Startup para desburocratizar ensino conservador
Projeto Magia leva crianças a assumirem desafio de escrever e desenhar próprio livro, que ganha um toque profissional
por Vagner de Alencar 28 de fevereiro de 2013
“As startups têm por natureza serem iniciativas jovens, mais informais e surgem como uma forma de desburocratizar a administração da escola”, é o que afirma Robson Melo, cofundador da Estante Mágica, que, desde o início do ano passado, vem ganhando a confiança de escolas privadas do Rio de Janeiro. Por meio do Projeto Magia, a empresa tem chegado às escolas com um desafio que transforma alunos de 6 a 10 anos em escritores mirins: os pequenos precisam elaborar, escrever e desenhar histórias. Esse material passa então por as mãos do pessoal do projeto, que edita, revisa, dá acabamento de luxo e publica as obras. No fim, os agora autores têm direito até a noite de autógrafos.
Até agora cerca de 50 escolas adotaram a iniciativa e, segundo Melo, embora elas ainda sejam resistentes quanto a deixar uma empresa participar tão abertamente no processo educativo, a relação é extremamente benéfica. Muitas vezes, as instituições não estão acostumadas a trabalhar com projetos e objetivos claros com alunos tão pequenos. “Muitas escolas ainda são muito conservadoras, e não conseguem trabalhar de maneira interdisciplinar seus conteúdos e sem muita burocracia. É trazer um espírito mais informal e inovador para o processo da escola”, afirma.
No Projeto Magia, o foco é o estímulo à leitura e à escrita dos alunos. Além de unir professores de redação e artes no processo de elaboração dos livros, o momento de criação das histórias ajuda as crianças a despertarem o talento de contar para os outros aquilo que estão sentindo. “Elas expressam na publicação desde a ausência do pai em casa, a vontade de ser astronauta até mesmo sobre lasanha feita pela mãe que não deu certo”, diz Melo.
Na prática, cada estudante recebe uma espécie de molde da publicação – com folhas personalizadas para as ilustrações os textos –, que depois são editados, publicados e revisados pela editora até se transformar em um livro exclusivo. Os conteúdos são decididos pelas escolas e podem ser abrangentes: ir desde uma inquietação que estimule a preocupação das crianças pela sociedade, como “O que eu faria se fosse o governador da minha cidade?”, ou até mesmo a uma comemoração específica. Neste ano, por exemplo, uma das escolas que participam do projeto vai abordar o centenário de Vinicius de Morais: os estudantes vão produzir livros de poesia, a partir das aulas transdisciplinares de redação, artes e música.
Já em outra instituição, são os alunos quem decidem sobre o que escrever. Os livros recebem enredos a partir de situações cotidianas simples, engraçadas, que revelam sentimentos, desejos e sonhos das crianças. Como é o caso de alguns títulos como O Super João Felipe, A cidade Ideal, Senhor Gelatina no Mundo dos Doces ou Por que eu Tenho que Usar Maria Chiquinha Toda Hora?
Segundo Melo, a iniciativa permite que os docentes consigam perceber, na prática, a evolução do aprendizado do aluno. O mesmo, afirma, acontece com os pais, que notam o nível de alfabetização ou processo cognitivo dos filhos, e, além disso, chegam até a organizar noites de autógrafos para comemorar a publicação.
Na Rocinha
Entre outubro e dezembro de 2012, o projeto trabalhou de forma voluntária com 104 crianças da ONG Casa Espírita Cristã Maria de Nazaré, que desenvolve atividades educacionais para meninos e meninas em situação de vulnerabilidade desde a pré-escola ao ensino médio, na Rocinha, no Rio de Janeiro. Os livros escritos pelas crianças contavam sobre suas vidas na comunidade, sobre partidas de futebol ou sobre o hospital onde nasceram.
A startup pretende continuar com a parceria e ampliar o acesso a 150 crianças. “A ideia surgiu como um presente de Natal e, claro, como forma de resgatar a autoestima dessas crianças. Muitas vezes, são desestimuladas por conta dos problemas financeiras, de aprendizado, algum tipo de dislexia ou até mesmo problemas para escrever”, afirma.