Escola é a instituição de referência na vida dos jovens, mostra estudo
Terceira edição da pesquisa Juventudes e Conexões mostra importância da família, da escola e do professor para faixa etária dos 15 aos 29 anos. Para os entrevistados, uso da tecnologia em aula é visto com ressalvas e há grande preocupação com a segurança online
por Fernanda Nogueira 17 de setembro de 2019
O ambiente educacional é a instituição de referência na vida dos jovens, mostra a 3a edição da pesquisa Juventudes e Conexões. A escola ou faculdade é apontada por 60% dos 1.440 entrevistados, com idades entre 15 e 29 anos, como instituição mais importante para aprender. É também considerada a mais importante para participar da sociedade por 47% deles, para empreender, por 44%, e para decidir quem quer ser, por 56%. O estudo é realizado pela Rede Conhecimento Social, com idealização da Fundação Telefônica Vivo e parceria com o Ibope Inteligência.
As pessoas mais importantes na vida dos jovens são o professor e a família. O professor fica em primeiro lugar quando a pergunta é sobre a pessoa mais importante para aprender, com 61% das respostas, e para empreender, com 45%. A família é mais importante para participar da sociedade para 43% dos participantes, e para decidir quem quer ser, para 49%.
Os temas educação, empreendedorismo, comportamento e participação social formam os quatro eixos da pesquisa. Para poder falar sobre tantos assuntos na linguagem dos jovens, o estudo teve a participação de 19 consultores da faixa etária pesquisada em todas as etapas de trabalho, além de especialistas de cada área. Esta metodologia permite que os jovens possam usar os resultados para gerar impacto no contexto que atuam, segundo Marisa Villi, diretora-executiva da Rede Conhecimento Social.
“Tão importante quanto os resultados é o processo de construção do estudo. Trazemos os jovens como coautores. Isso ajuda a fazer com que o que perguntamos esteja alinhado com o que sabem responder e com o que faz sentido para eles. Por isso, é uma pesquisa para o consumo de jovens também, para gerar conhecimento a eles mesmos”, afirma.
Pesquisa do Porvir
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O professor Rael Marinho Ferreira, de 26 anos, que mora na comunidade de Campina de São Benedito, de 200 habitantes, no distrito rural Região de Pacuí, em Macapá, foi um dos participantes. Formado em pedagogia em 2017 e com atuação na escola da comunidade como professor entre 2018 e o primeiro semestre deste ano, ele teve maior contribuição na área de educação do estudo.
Segundo Rael, que é voluntário no programa de leitura da Expedição Vaga Lume e cuida da biblioteca comunitária, a escola tem um grande papel na vida dos jovens e de todos que passam por ela. “Participar ativamente como aluno, professor ou profissional da escola marca a vida da gente. A escola prepara para viver em sociedade, dá conhecimento de mundo, é primordial. Foi assim para mim. Além da educação em casa, o jovem precisa da escola para ter a mente aberta, viver em sociedade, para não ser individualista ou egocêntrico.”
Para Yasmin de Souza Oliveira, de 17 anos, que mora bairro da Barra Funda, em São Paulo (SP), e cursa o último ano do ensino médio, depois da família, a escola é a principal influência. “Ali, convivo com outras pessoas. Tenho acesso a outros estilos de vida, a pessoas que pensam diferente de mim. Posso ter a oportunidade de escolher no que quero investir para fazer na vida.”
A mesma importância aparece na figura do professor. “Ele é a pessoa que vai me ensinar e enxergar as coisas de uma outra forma, me ensinar o conteúdo que preciso aprender e pode me passar várias experiências de vida”, diz a jovem.
Educação e internet
Sobre a ligação da internet com o aprendizado, 50% concordam que a internet aumenta a troca de conhecimento escolar e acadêmico. Para os entrevistados, a web não substitui o estudo presencial, mas o complementa.
Entre os pontos positivos do uso da internet apontados estão o aprendizado de coisas úteis para a vida e para o trabalho que não aprenderiam na escola ou na faculdade; a flexibilidade de ver onde, quando e quantas vezes quiser; a linguagem mais jovem, mais didática, focada, resumida e mais rápida e que evita ter de carregar livros enormes. O fato de a internet nem sempre ser confiável e a falta de embasamento nos conteúdos são apontados como pontos negativos.
O uso de tecnologia e internet em sala de aula é visto com ressalvas: 42% não consideram que aprendem melhor quando o professor dá aulas mais interativas com uso de tecnologias. Aqueles que são favoráveis ao uso dizem que já complementam os estudos com a internet em casa e que acreditam que poderiam incluí-la como mais uma ferramenta na sala de aula. Já aqueles que são contrários, afirmam que pode atrapalhar a atenção e o rendimento dos alunos.
O estudo mostra que 55% dizem que a internet melhora o tempo que dedicam aos estudos, mas 33% acreditam que a internet piora a concentração durante os estudos e trabalhos escolares. Além disso, 43% concordam que professores mais jovens usam mais as tecnologias para ensinar.
Já com relação ao uso da internet, a pesquisa mostra que 54% dos entrevistados se sente inseguro nas redes, 78% ficam desconfortáveis em trocar informações com desconhecidos e 64% desconfia de fornecer dados pessoais em compras e cadastros.
Sobre o uso de tecnologia, Rael afirma que deve ser uma ferramenta de complementação, não de exclusão. “O professor tem que ver a tecnologia com outros olhos. Tem professor que diz que veio para atrapalhar, que é um empecilho na vida do aluno. É uma visão tradicional. Mas se for assim, não terá avanço na educação. Precisa associar a tecnologia com as aulas e com o cotidiano escolar. Se ficar de fora da tecnologia, não vai se desenvolver.”
Rael sugere que os professores e a escola auxiliem no aumento da segurança na internet, com orientações em sala, palestras e reuniões com os pais sobre a importância dos cuidados no celular. “A escola tem que se preocupar em ajudar a evitar riscos. Ela está ali para nos orientar e para nos informar.”
Yasmin afirma que a internet auxilia a encontrar informações e nos estudos, mas acha “difícil identificar se as notícias que lê são verdadeiras e quando um site é verdadeiro ou não.” Ela não se sente totalmente segura online. “Muitos sites pedem informações pessoais. É como toda a minha vida estivesse ali. Às vezes, acho que a internet é um buraco muito grande, que a gente não sabe onde vai acabar”.
Mediação
A diretora do Porvir, Tatiana Klix, foi consultora temática de educação do estudo e acompanhou os debates dos jovens consultores. “Ao longo de todo o processo da pesquisa foi possível perceber o que os dados quantitativos também mostram. A tecnologia traz inúmeras oportunidades de aprendizagem para as juventudes, mas eles estão pedindo ajuda para fazer um bom uso dela e não se perder em outras atividades que a internet também oferece.”
Para Marisa Villi, os resultados da pesquisa e o relato dos jovens dão pistas de como se pode investir na formação dos professores para que tenham um papel de mediadores no uso da internet. “Do ponto de vista de política pública, é preciso preparar o professor para lidar com esse momento, para ensinar como lidar com a internet. A mediação é também fazer uma curadoria de conteúdo, sem correr o risco de cair em censura, ensinar como selecionar, a descobrir se uma fonte é confiável ou não, com embasamento, com a construção de referências nesse sentido”, diz.
Sobre a segurança, Marisa afirma que é preciso fazer com que a sociedade se sensibilize para a necessidade de proteger dados. “Os jovens começaram a vida deles nesse ambiente de compartilhamento de informações e dados. Todos os dados deles já estão visíveis. Esta é a primeira geração que sabe que está exposta o tempo todo. Temos que saber lidar com isso como sociedade. Precisamos nos mobilizar sobre quão importante é a segurança e diminuir os riscos de exposição da juventude.”
Celular e redes sociais
O celular é o principal aparelho para conexão com a internet, de acordo com a pesquisa. Comunicação e lazer são os principais usos, mas outras atividades, como informação e serviço, capacitação e trabalho e comércio eletrônico, também são citadas. O estudo mostra ainda que 97% acessam redes sociais, sendo que 80% fazem postagens. Todos usam o WhatsApp, mas Instagram, YouTube e Facebook também aparecem como mais acessadas.
De acordo com o estudo, os jovens só não estão online quando dormem, quando acaba a bateria ou os créditos do celular, ou, em alguns casos, quando estão estudando ou trabalhando. Isso não significa que esse uso possa defini-los. “Às vezes, as pessoas veem o jovem com uma imagem idealizada, como alguém que só fica no celular. Nem sempre buscam saber o que ele pensa e faz”, diz Yasmin.
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A jovem, que quer cursar relações públicas na faculdade, diz se identificar mais com a área de comportamento, por gostar de entender a fala e o sentimento do outro, mas quer aprender mais sobre participação social “Queria poder ter uma imersão maior neste tema.” Ela considera ainda que o empreendedorismo deveria ser mais discutido nas escolas, para que os estudantes entendam o que é e como funciona.
Segundo Americo Mattar, diretor-presidente da Fundação Telefônica Vivo, o objetivo da pesquisa é ter um entendimento claro do comportamento do jovem e da sua utilização dos recursos digitais. “A pesquisa desconstruiu o senso comum de que o jovem se espelha pela internet e pelas redes sociais. E devolve um grande protagonismo à família, à escola e ao professor, como sendo as principais referências de desenvolvimento. Isso não significa que o jovem não tenha críticas a essas instituições e a esses grupos de pessoas, mas ele ainda considera esses grupos como seus principais referenciais, as principais fontes de aprendizagem, desenvolvimento e construção de carreira”, afirma.
Americo cita ainda o dado que mostra que 59% dos jovens não se vê identificado pelos movimentos sociais e pelos partidos políticos. “Tem alguma mensagem aí também que a gente tem que aprofundar um pouco mais e buscar o entendimento. Ou seja, a pesquisa não se propõe a ser exaustiva, do ponto de vista de esgotar essa conversa, mas, sim, um ponto de abertura ao diálogo, para que, a partir da pesquisa e das reflexões propostas, a gente possa se reunir e debater com os jovens, com a participação deles, o que está acontecendo na nossa sociedade.”
* A Fundação Telefônica Vivo é apoiadora do Porvir