Educação para cidadania global precisa ir além do conteúdo
Seminário Internacional discute como os sistemas precisam se adaptar para formar indivíduos capazes de transformar o mundo
por Vinícius de Oliveira 13 de maio de 2016
A necessidade de repensar valores, habilidades e atitudes para enfrentar as questões sociais, políticas, culturais, econômicas e ambientais do século 21 mostram que o modelo atual de educação precisa mudar. Para Unesco, agência da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, o conjunto de novas atitudes atende pelo nome de “Educação para a Cidadania Global”, que coloca o indivíduo como integrantes da comunidade internacional. Nesse contexto, transmitir conhecimento não o suficiente e colaboração passa a ser a chave para resolução de problemas dentro e fora da sala de aula.
Download: Estudo Unesco – Educação para a cidadania global (PDF)
No “Seminário Internacional Educação para a Cidadania Global”, promovido na última quinta-feira (12) pela Fundação Santillana, a Unesco e o jornal espanhol EL PAÍS, em São Paulo, foram discutidas novas maneiras para desenvolver competências com poder de transformação. Cecilia Barbieri, especialista da Unesco para América Latina e o Caribe, mostrou que, apesar dos progressos no acesso desde a infância até a educação primária, a qualidade da educação na América Latina ainda compromete o desempenho dos alunos e impede que os índices tenham a melhora esperada.
“Educação de qualidade é muito mais que aprender e ter boas notas na escola. Não se trata apenas de dominar competências, mas também pôr em prática o respeito à vida e à dignidade humana, o que é essencial em uma sociedade preocupada em promover a diversidade, a justiça social e a inclusão”, disse. Para a Unesco, o conceito de qualidade atende a cinco dimensões: relevância (adaptação às necessidades da sociedade), pertinência (adaptação às necessidades de aprendizagem dos estudantes), efetividade (cumprimento dos objetivos de desenvolvimento e aprendizado), eficiência (bom uso de de recursos humanos, financeiros e de equipamentos) e, por último, equidade (distribuição justa de benefícios educacionais para todos os setores da sociedade).
Barbieri procurou demonstrar ainda que os recentes progressos, como na redução da pobreza, não garantem que países estejam livres de problemas relacionados ao meio ambiente, à vida social e a episódios de violência. “Tudo isso gera uma grande tensão e nós achamos que a educação é que pode preparar os indivíduos para reagirem a essas transformações. Nosso planeta se tornou muito pequeno e temos que pensar que muitas vezes os problemas não podem ser resolvidos por um só país e temos todos que colaborar”. Na busca por exemplos reais, a representante da Unesco não precisou ir longe, e mencionou a recente onda de imigrantes para a Europa em razão do conflito na Síria, o combate à fome e o aquecimento global.
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E quais seriam as características do novo modelo de ensino? Ele precisa ser adaptado ao contexto, com ênfase na aprendizagem baseada na prática, no encontro com comunidade e na colaboração. No Brasil, as medidas para atender a formação integral do aluno dependem, por exemplo, de mudanças no ensino médio. Hélio Queiroz Daher, coordenador de Políticas para a Educação Básica da Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul e representante do CONSED (Conselho Nacional de Secretários de Educação), detalhou como a Base Nacional Comum Curricular pretende tratar essas questões.
“Nós fizemos a proposta de que já no ensino médio o aluno possa se aprofundar na área em que tem mais interesse, mas para isso, a Base Nacional tem que nos dar espaço. Nós precisamos criar trajetórias flexíveis”, disse Daher. Para ele, o modelo alemão, com quatro trajetórias distintas pode não ser o ideal, uma vez que privilegia desempenho e não o interesse do aluno. “Em nenhum momento o CONSED buscou um modelo externo. Temos que aprender com o exterior e adaptar à realidade que temos no país. Nossa cultura é diferente, o vínculo do professor com as redes é diferente e temos que respeitar o arcabouço do nosso sistema”.
Outra ideia defendida pelo conselho é a trilha profissional. No entanto, segundo o representante do CONSED, mais que mudança na lei, neste caso será necessário fazer com que a sociedade mude sua opinião a respeito dos cursos profissionalizantes. “O aluno que opta pela educação profissional é visto como fracassado. Nós [sociedade] entendemos que a universidade deve ser a opção imediata desse aluno e muitas vezes há resistência da própria família”.
O “sonho de consumo”, afirma Daher, é que as competências é que os objetivos de aprendizagem da Base Nacional ocupem, no máximo, 1600 horas da carga horária total e com liberdade para que cada rede aprofunde conteúdos de acordo com seu contexto local. “Queremos dar mais possibilidades para que o aluno não termine o ensino médio sem saber para onde vai”.