Transformar 2017: inovação na escola precisa do envolvimento do estudante
Educadores do Brasil e do exterior destacaram em evento em São Paulo os benefícios do protagonismo estudantil nas práticas pedagógicas
por Vinícius de Oliveira 4 de abril de 2017
O que começou como um bate-papo informal logo se tornou um raio-X sobre a situação de muitas escolas brasileiras. Ana Clara Nunes,14, Arthur Rezende, 16, Cecília Azevedo, 16, Débora Pessoa, 18, e Derivaldo Jr., 19, abriram o Transformar 2017, maior evento sobre inovação em educação do país, com relatos sobre suas realidades: carência de laboratórios e acesso à tecnologia, escolas mais parecidas com prisões, e que ainda recebem alunos em salas de aulas quentes e com cadeiras desconfortáveis. Realizado nesta terça-feira (4) em São Paulo (SP), o evento é organizado pelo Instituto Inspirare/Porvir, Fundação Lemann e Instituto Península, e convidou, pela primeira vez, alunos das cinco regiões brasileiras para abrir a programação.
A fala dos estudantes, no entanto, deixou claro que os jovens querem mais do que uma infraestrutura melhor, mas desejam um ensino conectado com o mundo no século 21, atividades práticas, interação com a comunidade e participação nas instâncias de decisão da escola, como mostram as pesquisas Nossa Escola em (Re)Construção e Manifesto Voz do Jovem, cujos resultados foram apresentados por eles. Ao final do painel, fizeram o convite “Nós estamos preparados para a mudança, e vocês?”. Foi a deixa para a sequência do evento, que trouxe experiências de sucesso em sala de aula tanto no Brasil quanto do exterior. Em comum, todas colocam o estudante como protagonista de seu aprendizado, com maior ou menor grau de adoção de tecnologia.
10 vezes que Transformar mostrou a importância de olhar para os estudantes
Isso ficou claro desde a fala de Helen Walsh e Rachel Weiss, do Seattle Public School Disctricts (EUA), e de Willman Costa, do Colégio Estadual Chico Anysio, no Rio de Janeiro, que dividiram o palco no painel “É possível desenvolver competências para o século 21 na escola”. Na rede dos EUA, foi colocado em prática um programa que promove o autoconhecimento do estudante, que resulta em intervenções personalizadas dos professores para ajudá-los a lidar com suas emoções. No Rio, Willman Costa usa os conhecimentos dos próprios alunos para mudar as avaliações, que ganham letras de funk (“Quem disse que a escola tinha quer ser difícil?”), e promove sessões de aconselhamento para alertar jovens para os riscos das drogas. “A gente não está preocupado com o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), mas em formar cidadãos. Sempre digo que o gênio que não sabe lidar com as pessoas ficará desempregado”. Como resultado de seu trabalho, a escola registra evasão zero e tem mais da metade dos alunos ingressando em universidades públicas.
Acreditar nos alunos é a recomendação de Michael de Souza, diretor da escola de design Leadership Public Schools, na Califórnia, para que eles sejam bem sucedidos. “Nenhuma inovação funciona se não acreditarmos que todas as crianças são maravilhosas e capazes de qualquer coisa”. Para o educador, que é o primeiro da família com curso superior, é preciso valorizar autoestima dos alunos e dizer constantemente a eles que podem e devem ir para a faculdade. Segundo ele, em sua escola, professores e funcionários procuram manter um diálogo e uma relação próxima com os alunos.
Jill Lizier, professora da Swasey Central School, no estado de New Hampshire, que participou do painel “Prêmios, brincadeiras, portfólios: novas formas de avaliar a aprendizagem”, acredita que para engajar seus alunos é preciso conectar os aprendizados com a vida real. Ela mostrou como criou avaliações significativas, nas quais apresenta desafios com propósito para estudantes demonstrarem suas competências cognitivas e socioemocionais.
Envolver alunos em atividades práticas também é a filosofia da High Tech High, rede de escolas charter (públicas com administração privada) localizada na Califórnia (EUA). Tim McNamara, diretor da unidade de Chula Vista, e responsável por criar projetos de curso em esquetes teatrais, jornalismo, tradução de poesia e design de jogos, trouxe a mensagem para inspirar aqueles que ainda estão dando os primeiros passos na metodologia de projeto. “Sempre que você puder deixar o aluno assumir a liderança, deixe!”, disse.
Da Green School, escola localizada em Bali, na Indonésia, a professora de inglês, dramaturgia e yoga Nicola Unite, trouxe o recado de que uma educação sustentável é aquela que alimenta a consciência interior. No Transformar, ela dividiu o palco “Escolas sustentáveis que educam para a sustentabilidade” com o diretor Valnei Alexandre, do Colégio Estadual Erich Walter Heine, no Rio de Janeiro (RJ), primeira escola da América Latina a receber “selo verde”. “Educar para a sustentabilidade precisa de um modelo que analisa o aluno de forma integral”, ressaltou Nicola.
Por outro lado, o sucesso escolar dos estudantes depende de altas expectativas que professores e diretores têm a respeito deles, como lembrou Nicholas Kim (leia entrevista com ele no Porvir) , diretor executivo da unidade Tahoma da rede de escolas charter Summit Public Schools, da Califórnia, durante a palestra final do Transformar 2017. Em uma fala que se conecta com o espírito dos jovens que se veem parte da solução e não dos problemas na educação, Kim disse: “Se a gente der autonomia para as pessoas atingirem suas metas, coisas incríveis vão acontecer”.