Escola e território conectados aos ODS fortalecem a qualidade da educação - PORVIR
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Inovações em Educação

Escola e território conectados aos ODS fortalecem a qualidade da educação

Temas contemporâneos abordados em atividades práticas promovem a reflexão e o compromisso com a Agenda 2030 dentro e fora da escola

Parceria com Instituto Significare

por Ruam Oliveira / Ana Luísa D'Maschio ilustração relógio 1 de novembro de 2022

A sala de aula é um espaço para refletir sobre o presente e o futuro. Muitas eletivas atualmente se propõem a olhar para questões contemporâneas a fim de preparar os estudantes para a vida. 

Uma maneira de esses temas adentrarem o espaço escolar é por meio dos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável). Eles têm como linha de chegada a erradicação da pobreza, promoção do desenvolvimento sustentável, ambiental e econômico, ações em defesa do clima, educação de qualidade. São 17 ODS, que buscam cumprir a chamada Agenda 2030, plano global da ONU (Organização das Nações Unidas) para atingir um mundo melhor. Introjetados na escola, tais objetivos podem aparecer na forma de diferentes projetos. 

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Para falar sobre sustentabilidade, saúde, clima e fome, a equipe do Centro Educamais Professor Ribamar Torres, que fica em Pastos Bons, Maranhão, começou a eletiva “Olhos nos Olhos”. A proposta foi primeiramente mapear nascentes – também conhecidas como olhos d’água, por isso o nome da iniciativa – e, a partir disso, desenvolver atividades práticas e reflexivas.

“Tínhamos a preocupação de engajar os alunos em atividades práticas no ensino a partir de temas transversais contemporâneos que contemplassem os ODS de forma a relacionar meio ambiente e saúde com a vivência e experiência de cada um”, conta a professora Rosa Duarte, representante de um grupo de educadores que participam da ação. 

O projeto envolveu professoras e professores de diversas áreas do conhecimento, como biologia, geografia e química, e já foi, inclusive, reconhecido em premiações, como o Prêmio Territórios, do Instituto Tomie Othake. 

A equipe da escola fez aulas de campo para o mapeamento das nascentes na zona urbana da cidade, a fim de identificar e verificar as condições ambientais. “Descobrimos que metade da cidade é abastecida por olhos d’água e que em alguns bairros da cidade a água não chegava às torneiras com frequência. Também constatamos que em alguns olhos d’água tinha bastante lixo no entorno e fizemos um mutirão de limpeza envolvendo outros alunos da escola e professores”, diz Rosa. 

Comunidade conectada aos ODS

A escola de Rosa conseguiu trabalhar com objetivos relacionados à alimentação, aos cuidados com a saúde, à água potável, à educação e até mesmo às perspectivas de emprego. E foi além, com um segundo projeto, que ganhou o nome de “Fruturos do Cerrado Maranhense: agregadores de valor nutricional na alimentação”, uma brincadeira das palavras frutos e futuro. Nele, a turma colocou a mão na massa, literalmente, promovendo a degustação de pães e a criação de um livreto de receitas com frutos nativos da região. 

“Um morador da comunidade ministrou oficina de artesanato ecológico com fibras das palmeiras oriundas da vegetação nativa. Coletamos frutos para aproveitamento na produção artesanal de alimentos como pães, bolos e geleias”, conta a professora. 

ODS alcançados pela escola maranhense
ODS 02 – Fome Zero e Agricultura Sustentável
Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável.

A ideia do projeto “Fruturos do cerrado maranhense” veio a partir das visitas de busca ativa na casa dos estudantes faltosos. Alguns pais relataram estar passando por insegurança alimentar, devido ao desemprego e também às perdas de benefícios sociais. Com a iniciativa, a turma encontrou estratégias para incentivar a população a valorizar as plantas do cerrado maranhense, e, assim, influenciar na conservação da biodiversidade pelo uso, seja na alimentação ou em outras áreas. 

ODS 03 – Saúde e Bem-Estar
Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos, em todas as idades.

Na eletiva “Olhos nos Olhos”, foram abordados, além da questão hídrica e de saneamento, as determinantes sociais da saúde, como doenças de veiculação hídrica, doenças crônicas não transmissíveis, racismo ambiental e outros fatores que afetam a saúde dos menos favorecidos.

ODS 04 – Educação de Qualidade
Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todas e todos.

O objetivo é alcançado quando se oferta a educação científica. Também houve o incentivo às meninas na ciência, aulas práticas voltadas não apenas para a anatomia e fisiologia vegetal, mas também sobre a etnobotânica, usos tradicionais da flora local nos processos de cura, respeito aos territórios e aos detentores de saberes ancestrais por meio da promoção de oficinas sobre plantas do cerrado maranhense e seus usos. “Uma coisa que gosto de destacar são os corpos que vieram nos ensinar sobre esses conhecimentos: corpos negros, normalmente com pouca escolaridade, mas que são muito sábios”, destaca Rosa.

ODS dentro e fora da escola

Projetos inovadores que reforçam a presença dos ODS auxiliam também na construção cidadã dos alunos, impactando diretamente na maneira como se relacionam com o mundo. 

“A educação para o desenvolvimento sustentável é muito bem sintetizada na meta 4.7 dos ODS, que nos oferece a compreensão de que a educação pode potencialmente levar à transformação social, por meio de diferentes ‘educações para’, como educação para o desenvolvimento sustentável, educação em direitos humanos, educação para igualdade de gênero, educação para a paz e educação para a cidadania global”, pontua Wellington Cruz presidente do Instituto Significare

A mais recente iniciativa do instituto se chama “Na Minha Escola”, e sugere como levar as ODS ao currículo de escolas públicas e particulares. “Precisamos, com urgência, educar as nossas crianças e jovens para um futuro mais sustentável e inclusivo. Não temos outra saída. Se queremos avançar com algum sucesso na Agenda 2030 – e mais, se queremos um mundo mais justo e sustentável, é urgente convidar as escolas para serem protagonistas desse processo de transformação”, reforça Wellington. 

Atividade desplugada

É possível desenvolver ações tanto em ambiente externo, como é o caso do Centro Ribamar, quanto internamente. A internacionalista Thaís Zschieschang, por exemplo, projetou um jogo de tabuleiro temático sobre os ODS voltado para jovens entre 16 e 23 anos. 

“As ideações são feitas em grupo e assim são desenvolvidas habilidades de cocriação, respeito à diversidade e colaboração. Um dos grandes objetivos é estimular, de forma lúdica e atrativa, que jovens pensem sobre problemas sociais e ambientais complexos, como a participação política e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, sentido-se participantes e corresponsáveis por tais agendas”, comenta Thaís. 

Disponível para download gratuito, ela espera que o jogo seja utilizado por escolas públicas de diversas regiões. Para fazer o download do game, clique aqui

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ODS em todas as etapas

Não apenas na educação básica é possível trabalhar com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Um outro exemplo de atuação vem do Recife, capital de Pernambuco. Usando metarreciclagem, as professoras Djanice Leonardo, Mirza Cabral e Kate Limeira, do laboratório de tecnologia e inovação para sustentabilidade (CETEC), incentivaram estudantes da EJA (Educação de Jovens e Adultos) a construir móveis sustentáveis usando materiais recicláveis, como caixas de papelão e resíduos tecnológicos.

Além de desenvolver possibilidades de um olhar estético e funcional ao trabalhar com esses materiais, a professora Djanice reconhece que há uma importante função em debater a Agenda 2030 por uma questão de sobrevivência. Ela destaca a iminência de que, por exemplo, a cidade do Recife seja atingida pela elevação do nível do mar: “A importância que eu vejo de a gente estar trabalhando os ODS tanto na educação infantil como perpassando por todas as disciplinas e séries é para que a gente possa despertar em nossos estudantes essa preocupação ambiental, que eles tomem ciência da situação que se encontra o planeta”, afirma Djanice. 

Os resultados e a própria prática têm relação com o que vivem atualmente. Ela conta que durante a pandemia, principalmente, bairros do Recife sofreram com enchentes e isso causou um impacto duplo: muitos integrantes da EJA perderam móveis devido à questão climática, e também ficaram sem empregos por causa do distanciamento social obrigatório.

A produção dos móveis sustentáveis atuou não somente no problema vivido naquele momento, como também cumpriu o papel da escola em ensinar outros conteúdos como matemática, geometria e sustentabilidade. 

“A prática se mostrou efetiva na cooperação entre os estudantes. Tinha um aluno que era marceneiro, outra que era costureira e esses alunos foram ajudando um ou outro. As produções são riquíssimas”, conta Djanice. “Outro dia, um aluno disse para mim: ‘Professora, eu já fui pra casa levando tarefa no papel, levando tarefa no caderno e no livro, mas levando uma tarefa assim na cabeça é a primeira vez'”, diz, referindo-se à criação de móveis. 

Para Djanice, o mais interessante do projeto é ver como os alunos já reconhecem aprendizados que não foram apresentados diretamente em uma aula tradicional. Os estudantes acabam desenvolvendo outras habilidades, como o empreendedorismo e a economia criativa. 

A proposta tem sido muito bem recebida: já foi replicada em outras dez escolas do município e segue crescendo, conquistando prêmios diversos prêmios em nível estadual. A professora acredita que essa é uma ideia que pode ser replicada em diferentes escolas, e torce para que isso aconteça. 

“Saberes são para ser compartilhados. Não adianta a gente pegar uma luz ou um candeeiro e colocá-lo embaixo da mesa. A gente quer colocá-lo em cima da mesa para que todos possam ver. E que possam se beneficiar daquela claridade. Assim também é a educação: a gente quer colocá-la na mesa, uma educação pública de qualidade”, reflete a professora. 

Conscientização do território

Um ponto de atenção encontrado na iniciativa de Djanice foi perceber que nem todos os colegas compreendiam do que se tratavam os ODS. Por usarem caixas de papelão e outros elementos recicláveis, a docente conta que foi chamada por alguns colegas de “catadora”. Não foi propriamente o termo que a incomodou, mas o tom pejorativo usado para se referir ao trabalho desenvolvido. 

O desafio acabou extrapolando a missão de conversar com os estudantes e indo em direção também ao corpo docente. O bom sinal veio quando o projeto desenvolvido pela escola começou a ganhar visibilidade, fazendo com que os que antes criticavam prestassem mais atenção. 

Para Wellington Cruz, o primeiro passo para mobilizar a comunidade escolar é mapear o que a escola já faz em prol do desenvolvimento sustentável. “Sempre há algo positivo que pode ser ampliado”, acredita. “Em seguida, é importante sensibilizar a comunidade e trazer para perto os colaboradores mais envolvidos e comprometidos com o tema. A escola precisa perceber a grande oportunidade que tem nas mãos quando assume o protagonismo no desenvolvimento de pessoas aptas para um mundo sustentável. O futuro que desejamos é, ou deveria ser, tema recorrente de reflexões, projetos e ações da escola”, reforça. 

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competências para o século 21, educação de jovens e adultos, empreendedorismo, ensino fundamental, ensino médio

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