Programa de férias leva matemática criativa para estudantes de escolas públicas - PORVIR
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Inovações em Educação

Programa de férias leva matemática criativa para estudantes de escolas públicas

Durante dez dias, crianças terão contato com método desenvolvido na Universidade de Stanford (EUA) baseado na colaboração e na aceitação do erro

por Vinícius de Oliveira ilustração relógio 14 de janeiro de 2020

Vale errar, conversar com o colega e não precisa ter pressa para chegar ao resultado. Para mostrar às crianças que a matemática pode ser aprendida de maneira criativa e divertida, o Instituto Sidarta realiza neste começo de janeiro um curso de férias para 100 estudantes de duas escolas públicas de Cotia, cidade na região metropolitana de São Paulo (SP).

Serão 10 dias para quebrar a cabeça e apresentar respostas a problemas como “Quantas torres de blocos diferentes você pode fazer com três blocos coloridos diferentes?” ou ainda “Imagine que pintamos todos os lados de um cubo azul de 4 x 4 x 4. Quantos cubinhos têm três faces azuis? Quantos têm 2 faces azuis?”.

Essas e outras atividades são baseadas nos mais recentes estudos de neurociência e aprendizagem da disciplina desenvolvida pela professora Jo Boaler da Faculdade de Educação da Universidade Stanford (EUA) e autora do livro Mentalidades Matemáticas. “A professora Jo Boaler traz uma abordagem que conseguiu comprovar, dentro do contexto dos Estados Unidos, que existe melhora significativa da aprendizagem quando a matemática é apresentada de um jeito diferente”, diz Ya Jen Chang, presidente do Instituto Sidarta.

Acesse mais atividades no site Youcubed (em português)
Conheça as evidências que apoiam o programa Mentalidades Matemáticas

Segundo Ya Chen, ensinar os cálculos para as crianças de forma colaborativa e com desafios estimula a derrubada de mitos que trazem consequências ao longo de toda a vida escolar e fazem com que muitos sintam verdadeira aversão à matemática.

O primeiro deles está relacionado aos erros, que dentro da metodologia são plenamente aceitos. “Errar faz o cérebro se desenvolver mais porque as crianças começam a se perguntar por que eles acontecem. Ao serem desafiados, os alunos buscam um conjunto de soluções possíveis, e é neste momento que desenvolvem melhor o cérebro”, diz.

Assim como na primeira trilha do Clube Porvir que tratou valorização de autoestima e da importância de desenvolver uma mentalidade de crescimento, no Mentalidades Matemáticas a ideia do dom – e que poucas pessoas nasceram para matemática – é refutada.  Em terceiro lugar, também sai de cena a ideia de que para ser bom em matemática é preciso ser rápido. A presidente do Sidarta lembra que matemáticos premiados continuam tão lentos quanto na época da escola e hoje sabem que uma coisa não tem nada a ver com a outra.

De Stanford para estudantes brasileiros

As atividades de férias para os alunos brasileiros são supervisionadas por Jack Dieckmann, professor da Universidade de Stanford e diretor de pesquisa da plataforma Youcubed. Ele será responsável por entender os efeitos da metodologia quando ela é aplicada de maneira intensiva. Como os estudantes absorvem as propostas? Qual seu impacto em relação às percepções sobre matemática? E sobre as crenças sobre suas capacidades de aprendizagem? Ao final das atividades, o material sobre o curso de férias brasileiro será enviado para Stanford e os resultados da pesquisa serão apresentados ao longo do ano.

Nos EUA, em apenas 18 dias de curso de férias, os alunos de sexto ao oitavo ano evoluíram o equivalente a 2,7 anos de ensino regular de matemática. Em São Paulo, o programa será mais curto, 10 dias, e ofertado a alunos de quarto e quinto anos. “Nós adaptamos o currículo para que os alunos brasileiros tenham um programa específico e específico para essa idade. Quanto mais cedo houver esforços para mudar a maneira com que os alunos se relacionam com a matemática, melhor, porque sabemos que muitos deles têm medo dos números”. Só que esse sentimento não é restrito aos alunos.

“Professores de ensino fundamental 1 também possuem relação de medo diante da matemática nos Estados Unidos e acho que acontece o mesmo aqui no Brasil. Por isso, consideramos tanto os alunos quanto os professores como aprendizes”, disse Dieckmann, que ainda comparou o perfil das atividades com o que é feito nos EUA, que tem um histórico de investir cursos de formação continuada mais conteudista, tudo o que o método desenvolvido em Stanford busca evitar. “Algumas evidências da nossa pesquisa com professores mostram que eles aprendem melhor quando realizam atividades na prática em sala de aula com seus alunos e quando damos liberdade para admitir que não conhecem todas as respostas possíveis.”

Mas como diversificar as aulas diante de um currículo tão extenso desde os primeiros anos? Dieckmann diz que não há razões para defender o modelo atual, linear e baseado na sequência de unidades do livro didático em que poucos aprendem o suficiente. Como alternativa, aposta na colaboração, que permite conectar saberes de diferentes alunos, metodologia que já tem surtido resultado em uma escola estadual de São Paulo.

Mentalidades matemáticas no ensino regular

Desde 2017, a Escola Estadual Henrique Dumont Villares, que oferta os anos iniciais do ensino fundamental a 700 alunos, também em São Paulo, adota a abordagem de Mentalidades Matemáticas em busca de tornar a aprendizagem mais ativa.

“Antes, o professor passava o exercício na lousa, dava a resposta e acabou. Hoje em dia, as crianças discutem e têm que expor o trabalho aos colegas e tentar convencê-los”, afirma Nadia Moya Brocardo, professora-coordenadora da escola. “Em vez de uma lista de 30 contas, as aulas podem ser baseadas em um jogo em que a criança é estimulada a pensar e, assim, construir o raciocínio de maneira lúdica”, completa.

Essa maneira de escrever e falar de números já trouxe melhores resultados no Saresp (Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo), com alunos de quinto ano avançando de 30,7% em 2017 para 42,8% de desempenho avançado em 2018.

A abordagem também está presente em outras disciplinas, como a de língua portuguesa. “Nós trabalhamos com o jornal (para crianças e jovens) Joca. Cada grupo tem seis, sete minutos para expor aos colegas as matérias e gráficos como a que fala das causas do desmatamento. E assim, eles vão adquirindo esse hábito de construção coletiva”.

Jo Boaler – Acredite em seu potencial matemático (legendas em português podem ser ativadas)


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aprendizagem colaborativa, ensino fundamental, jogos

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