‘Sem líderes capacitados não vamos melhorar o sistema’
Debate sobre a formação de lideranças escolares na Inglaterra propõe reflexões para a gestão escolar brasileira
por Marina Lopes 11 de junho de 2015
“A liderança escolar só fica atrás da qualidade do ensino na sala de aula.” O inglês Andy Reid, consultor educacional, é categórico ao afirmar que os sistemas educacionais com melhor desempenho no mundo tendem a ser aqueles que conferem maior autonomia para as escolas. Dentro dessa perspectiva, o ex-diretor do Ofsted (sigla em inglês para Escritório de Padrões na Educação), organização responsável por inspecionar a qualidade do ensino na Inglaterra, considera que um líder exerce grande influência no funcionamento de uma escola.
Ao lado de outros especialistas e gestores educacionais, nesta quinta-feira (11), Reid participou do debate “Formação de lideranças escolares na Inglaterra: reflexões para o Brasil”, promovido pela Fundação Itaú Social em parceria com o Conselho Britânico, em São Paulo (SP). Durante o evento, o consultor apresentou a experiência do desenvolvimento de lideranças escolares na Inglaterra e abriu caminho para discussões sobre oportunidades que poderiam ser aplicadas ao contexto brasileiro.
“Na Inglaterra as escolas têm muita autonomia quando comparado a outros sistemas no mundo”, destacou Reid. Nos últimos 30 anos, o país realizou uma reforma no seu sistema educacional, passando desde a definição de um currículo nacional até o investimento no fortalecimento de estratégias de lideranças escolares. Desde então, passou a garantir mais flexibilidade para que as escolas sejam responsáveis pela forma como operam, transformando o diretor em um líder com liberdade para delegar tarefas administrativas e tomar decisões, como o número de professores contratados e a realização de alterações no prédio da escola.
Ao mesmo tempo em que existe muita autonomia, as escolas inglesas precisam seguir muitas exigências estatutárias. Uma delas está relacionada à inspeção realizada pelo Ofsted, onde são avaliadas pela qualidade do ensino, a liderança, o comportamento e segurança dos alunos, entre outros. Para cada item avaliado, os inspetores atribuem notas – excelente, bom, requer melhoria ou inadequado. Segundo Reid, existem apenas quatro notas porque não é possível estar na média. Ou a escola alcança um resultado satisfatório, ou ela requer melhoria.
Dentro desse sistema, as escolas com melhores notas trabalham em conjunto com as que apresentam dificuldades. “As escolas no nosso sistema têm dois trabalhos: elas precisam competir umas com as outras pelos alunos, mas por outro lado também colaboram entre si na medida em que desenvolvem o sistema juntas”, explicou o consultor Adrian Ingham, pesquisador e ex-diretor da West Drayton Primary School, em Londres.
Segundo Ingham, o papel do gestor é o de se perguntar o que fazer para melhorar as coisas. “Sem líderes capacitados não vamos melhorar o sistema”, afirmou. “Líderes sem resultados efetivos acabam sendo substituídos”, disse o consultor, ao mencionar que uma escola que permanece por muito tempo com resultado insatisfatório é fechada para reabrir com uma nova equipe.
“O que interessa no final das contas é que esse aluno aprenda. E fracasso não é tolerado. Todos alunos precisam aprender e têm o direito a uma educação de qualidade”, explicou a pesquisadora brasileira Maria Carolina Nogueira, coautora da pesquisa “O Sistema de Formação de Lideranças Escolares na Inglaterra: possíveis alternativas para o Brasil”, desenvolvida junto com Ingham e lançada durante o evento.
Caminhos para o Brasil
Os exemplos apresentados pelo desenvolvimento de lideranças na Inglaterra abrem espaço para discussões sobre o que o Brasil pode aprender com esse modelo. “Eles estão tentando montar diferentes estruturas e propostas que atendem cada vez mais as comunidades e os diferentes públicos que formam as redes de ensino”, destacou a secretária de Educação do Estado de Mato Grosso do Sul, Maria Cecília Amendola da Motta, representante da frente de gestão escolar do Conselho Nacional de Secretários de Educação.
Uma das questões destacadas pelos gestores e especialistas presentes no evento é que o processo de responsabilização das escolas tende a melhorar a qualidade do sistema, ao passo que confere maior autonomia para que as unidades escolares trabalhem de acordo com as suas necessidades. “Na medida em que o diretor e os professores se responsabilizam pelo processo, o problema passa a não ser apenas do gestor, que seriam as secretarias. Ele passa a ser de todos nós”, afirmou João Roberto Costa de Souza, secretário de Educação de Jacareí (SP).
Outro ponto que pode ser observado é a padronização na formação e seleção de líderes na Inglaterra. Enquanto no Brasil existem diferentes tipos de escolhas para diretores, que vão da indicação direta ao concurso público, no sistema inglês existe um plano de carreira, onde o professor com aptidão para liderança começa na sala de aula, vai para um nível intermediário, sênior e, somente depois, para a diretoria. “Nós temos estados [no Brasil] em que [um funcionário do setor] administrativo pode ser diretor de escola sem nunca ter assumido uma sala de aula”, contrapôs a secretária de Educação de Mato Grosso do Sul.