Summit usa a tecnologia para oferecer educação com foco em competências
Com transmissão ao vivo pela internet e cobertura pelas redes sociais, Transformar apresenta a rede de escolas dos EUA e outras experiências a partir das 9h desta terça-feira
por Vinícius de Oliveira 3 de abril de 2017
Até mesmo uma situação em que quase todos alunos que deixam o ensino médio a caminho da universidade pode esconder deficiências não atendidas ao longo da vida escolar. O Transformar, maior evento sobre inovação em educação do Brasil, que acontece nesta terça-feira (4), em São Paulo (SP), traz o caso da rede de escolas charter (públicas com administração privada) Summit, localizada na Califórnia (Estados Unidos), que usou a tecnologia e uma abordagem baseada em competências para entender o que acontecia nos anos seguintes e descobrir que nem tudo ia bem, visto que estudantes continuavam a abandonar seus cursos. Quatro anos após a a fala de Diane Tavenner na primeira edição do evento, a Summit volta ao palco para explicar como evoluiu no seu trabalho em personalizar a educação.
Essa experiência fechará o evento, organizado por Instituto Inspirare/Porvir, Fundação Lemann e Instituto Península, que trará na parte da manhã uma imersão em práticas pedagógicas que estão alcançando resultados na sala de aula. No período da tarde, os participantes ainda poderão conhecer instituições de ensino brasileiras e internacionais, que compartilham com detalhes as suas experiências no desenvolvimento de competências para o século 21, projetos, tecnologia e sustentabilidade.
Representada no evento pelo diretor executivo Nicholas Kim, da unidade de Tahoma, em San Jose, a rede de 11 escolas criou há seis anos uma plataforma que usa dados para acompanhar todos os passos dos cerca de 3 mil alunos, abrindo espaço para que avancem em seus projetos de acordo com o próprio ritmo ou demandando que trabalhem melhor a argumentação, de acordo com sinalizações deixadas em tempo real pelos professores. “Decidimos construir uma plataforma onde as crianças podem tomar decisão sobre a melhor maneira para dividir seu tempo, saber o que precisam fazer para completar uma tarefa, tomar decisão por si próprias e praticar de verdade essas habilidades”, diz Kim.
Nas unidades da Summit, o trabalho dos professores é apoiado pela formação continuada que dura 50 dias e busca colocá-los em situações próximas àquelas que devem oferecer aos estudantes, como o que devem priorizar e como podem pedir ajuda de colegas. No programa de residência recém-aprovado pelo governo da Califórnia, professores poderão frequentar a sala de aula de seus colegas até ganharem confiança.
Nas escolas Summit, os sempre criticados testes padronizados continuam a existir, mas fazem parte de um leque de opções . “Antes de tudo, buscamos descobrir o que os testes estão perguntando aos estudantes. Pessoalmente, não acho que todos são demoníacos. Alguns demandam apenas memorização, o que não é nem um bom uso do tempo e nem um indicador do que os estudantes podem fazer. Você sempre pode aprender quem deu início à Segunda Guerra Mundial, mas precisa aprender a aprender. Por isso é que na Summit priorizamos habilidades acima de tudo, porque quando chegar à universidade, não será esperado que saiba tudo o que foi ensinado, mas como escrever um artigo e uma pesquisa ou uma apresentação”.
Porvir – Como a Summit evoluiu de uma única escola charter para uma se transformar em uma rede?
Nicholas Kim – Esse é meu nono ano na Summit e acompanhei esse período todo desde quando éramos uma única escola. Quando comecei, éramos uma escola que tinha professores incríveis e um sistema de apoio aos estudantes que cuidava de cada criança e se preocupava em criar relações próximas com elas. Dávamos o melhor para que cada aluno tivesse a chance de ingressar na universidade e ter sucesso lá. Esse foco não mudou até hoje. O que mudou foi que há seis anos atrás começamos a ter a ajuda de dados e pudemos ver que apesar de 99% irem para um curso de quatro anos no ensino superior, nem todos se formavam. Ao olhar para os números, sabíamos que tínhamos o dobro (60%) da média nacional de aprovação, mas, na realidade, eles são alunos, e não apenas números, que têm um projeto de vida que nós precisamos ter certeza que foi atendido.
Porvir – O que descobriram que teria que mudar?
Nicholas Kim – Sempre tivemos boas relações com as crianças, que nos diziam que o que gostariam de ter na universidade era a autonomia sobre seu aprendizado. Elas precisavam ter habilidades para dizer “É isso o que vou fazer porque não existe mentor ou professor para cobrar tudo o que você precisa, para controlar o tempo, para pedir ajuda quando necessário”. E isso deveria ser feito enquanto eles estivessem na escola, com um adulto que se importa com eles fazem e consegue oferecer mentoria durante todo o percurso. Com isso em mente, decidimos mudar o jeito de fazer as coisas. Sabemos que as crianças aprendem em ritmos diferentes, então decidimos construir uma plataforma onde elas podem tomar decisão sobre a melhor maneira para dividir seu tempo, saber o que precisam fazer para completar uma tarefa, tomar decisão por si próprias e praticar de verdade essas habilidades. Para criá-la, fizemos uma parceria com o Facebook, que ofereceu diversos engenheiros, e hoje ela está disponível a todas as nossas turmas.
Porvir – Por que vocês decidiram produzir tecnologia internamente?
Nicholas Kim – Há seis anos, não existia nada que atendesse ao nosso propósito. Nos Estados Unidos, a maioria das plataformas é feita para comunicar informações, seja a lição de casa para os estudantes ou a nota para os pais. Precisávamos de algo que permitisse aos estudantes saber desde o primeiro dia de aula todos os seus objetivos de aprendizagem e como seriam avaliados.
Porvir – Como é a abordagem da Summit atualmente? No começo as apostas eram todas direcionadas ao ensino personalizado. E agora?
Nicholas Kim – Hoje temos um programa que prepara para o ensino superior e queremos ter certeza que todos podem cumpri-lo. Acredito que são múltiplas partes que tornam isso possível. Uma é feita das habilidades para o século 21. Você precisa estar preparado para ler de maneira crítica, a apoiar seus argumentos baseado em evidências e explicar por que elas são importantes. E a maneira com que ensinamos essas habilidades é por meio de projetos, que demandam a maior parte do tempo dos estudantes, que precisam formular seus argumentos e fazer coisas que as pessoas fazem no mundo real. Uma das coisas que eles fazem nas aulas de química é produzir biodiesel, que também permite a prática do método científico e da argumentação. Também vemos que é importante saber as coisas então você vai conhecer o que é biodiesel. Nessa parte, eles fazem descobertas por si mesmo e podem aplicá-las em seus projetos. Assim, podem avançar no próprio ritmo e, se em casa fala-se muito a respeito da guerras, não é necessário assistir à aula expositiva de história porque já apresenta domínio sobre o tema e pode avançar mais rapidamente. Se não souber especificamente sobre a Segunda Guerra, dedicará mais tempo em um ensino personalizado.
Porvir – Como é a formação dos professores da Summit?
Nicholas Kim – Temos duas iniciativas, sendo que uma delas é relativamente nova. Temos cerca de 50 dias de capacitação profissional por ano, que são uma oportunidade para professores traçarem seus objetivos e avaliarem como podem melhorar. É muito personalizado, da mesma maneira que acontece com os alunos. Dizemos aos professores que eles devem tentar fazer as coisas, saber o que devem priorizar e como demandar apoio. A outra maneira com que trabalhamos a formação por meio de um programa próprio de residência que acaba de ser aprovado pelo Departamento de Educação da Califórnia. Nele, professores podem praticar em nossas salas de aula e aprender sobre personalização e aprendizagem por projetos.
Porvir – E a avaliação, como vocês conseguem criar alternativas aos testes padronizados?
Nicholas Kim – Antes de tudo, buscamos descobrir o que os testes estão perguntando aos estudantes. Pessoalmente, não acho que todos são demoníacos. Alguns demandam apenas memorização, o que não é nem um bom uso do tempo e nem um indicador do que os estudantes podem fazer. Não acredito nessas coisas. Outros são melhores porque usam problemas do mundo real, que demandam a elaboração de hipóteses. Mas somos uma organização focada em competências. Você sempre pode até aprender quem deu início à Segunda Guerra Mundial, mas você precisa aprender a aprender. Por isso é que priorizamos habilidades acima de tudo, porque quando chegar à universidade, não será esperado que saiba tudo o que foi ensinado, mas como escrever um artigo e uma pesquisa ou uma apresentação.
Porvir – E como a avaliação acontece em sala de aula? Que tipos de ferramentas vocês usam?
Nicholas Kim – Se for algo que o estudante já domina, temos a plataforma online que oferece uma avaliação, comentários em tempo real e notas em menos de 30 segundos. Para os projetos, as avaliações não são dadas somente no final, mas ao longo do ano. Temos pontos de verificação, que dão aos professores a chance de comentar tudo o que os alunos estão fazendo. Em um artigo, o professor pode dizer que o argumento não está bem sustentado e pedir que o aluno continue pesquisando novas informações. Em cada passo os professores conseguem ter as informações que precisam para oferecer retornos avaliativos sobre a produção. No ambiente virtual, o professor consegue ver em tempo real no que aluno está trabalhando e deixar comentários para revisão e dizer que ele não pode ir adiante sem antes completar tal tarefa.
Porvir – Para finalizar, como vocês têm enfrentado as desigualdades comuns em um ambiente de escola pública?
Nicholas Kim – Somos uma escola totalmente pública e nossa única diferença é que para escolas charter na Califórnia é permitido fazer uma loteria caso o número de inscrições seja maior que o de vagas ofertadas. Fundamentalmente, acreditamos que cada criança merece oportunidade e uma das coisas mais importantes é que uma de nossas unidades fica em uma área em que o mundo do ensino superior não faz parte da realidade local. Parte do nosso trabalho é convencê-los de que estudar significa uma oportunidade real para eles e explicar que ir à faculdade é importante, apesar do processo de seleção, que é muito burocrático e exige muitos passos. Na Califórnia, só 30% dos estudantes estão aptos a se inscrever no processo de seleção das universidades, enquanto aqui 100% deles conseguem ingressar em pelo menos um curso superior de quatro anos. E isso quer dizer que algo está funcionando.