Como reforçar a educação para a democracia em sala de aula? - PORVIR
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Inovações em Educação

Como reforçar a educação para a democracia em sala de aula?

Seja em período eleitoral ou não, incluir a educação para a democracia no currículo pode não ser simples, mas é necessário

Parceria com Educamídia

por Ruam Oliveira ilustração relógio 31 de maio de 2022

A palavra “Eleições” pode suscitar reações diversas. Seja em ano eleitoral ou fora dele, tratar sobre esta temática requer, antes de tudo, que haja preparação, tanto em níveis de planejamento, quanto no quesito formação. 

O assunto pode ser espinhoso, ainda mais levando em consideração que, em muitos casos, pode incorrer em certa polarização. Este é, na verdade, um dos motivos pelos quais é importante levar o tema para a sala de aula, a fim de desvinculá-lo de uma questão simplesmente partidária. 

Em 2022, o Brasil fará eleições que escolherão integrantes de casas legislativas estaduais e federal, além de governos estaduais e quem ocupará a Presidência da República pelos próximos quatro anos. Ao trazer o assunto para a sala de aula, o educador ou educadora não fará uma amostra sobre candidatos x, y ou z, mas sim a respeito do que cada cargo exige e o impacto de suas decisões, por exemplo. 

“O primeiro caminho é separar o que é política partidária do que é a educação para a democracia”, comenta Patrícia Blanco, presidente-executiva do Instituto Palavra Aberta. Essa divisão é importante porque questões ideológicas e partidárias, por exemplo, são assuntos que estão além do que se entende por educação para a democracia. 

O termo diz respeito a dar um passo atrás para compreender os processos democráticos, explica Patrícia. Trata-se de desvendar questões como: Qual a origem da democracia? De que forma ela está pautada nos poderes constituídos? Qual a importância dos três poderes?, entre outros. 

Há também a chance de abordar o tema olhando propriamente para o processo eleitoral, de que forma ele é conduzido e quem é responsável por ele. 

Patrícia também sugere que uma estratégia para trabalhar o tema na aula é falar sobre as funções de cada cargo. O que faz um deputado ou presidente?, por exemplo, podem ser perguntas disparadoras. 

Na sala de aula

É comum ler notícias sobre professores que são gravados em aula sendo acusados de “doutrinação” quando entraram nos assuntos políticos. Sofrer acusações ou ter sua imagem veiculada negativamente em jornais e redes sociais pode ser um motivo de inibição de docentes na hora de abordar  o tema. Isto também evidencia a importância de focar na educação para a democracia, como explicou Patrícia, em vez  de apenas se ater a questões partidárias. 

Recentemente, o Instituto Palavra Aberta estabeleceu uma parceria com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para combater a desinformação, que é uma das fontes para gerar atritos e desentendimentos nessa área. O resultado é o projeto #FaketoFora – quem vota se informa.

“Tivemos uma demonização do debate político devido a questão partidária. O educador se viu desincentivado a tratar desse assunto com receio de ser acusado de puxar para A ou para B, sendo que a gente ainda precisa avançar muito nessa discussão do que é democracia, do que é cidadania, quais são os direitos e deveres do cidadão ou até onde vai a minha liberdade e meus direitos em relação a minha participação enquanto cidadão”, afirma Patrícia. 

Polianna Pereira dos Santos, assessora chefe da Escola Judiciária Eleitoral, do TSE, aponta que uma estratégia para fugir da polarização é investir com os estudantes em questões como participação, poder de voto e esclarecimento sobre os critérios de escolha que dizem respeito a cada um enquanto cidadãs e cidadãos. 

Inclusive, para auxiliar os professores nesta temática, a Justiça Eleitoral tem desenvolvido materiais de apoio pensados diretamente para a sala de aula, como é o caso do Programa Eleitor do Futuro, promovido pela EJE-DF (Escola Judiciária Eleitoral do Distrito Federal), voltado a escolas públicas e particulares da região. Outra ação mais ampla é o WhatsApp do TSE, no qual qualquer cidadão pode tirar dúvidas sobre o processo eleitoral.

Cidadania mirim

A professora Karina Letícia Pinto, da Escola Estadual José Ferreira Maia, localizada em Timóteo (MG), conta que o desafio de inserir a educação democrática na escola se dá, também, devido à intolerância presente na sociedade. “Quando falamos em democracia, em dar voz e ouvir vozes diferentes das nossas, isso causa incômodos e pode gerar conflitos”, comenta. 

Karina foi vencedora do Prêmio Professor Transformador com um projeto chamado “Câmara Mirim”, no qual trabalhou o respeito aos valores democráticos com sua turma do ensino fundamental 1 usando jogos, debates e rodas de conversa. Ela foi premiada durante a Bett Brasil 2022.

“Foi uma experiência marcante para os alunos. Nós iniciamos com um estudo do poder legislativo na esfera municipal da nossa cidade até chegar à esfera federal. Nós fizemos reflexões, rodas de conversa, fizemos campanha eleitoral para líder da turma, entre outras ações”, relembra Karina. A campanha para o líder da turma contou até mesmo com uma cerimônia de posse e orientações a respeito do cargo, quais ações deveriam ser feitas pelo escolhido e que tivessem o objetivo de melhorar a escola. 

Com o projeto, a professora também levou seus estudantes para uma entrevista com o prefeito da cidade, conversar com vereadores e também uma visita guiada à Câmara Municipal, onde fizeram a simulação de como se vota uma lei na cidade. 

Foi uma experiência de imersão. Os estudantes também visitaram o Congresso Nacional, vivendo um dia de “deputados” mirins. “Eles analisaram um um projeto de lei que a gente havia estudado na escola, fizeram argumentos para  defender a proposta e participaram depois da votação no plenário Ulysses Guimarães”, conta a professora.

Essa ação também resultou em um diálogo maior com as próprias famílias dos estudantes. Karina relata que muitos alunos passaram a tirar  dúvidas dos pais quando o assunto era o funcionamento dos cargos e da própria democracia. 

Política com P maiúsculo

A presidente-executiva do Palavra Aberta comenta que é preciso resgatar a noção de que política não é algo associado apenas aos partidos. “É explicar que a atuação de qualquer um de nós na no ambiente democrático é uma atuação política.

Ela destaca que a educação exige essa conversa com os estudantes. Isso porque não é mais possível que o professor fale e o aluno apenas escute: a interação e a participação democrática é fundamental. 

Esse diálogo pode ter como fonte a realidade na qual o estudante está inserido. Ouvir as dúvidas desses jovens também faz parte de uma educação para a democracia. “Muito do que a gente tem visto é que o jovem fica totalmente desconectado da política, e só é chamado no período eleitoral”, comenta. 

Patrícia se lembra de que alguns relatos colhidos na plataforma #FakeToFora ainda mostram que muitos adolescentes, convidados a tirar o título de eleitor, não compreendem para que serve o voto ou porque é importante votar. 

O #FakeToFora, promovido pelo EducaMídia, é uma plataforma de combate à desinformação e que reúne ferramentas pedagógicas para que o educador se forme e se informe e, assim, possa planejar uma aula mais elaborada e com embasamento. 

Patrícia considera o momento atual como crucial para tratar do assunto, principalmente devido às tentativas de descredibilizar instituições e de enfraquecimento da democracia.

Combate à desinformação

No centro deste assunto, o combate à desinformação desempenha papel fundamental na educação para a democracia. Incentivar os estudantes a ter um olhar crítico, interpretar corretamente as notícias e fazer checagem de informações faz a diferença e são ações que podem ser contempladas no planejamento de aula. 

“A internet é um mar de assuntos, de vozes, de opiniões que estão sendo colocadas. [É importante perguntar ao aluno]: você checou a fonte? Verificou se aquela informação é verídica ou não? Foi atrás de mais informações? Tem mais alguém falando sobre isso?”, diz Patrícia. “É entender que nesse ambiente de informação, onde todos têm poder de publicação, é preciso interpretar corretamente essa informação e o papel dos veículos de comunicação”, conclui.

O EducaMídia lançou recentemente um material de apoio com contribuições da educação midiática para a democracia. 

5 contribuições da educação midiática para a democracia

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competências para o século 21, ensino médio

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