimento de competências socioemocionais neste momento tais como, resiliência, automotivação e autonomia. Mas também temos boas oportunidades de desenvolver competências de múltiplas áreas do conhecimento tendo em vista o currículo do agora ao oferecer às crianças diferentes situações de aprendizagem no ambiente doméstico e no mundo online.
Prática pedagógica
O ambiente online oferece inúmeras possibilidades de construção de práticas e é preciso ficar atento para não reproduzir práticas que já se mostram com pouco efetividade mesmo com as escolas abertas. Tentar ficar conectado com muitos estudantes ao vivo por muito tempo pode não ser uma boa estratégia a não ser que você seja um youtuber profissional. Por isso, pense em práticas simples e efetivas em aprendizagens. Com e sem uso de tecnologia.
Tecnologia
O componente da tecnologia tem sido muito desafiador para professores e gestores porque está revelando o impacto da enorme desigualdade social no Brasil e em várias localidades do mundo. Por isso, é importante estar atento à disponibilidade de infraestrutura e de recursos educacionais digitais na hora de planejar as experiências remotas.
Na apresentação realizada durante a live Tecnologia Educacional: sugestões para lidar com a educação online em tempos de crise, uma das autoras apresenta 4 exemplos de experiências remotas de aprendizagem que foram planejadas utilizando a PERA.
É possível baixar a ferramenta PERA e enviar comentários e sugestões para as autoras neste formulário.
Adriana Costa Teixeira
É mãe, artista, designer de serviços e designer gráfica. Há seis anos atua em projetos de inovação social utilizando a abordagem do design thinking. Trabalhou no Grupo Tellus como consultora e gerente de projetos na área da educação. Desenvolveu o projeto Aprender a Aprender cujo objetivo foi compreender como a abordagem do design dialoga com a educação. Desenhado e mediado pela equipe do projeto nasceu um laboratório com educadores de escolas públicas, onde desenvolveram soluções para seus desafios. Foi consultora no projeto Smart Schools, parceria público-privada que envolveu a Secretaria, Diretoria de Ensino e cinco escolas estaduais. Os aprendizados do projeto culminaram no modelo de experiência de aprendizagem em que os educadores desenharam uma aula inovadora com auxílio de tutorias. Atualmente apoia projetos na Futurar, coletivo de designers de serviço. Além de viver a maternidade, empreende na Amô, com trabalhos em cerâmica.
Ana Paula Gaspar
Licenciada em História pela UFMG, mestre em Design pelo C.E.S.A.R e com MBA em Comunicação Digital, Ana Paula atuou durante seis anos com educação em museus e empreendedorismo digital, no Brasil e em organizações dos Estados Unidos e da Inglaterra. Mineira de Belo Horizonte, ajudou a criar uma escola inovadora bilíngue e baseada em projetos, coordenando a área de tecnologia aplicada. Nos últimos anos vem atuando com inovação em educação, design de serviços e políticas públicas de implantação de tecnologia no Brasil e na docência no ensino superior em cursos de pós-graduação de metodologias ativas. É assessora de tecnologia educacional na Escola Vera Cruz, em São Paulo.