Troca de laboratório de informática por espaço criativo demanda mais que dinheiro
A 7ª edição do Conecte-C discutiu como criar ambientes que estimulem a adoção de novas práticas pedagógicas
por Vinícius de Oliveira 2 de abril de 2017
O avanço das práticas mão na massa nas escolas tende a deixar os laboratórios de informática obsoletos, mas a transformação da sala com computadores fixos em um espaço que estimula a criatividade e o trabalho colaborativo ainda deve demorar a acontecer em larga escala. Da formação docente à melhoria da infraestrutura, passando por novas regras de compra de suprimentos e a necessidade de adoção de recursos abertos, são muitos os desafios que gestores públicos terão que enfrentar, segundo as discussões ocorridas no Conecte-C, série de encontros promovido pelo CIEB (Centro de Inovação para a Educação Brasileira) que reúne diferentes atores do ambiente de educação.
– Conheça os guias Tecnologia na Educação e Mão na Massa
Na última quinta-feira (30), Regina Gavassa, coordenadora de informática educativa da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, fez uma linha do tempo da adoção de computadores na rede, que teve as primeiras experiências em 1987, mas só em 1994 viu surgir os laboratórios de informática. Atualmente, com alunos o tempo todo conectados por meio de dispositivos móveis, a rede busca maneiras para se adaptar. “Toda criança nasce inventora, e agora se discute como manter esse espírito criativo sem podá-lo ao longo dos anos”, disse Regina.
No entanto, a representante da secretaria reconhece que a onda maker trouxe dúvidas entre educadores sobre a necessidade de aquisição de tecnologias e espaços. Pela experiência com o mundo dos laboratórios, ela prefere adotar cautela. “Atuei em laboratórios de informática por 15 anos, acompanhei sua evolução e, por estar na secretaria, fico muito próxima ao professor. Não dava para fazer nada sem antes entender que rede é essa e o que os professores fazem de fato”, conta. A secretaria realizou um evento para identificar as práticas e descobriu que muitos professores já desenvolvem atividades mão na massa, mas encontram barreiras no atual formato de laboratório. “Alguns professores acabam não mudando suas práticas por causa do equipamento que ele tem à disposição. Outros dizem que o espaço não serve mais para a ideia que estão trabalhando”.
Em 2015, a rede começou a trabalhar com gamificação, programação e robótica, que desencadeou outros projetos de autoria de professores e alunos. “As formações foram mão na massa de fato. Para gamificação, criamos uma estrutura colaborativa com todas as regionais que levou professores a jogarem para entender quais são os elementos que constroem o jogo”, descreve. A partir dessas discussões, começou-se a pensar na reformatação do espaço. Segundo ela, algumas escolas já puxaram as mesas que antes ficavam fixas perto da parede. “Esse espaço precisa permitir que o imaginar, o construir, o errar, o testar e o aperfeiçoar. Ter só o computador e ficar sentado diante dele não permitirá que isso aconteça”, concluiu.
Eduardo Paiva, que trabalha na coordenação de tecnologia da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, apresentou os desafios para que os novos laboratórios sejam criados e também consigam atender à demanda de recursos para os projetos:
1) Como fazer compras públicas de qualidade obedecendo regras de pregão por menor preço;
2) Como criar projetos sustentáveis para evitar o sucateamento e gastos desnecessários – o que exige a aproximação das áreas técnicas e pedagógica, além da descentralização dos processos de compra;
3) Escalar iniciativas para que as melhores práticas consigam alcançar toda a rede.
Com experiência no relacionamento com escolas privadas, Marcelo Lopes, coordenador de tecnologia educacional da empresa Foreducation EdTech, lembrou que as curvas de investimento e utilização de tecnologia são sempre muito distantes porque, de modo geral, a educação brasileira sempre teve foco na aquisição de equipamentos. “Coloca-se lousa eletrônica, datashow e tablet, mas isso não mudou nada na educação”, disse.
Da mesma forma, alertou que o trabalho de criação de espaços criativos em escolas, para o qual tem feito consultoria, demanda mudanças de comportamento e preparação da parte pedagógica. Para Lopes, “espaços falam” e a obsolescência fica evidente quando se compara a sala de aula atual com as empresas de tecnologia, que no futuro podem empregar as crianças de hoje. Enquanto a primeira ainda pede que se olhe para frente e seja mantido o silêncio, os espaços de trabalho já possuem um ambiente mais aberto e propício à colaboração.
A Weducation levou ao Google uma proposta para reproduzir os princípios desses espaços em escolas, o que foi aceito. Segundo Lopes, alunos relatam que a simples existência de pufes no ambiente impacta na relação com o professor. “Desde uma roda para discutir filosofia até aula de yoga. As pessoas sabiam que ali não dariam palestra, iriam trabalhar a interação e a colaboração”. Tais opiniões vão ao encontro dos resultados da pesquisa Nossa Escola em (Re)Construção, realizada pelo Porvir, que no ano passado ouviu 132 mil jovens para ouvir o que eles pensam da educação e como seria a escola de seus sonhos. Entre outras características, ela tinha justamente que ter espaços flexíveis para aprendizagem.