Tecnologia facilita mentoria para escolha de profissão e projeto de vida
Por meio de vídeos e troca de mensagens no WhatsApp, startups como Kuau e a Iniciativas Empreendedoras criam formas de ajudar os jovens a desenhar seu futuro
por Vanessa Fajardo 7 de janeiro de 2019
Escolher a profissão conciliando gostos pessoais e mercado de trabalho, empreender e traçar o projeto de vida não são tarefas simples, principalmente quando faltam ferramentas para viabilizá-las.
Pensando nisso, duas startups usam a tecnologia para criar instrumentos que ajudam jovens a construir novos horizontes. A Kuau é uma plataforma que oferece orientação profissional a alunos da rede pública a partir de vídeos de curta duração. Já por meio da Iniciativas Empreendedoras, estudantes do curso de administração de Fundação Getulio Vargas oferecem mentoria usando o WhatsApp.
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O acesso à Kuau (o nome vem da palavra “qual”) é gratuito, porém só pode ser feito depois que as secretarias de educação fecham parceria com a startup. Atualmente cerca de 1,2 milhão de alunos de ensino médio de mais de 2 mil escolas públicas dos estados do Espírito Santo, Rondônia, Minas Gerais, Santa Catarina e Pernambuco têm acesso ao aplicativo. Individualmente um estudante não consegue usar a plataforma.
Ao se cadastrar, um chatbot (espécie de robô) inteligente, o “koala”, interage com o usuário que precisa apontar três cursos de ensino superior que mais lhe agradam. A partir disso, o aluno tem acesso a um catálogo de vídeos com protagonistas reais que falam sobre a profissão sob três diferentes óticas: estudante universitário, jovem profissional e um outro mais experiente. São 26 profissões catalogadas, com 24 vídeos disponíveis para cada uma delas.
A cada vídeo assistido, o usuário da plataforma precisa responder uma pergunta de autoconhecimento que alimenta o “termômetro da afinidade.” À medida que “esquenta” para uma carreira, o aluno é convidado a participar de atividades presenciais por instituições de ensino que estão cadastradas no portal e oferecem tais cursos. Também é necessário responder quiz e cumprir “metas diárias de inspiração.”
O negócio, segundo o cofundador Gilber Machado, de 42 anos, formado em ciência da computação, já está sendo chamado de “Netflix das profissões.”
“Nosso propósito é ajudar o jovem a escolher sua profissão e entender com profundidade o mundo do trabalho e as possibilidades de formação. O que a gente faz é universalizar o acesso ao serviço de orientação profissional. A escola se preocupa em formar o aluno, em fazê-lo ter boa nota no Enem, mas não se dedica a ajudá-lo a escolher o que vai fazer com essa nota”, diz Machado.
No ano passado, a professora de língua portuguesa Débora Cristina Marques Moraes acompanhou a utilização de seus alunos na Kuau. Eles estavam o terceiro do ano do ensino médio na escola Elza Lemos Andreatta, na Ilha das Caieiras, uma comunidade de baixa renda, localizada em Vitória, no Espírito Santo.
“Os alunos ficaram encantados, a dinâmica da plataforma é muito legal, e os alunos têm muita carência de orientação profissional. A escola não é voltada para eles irem para a faculdade, por isso esse suporte é muito interessante”, conta Débora.
Para Machado, o diferencial da startup é que os usuários podem aprender sobre as profissões por meio de histórias reais. “Isso empodera os jovens. A plataforma transforma a orientação profissional em política pública, por isso as secretarias de educação têm abraçado o projeto.”
A Kuau também atraiu as instituições de ensino superior que viram ali potencial para novos clientes e, ao mesmo tempo, o cofundador encontrou uma maneira de monetizar o negócio. As faculdades pagam para se cadastrar na plataforma e podem contatar os usuários que ao utilizar o serviço demostram interesse em determinados cursos.
“Funciona como uma grande feira de ensino superior. Dentro da plataforma, há como se fosse uma página de Facebook com mapa de demanda pelas carreiras, e as instituições conseguem divulgar seus processos seletivos e cursos.”
Mentoria por WhatsApp
Por meio do Iniciativas Empreendedoras, alunos do último ano do curso de administração da Fundação Getulio Vargas se transformam em tutores que ajudam pessoas a tirar sonhos do papel com cursos e mentoria por WhatsApp.
Os “tutorados” recebem pílulas de conteúdo em vídeos e exercícios práticos, além de feedbacks, por mensagens de texto e áudio. A duração do programa é de a partir de três semanas. Os cursos são comprados por empresas que oferecem aos clientes e funcionários. Eles não podem ser adquiridos individualmente.
O método foi utilizado em dois projetos pilotos, primeiro com 40 alunos que estavam em busca de “projetos de vida” e outro com 400, de 13 municípios diferentes que queriam melhorias nas suas comunidades. Todos fizeram os cursos, mas 40 alunos do segundo grupo foram selecionados para colocar o projeto no papel, com metas, planejamento, custos e identificação de equipe técnica e parceiros. O primeiro passo, na fase da mentoria, é gravar um vídeo selfie com a meta.
“Ao gravar um vídeo, o aluno passa ter um compromisso maior com o projeto. Ele também precisa escrever as metas, fotografar e mandar para o tutor, que dá feedbacks (retornos avaliativos) em áudio. É um processo bem humanizado. O aluno recebe os vídeos, tem tarefas, o tutor cobra se ele não cumpre os prazos”, explica o fundador da empresa, Guilherme de Almeida Prado, de 42 anos, formado em administração.
Aluno de administração da FGV, Pedro Henrique Salgado Vidal, de 22 anos, participou dos dois projetos pilotos como tutor e estima que já tenha orientado mais de cem pessoas. Ele diz que entrou na graduação sem muito foco sobre o que queria da carreira, mas se apaixonou por projetos sociais ligados à educação quando se envolveu no cursinho pré-vestibular oferecido pela universidade para alunos de baixa renda.
“Fui monitor de redação e também me envolvi na administração. Quando precisei fazer estágio fui buscar algo nesta área. Quando entrei na faculdade estava bem perdido, escolhi o curso de administração por ser mais abrangente, mas agora quero focar em negócios de impacto em educação e meio ambiente”, afirma Vidal.
Do projeto de mentoria, Vidal conta que teve a oportunidade de sentir as diferentes demandas dos alunos a partir da localização geográfica. Em um dos projetos pilotos, a ideia era atender alunos de 13 municípios que regiões diferentes que tinham o objetivo de melhorar sua comunidade.
“Era muito interessante porque atendemos alunos de várias cidades, no interior de São Paulo, na Bahia, e em Alagoas e deu para perceber as diferenças das demandas. Em Alagoas, em São Miguel dos Campos, eram necessidades mais ligadas às questões de saneamento básico; em São Paulo, reciclagem, horta comunitária.”
A partir de uma meta idealizada pelo tutorado, ele os recebe exercícios. “Procurava dar o retorno de acordo com o sentia do aluno, as exigências eram diferentes e buscava adequar a linguagem para facilitar o aprendizado.”