Relatório do NMC: produção de conteúdo e programação são tendência
Pesquisa sobre uso de tecnologias na educação básica antecipa o que deve chegar às escolas e salas de aula nos próximos anos
por Camila Leporace 3 de janeiro de 2017
A pesquisa Horizon Report: 2016 K-12 Edition, realizada pelo New Media Consortium (NMC) em parceria com o Consortium for School Networking (CoSN), traz previsões relativas à inserção das tecnologias emergentes no ensino fundamental e médio pelos próximos cinco anos. O relatório apresenta as seis principais tendências desse universo, que podem ser de curto prazo (um ou dois anos), médio (próximos três a quatro anos) e longo (cinco anos ou mais). O documento mapeia os principais desafios ao processo de inserção das tecnologias educacionais e apresenta, ainda, recursos inovadores que deverão ser incorporados ao ensino em até cinco anos.
As duas tendências de curto prazo apresentadas no relatório referem-se ao protagonismo do aluno na produção de conteúdo (“Students as Creators”) e ao ensino de códigos de programação (“Coding as a Literacy”). Segundo a pesquisadora brasileira Giselle Santos, que está entre os 59 participantes do painel deste ano, a mais brasileira das tendências de curto impacto – e que é também uma questão universal – é a mudança dos alunos de consumidores para criadores de conteúdo. Ela reforça que isso independe da idade do estudante.
“Os nossos alunos não se conformam mais com apenas consumir conteúdo. As expectativas quanto a para que serve a educação mudaram muito, inclusive para alunos pequenos. Eles não querem ir para a escola para escutar os professores falando de coisas que eles podem acessar pela internet. Querem entender como podem impactar tudo aquilo que estão aprendendo”, destaca Giselle. Uma das tendências de logo prazo apontadas pelo Horizon Report, a do redesenho da sala de aula, contribui também para aumentar esse pertencimento, segundo a pesquisadora. Essa tendência tem muitos desdobramentos possíveis, mas uma simples arrumação diferente de mesas e cadeiras já é capaz de permitir uma experiência de maior diálogo entre professores e alunos.
Já a necessidade do contato com os códigos e linguagens de programação emerge em função da enorme quantidade de funções ligadas à ciência da computação que vêm surgindo no mercado de trabalho, e que devem surgir ainda nos próximos cinco anos. O relatório destaca que adquirir habilidades ligadas à programação contribui para o desenvolvimento de competências socioemocionais, como a resolução de problemas, a criatividade e o pensamento crítico. O documento reporta que o governo americano destinou US$ 4 bilhões para a iniciativa Computer Science for All, beneficiando professores com treinamentos e aumentando o acesso de estudantes que ainda têm pouco contato com essa capacitação.
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Escola para a vida real
Um dos pontos que se destacam no relatório é a necessidade identificada por pesquisadores de aumentar a integração da escola com os outros aspectos da vida dos estudantes. Junto à tendência de curto prazo de o aluno fazer produção de conteúdo, e com isso demandar muito mais da escola, essa evolução da integração escolar revela-se fundamental para manter o interesse deles pelo aprendizado. “Ainda há uma separação muito grande entre a escola e o ‘resto do mundo’; parece que tudo para quando se está na escola e recomeça quando se está fora”, pontua Giselle. “Como trazer ao aluno oportunidades mais autênticas, mais ligadas à vida real? Essa é uma questão universal”, destaca.
Junto a essa tendência, aparece o aprendizado colaborativo, ambas mapeadas para os próximos três a cinco anos. O relatório mostra que modelos colaborativos de aprendizagem vêm se revelando efetivos para aumentar o engajamento dos estudantes. Os educadores também se beneficiam das atividades em grupo, desenvolvendo-se e aumentando suas capacidades interdisciplinares. A pesquisa aponta, ainda, uma dimensão extra a essa tendência: o aumento do uso das ferramentas digitais online como suporte às interações, permitindo trocas entre países e, com isso, um rico intercâmbio cultural.
Desafios
Os desafios mapeados pela pesquisa são definidos pelos participantes do painel como fatores que, se não forem resolvidos, podem impedir a adoção de tecnologias no âmbito escolar. Eles são divididos entre aqueles que foram mapeados claramente e para os quais já se enxerga soluções; os difíceis, ou seja, aqueles que estão mais ou menos bem entendidos e para os quais há soluções no horizonte; e os mais complexos, que seriam aqueles considerados difíceis até mesmo de se definir, e que exigem mais informações e percepções antes que soluções sejam encontradas.
Entre os desafios considerados difíceis está a redução das divergências no acesso à internet de banda larga, o que vem impactando não apenas países em desenvolvimento, mas os próprios Estados Unidos. Espera-se cada vez mais que os estudantes acessem a internet em casa, para fazer deveres, por exemplo. O relatório aponta a necessidade de união entre líderes da área da educação e governos para resolver essa questão, exemplificando com a iniciativa ConnectALL – que, anunciada pelo presidente Obama, prometeu proporcionar acesso à internet de alta velocidade a todos os norte-americanos – e a iniciativa do Google e de outras empresas de internet de prover cidades inteiras com fibras para a conexão à internet.
Já um dos desafios considerados bastante complexos é a disparidade escolar gerada por diferenças socioeconômicas, de raça, etnia e gênero, agravadas por fatores externos como a pressão de membros da comunidade, os estereótipos e o preconceito. A forma de avaliação adotada pelas escolas também leva a comparações nos níveis individual e coletivo. Em meio a esse cenário, as tecnologias que promovem o ensino adaptativo têm se mostrado grandes aliadas, pois permitem a educadores entender as diferentes performances de alunos e escalar estratégias que podem ajudar a reduzir o problema. Mas, segundo o relatório, uma ação global será necessária para que sejam resolvidas questões como a educação para crianças em países com problemas civis e as barreiras culturais que privam as mulheres do acesso à escola.
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Tecnologias
O relatório traz, ainda, informações sobre os principais recursos tecnológicos que os pesquisadores concordam que têm o potencial para gerar mudanças reais na educação, particularmente no desenvolvimento de pedagogias progressivas e estratégias de aprendizagem; na organização do trabalho de professores; na organização e na forma de produção de conteúdo. Entre as tecnologias citadas estão, por exemplo, a robótica, as tecnologias vestíveis e a inteligência artificial.