Projeto de artes resgata a memória de rio no entorno de escola quilombola
Professoras de João Pessoa (PB) criam atividade que usa produções textuais e danças para ressaltar a importância de rio e de quilombo para comunidade
por Amanda Omar / Virna Lopes 22 de novembro de 2017
Somos uma escola quilombola de João Pessoa (PB). No segundo bimestre de 2016, queríamos conhecer melhor a comunidade na qual a Escola Municipal Antônia do Socorro Silva Machado está inserida. Para interagir com o entorno, começamos a desenvolver um trabalho sobre o Rio de Padre. Com grande importância para o bairro e uma história de resistência em relação à poluição, o rio representa um lugar de memória e saberes do Quilombo Paratibe.
Iniciamos o projeto conhecendo a sua história e suas contribuições para economia da comunidade. Tratamos de assuntos como como a poluição, as profissões ligadas ao rio, os danos à fauna e flora vindo do desmatamento de áreas próximas e a degradação do rio. Para isso, utilizamos vídeos educativos e atividades de produção de texto, criação de imagens e debates em sala.
Em seguida, foi criado um mural com lixo recolhido pelos alunos no pátio da escola. Com um material que poderia poluir o rio, eles tentaram contextualizar corporalmente o debate sobre a poluição.
Paralelamente a isso, organizamos uma visita ao rio, contando com a participação da líder comunitária Joseane e de algumas mães de alunas, que estiveram presentes para colaborar com a atividade. Eles ajudaram tanto no trajeto, como também na apresentação de questões históricas relacionadas ao local e aos costumes da comunidade que vive no seu entorno.
Após a saída, os alunos puderam expressar os resultados dessa aprendizagem com produções textuais e com uma coreografia de dança. Eles compartilharam com as demais turmas um pouco do conhecimento vivenciado, trabalhando a interpretação textual e expressão corporal a partir da música “Xote Ecológico”, de Luiz Gonzaga.
A performance foi apresentada pelas crianças quilombolas na culminância bimestral do projeto “Raízes e Saberes Quilombolas”. Essas produções, bem como o desenvolvimento deste trabalho, exaltaram a história do quilombola de Paratibe, proporcionando a interação entre a comunidade e a escola, o que estimulou o sentimento de pertencimento.
De forma processual, partimos da contação de história sobre a descoberta do Rio do Padre, momento em que se buscou situar os alunos acerca da memória destes antepassados. Também foi mencionado o uso da água, a ação de organizações sociais comunitárias e a sua importância para territorialidade do quilombola e não-quilombola de Paratibe.
O despertar da curiosidade das crianças em torno da temática foi perceptível. O eixo central desse projeto foi trabalhar a importância delas se tornarem conhecedoras da história de seu território e de sua territorialidade, através de práticas que permitissem a percepção da luta de seus antepassados e a valorização de sua comunidade, assim como dos personagens emblemáticos que contribuíram para a formação das comunidades circo vizinhas, acreditando que a ressignificação contribui para a construção da identidade e a melhoria da autoestima.
O povo quilombola e seus remanescentes são afirmações vivas da resistência e da luta de um povo aguerrido do espírito de energia vital. Sua história é arraigada na estigmatização social, na negação de seus direitos e por consequência de sua própria identidade.
Alguns avanços foram alcançados por meio de movimentos sociais em diversas frentes, no entanto muito ainda há por galgar em direção à cidadania e ao respeito à diversidade. Acreditamos que a escola é instrumento fundamental desta construção, não podendo silenciar, nem negligenciar as peculiaridades das comunidades tradicionais. Isso ocorrerá com base num currículo multicultural e descolonizador, que proporciona o conhecimento e a valorização de todas as culturas que perpassam nossa civilização.
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Amanda Omar
Professora de teatro no município de João Pessoa (PB). Graduada em artes cênicas, especialista em educação especial e mestranda em artes com tema: identidade quilombola.
Virna Lopes
Professora pedagoga nos anos iniciais do ensino fundamental, no município de João Pessoa. Atua no ciclo de alfabetização com atividades interativas e transdisciplinares.